Quando o efeito da condenação de Bolsonaro chegar às pontas de rua
Um policial que mora no seu bairro diz tê-lo visto durante imenso tumulto na final do campeonato de futebol da região, com vandalismo total. No dia seguinte, ele para a viatura na porta da sua casa e o leva para a delegacia, onde ele mesmo o interroga e conduz a investigação, por acumular o cargo de delegado. Decide indiciá-lo e manda para si mesmo o inquérito, já que é igualmente promotor de Justiça. Oferece a denúncia e, coincidência, aceita-a por ser também juiz. Ficção? Não. A partir dos julgamentos, como o de Jair Bolsonaro e seus auxiliares na semana passada, está pacificada a reunião de atribuições, mesmo usadas contra inimigos capitais.
As figuras de vítima, polícia ostensiva, polícia judiciária, integrante do Ministério Público e magistrado foram sintetizadas, em evidente economia processual e pessoal. Brincadeira à parte, é sério o prejuízo das decisões de Brasília quando chegam às pontas de rua do Brasil. As autoridades não precisam mais se considerar suspeitas. A exceção de suspeição prevista no Código de Processo Penal virou letra morta, como a própria Constituição. Exemplo: um juiz amigo íntimo de alguém pode julgar o maior adversário desse alguém e tudo bem. Outro exemplo: o advogado de um ladrão vira juiz, vai julgar alguém roubado por seu ex-chefe, ele o condena e tudo bem. Mais exemplo fictício: o secretário municipal de Segurança e Justiça de um prefeito corrupto é indicado para um tribunal e vai compor um colegiado em cuja pauta entra o caso do antecessor de seu chefe, ele o condena e tudo bem.
Ótima notícia para essas vítimas é que ao menos poderão recorrer a instâncias superiores. Os condenados pelo Supremo só podem recorrer a Jesus Cristo.