Queda das importações explica recorde no superávit brasileiro

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 25 de julho de 2023

Os números recordes acumulados pelas exportações e pelo saldo comercial brasileiro na primeira metade deste ano devem ser tomados com alguma cautela, segundo análise do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), detalhada na edição mais recente de seu Indicador de Comércio Exterior (Icomex). Coordenado pela economista Lia Valls Pereira, o relatório aponta que o avanço do superávit comercial (quer dizer, exportações menos importações) deveu-se, primeiramente, a uma queda de 7,08% nas compras externas, diante de modestíssimo avanço para as vendas externas do País, numa variação de apenas 0,98% em relação aos primeiros seis meses do ano passado.

Na avaliação do relatório, este não seria exatamente “um cenário a ser comemorado”, considerando-se que a “melhora do superávit está associada a uma redução das importações”, o que, por sua vez, “reflete o baixo nível da atividade econômica no País”. O resultado observado para a balança comercial brasileira, acrescenta o Icomex, “merece ser analisado”, diante da tendência de queda dos preços dos bens e mercadorias exportados, assim como daqueles importados, com aumento nos volumes exportados, sob liderança das commodities (grãos, petróleo e minério de ferro, em grande medida), e estagnação virtual para os volumes importados, mais uma vez “condizente com o baixo nível de atividade”.

As exportações experimentaram crescimento muito mais do que tímido entre o primeiro semestre do ano passado e igual período deste ano, passando de US$ 164,070 bilhões para quase US$ 165,680 bilhões, ou seja, US$ 1,609 bilhão a mais – o suficiente para registrar o maior valor para um primeiro semestre em toda a série histórica do setor. De acordo com o Icomex, essa variação combinou uma alta de 8,5% nos volumes embarcados e baixa de 6,5% nos preços médios dos produtos exportados. As importações baixaram de US$ 129,813 bilhões para US$ 120,615 bilhões nos mesmos períodos, resultando numa redução de US$ 9,197 bilhões. Além de anotar queda de 6,4% nos preços médios dos bens importados, o Icomex anota ainda leve baixa de 0,7% nos volumes comprados lá fora pelo País.

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Adubos e fertilizantes

O tombo nas importações de adubos e fertilizantes explica quase dois terços da baixa observada para o valor das compras externas totais realizadas pelo País no primeiro semestre. Depois da escalada observada em 2022, os gastos com adubos lá fora despencaram 45,0% entre o primeiro semestre de 2022 e o mesmo período deste ano, caindo de US$ 12,826 bilhões para pouco menos de US$ 7,051 bilhões – quer dizer, US$ 5,775 bilhões a menos. A redução em volume foi menos expressiva, num recuo de 13,35%, saindo de 19,342 milhões para 16,760 milhões de toneladas (2,582 milhões de toneladas a menos, o que correspondeu a 75,58% do recuo sofrido nos volumes totais importados entre aqueles dois períodos). Os preços médios dos adubos e fertilizantes importados, diante da regularização das cadeias de suprimento no mercado internacional, caíram 36,49%, de US$ 663,82 para US$ 421,59 por tonelada, na média de cada um dos semestres analisados.

Balanço

  • A retração das compras do insumo foi decisiva ainda na redução experimentada pelas importações realizadas pela indústria de transformação, que baixaram 4,69% entre a primeira metade de 2020 e idêntico intervalo deste ano, saindo de US$ 114,065 bilhões (87,9% do total importado pelo País) para US$ 108,706 bilhões (passando a representar 90,13% das compras externas totais), numa redução de praticamente US$ 5,360 bilhões.
  • Excluídos adubos e fertilizantes, as demais importações da indústria quase não saíram do lugar, variando de US$ 101,239 bilhões para US$ 101,655 bilhões, ou seja, apenas US$ 415,58 milhões a mais, correspondendo a uma oscilação de 0,41%. De toda forma, sinaliza uma economia devagar, quase parando. Mesmo quando descontadas as compras de óleos combustíveis, que sofreram baixa de 11,94%, de US$ 9,721 bilhões para pouco menos de US$ 8,560 bilhões (US$ 1,161 bilhão), o desempenho das compras externas restantes continua sendo muito modesto.
  • Assim, sem adubos e óleos combustíveis, as importações restantes realizadas pela indústria de transformação anotaram variação de 1,72%, saindo de US$ 91,519 bilhões para US$ 93,096 bilhões.
  • Para além dos descompassos entre exportações e importações, os dados oficiais mostram uma dependência persistente do saldo comercial em relação ao superávit gerado pelo setor agropecuário, com contribuição decisiva da China, responsável por 54,6% do superávit brasileiro no primeiro semestre, quando incluídas as regiões de Hong Kong e Macau, sob influência excessiva da soja em grão, com participação de 45,7% nas exportações brasileiras para aqueles mercados.
  • Com exportações de US$ 43,061 bilhões no primeiro semestre deste ano, em torno de 6,82% mais elevado do que no mesmo semestre de 2022 (US$ 40,311 bilhões), a agropecuária reduziu suas importações em 18,56%, de US$ 2,826 bilhões para pouco menos de US$ 2,302 bilhões. O superávit comercial do setor elevou-se em 8,73%, de US$ 37,485 bilhões para US$ 40,760 bilhões (ou seja, 90,45% do superávit total), crescendo US$ 3,275 bilhões, o que, por sua vez, representou 30,3% do aumento registrado pelo superávit comercial do País.
  • A maior contribuição para o crescimento do saldo brasileiro veio da redução no déficit comercial da indústria de transformação, refletindo principalmente a queda nas importações, mas também a estagnação das exportações do setor, que saíram de US$ 86,436 bilhões para US$ 86,393 bilhões, num recuo de 0,04%. O saldo negativo nesta área caiu 19,24%, de US$ 27,629 bilhões para US$ 22,312 bilhões, significando US$ 5,316 bilhões a menos. Isso significa que quase metade do aumento no superávit comercial (49,20%) deveu-se ao déficit mais baixo na indústria.