Recorde na série histórica, massa de rendimentos aponta desaceleração

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 01 de dezembro de 2023

Iniciada em 2012, a série estatística da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que a massa salarial real, soma de todos os rendimentos recebidos pelos trabalhadores atualizada com base na inflação, quebrou novo recorde no trimestre encerrado em outubro deste ano, atingindo perto de R$ 295,745 bilhões. Na comparação com R$ 28,375 bilhões acumulados no trimestre imediatamente anterior, a pesquisa registra um avanço de 2,6% para a massa de rendimentos reais. A alta aproxima-se de 4,7% em relação ao total de R$ 282,581 bilhões anotados no trimestre encerrado em outubro do ano passado, equivalente a um acréscimo de R$ 13,163 bilhões no orçamento das famílias.

A conta considera apenas os rendimentos do trabalho, sem incluir benefícios previdenciários ou sociais, a exemplo de aposentadorias, pensões, benefícios de prestação continuada, como o programa que assegura renda mensal vitalícia para famílias muito pobres, com idosos e pessoas deficientes, e ainda os pagamentos do Bolsa Família. Trata-se, portanto, de uma visão parcial da renda familiar em seu conjunto, mas que sinaliza, de toda forma, como as famílias poderão se comportar em suas decisões de consumo.

Esse comportamento poderá ser afetado, por exemplo, pelo fato de a massa de salários habitualmente recebidos ter entrado em desaceleração ao longo dos últimos meses, num reflexo do desaquecimento experimentado pelo emprego. Novamente, a economia continua expandindo o número total de ocupações, abrindo vagas e realizando novas contratações, notadamente em setores associados a serviços e outras atividades que exigem capacitação menor. A questão, como esta coluna tem apontado, é que intensidade desse avanço tem sido menor, num sintoma de uma tendência mais ampla de perda de ímpeto em toda a atividade econômica mais recentemente.

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Testando a hipótese

Depois de meses de perdas, determinadas pelas medidas de distanciamento social adotadas durante a pandemia, a massa de rendimentos iniciou sua reação no início de 2022, quase 10 meses depois de as ocupações terem retomado o crescimento. Em valores reais, a massa atingiu seu melhor desempenho no trimestre setembro-novembro de 2022, crescendo 13,0% em 12 meses, num acréscimo de R$ 32,8 bilhões em relação ao mesmo trimestre de 2021. E havia avançado 11,5% (mais R$ 29,224 bilhões) no trimestre agosto-outubro de 2022. Deve-se considerar o efeito da base de comparação mais baixa no ano imediatamente anterior, evidentemente, assim como o ritmo mais modesto anotado no trimestre encerrado em outubro deste ano pode ter relação com o forte aumento de 2022. Mas, como ponderação, o crescimento no segundo trimestre deste ano bateu em 7,2%, significando uma variação real de R$ 19,1 bilhões frente ao mesmo trimestre de 2022. Esse dado parece reforçar a hipótese de uma desaceleração, o que faria sentido diante dos resultados mais recentes dos setores de serviços, comércio e indústria.

Balanço

  • Como já anotado, a reação no mercado de trabalho havia sido iniciada por volta do segundo trimestre de 2021 e acelerou-se nos trimestres seguintes, com o crescimento em bases anuais alcançando 10,6% no trimestre março a maio de 2022, passando a crescer 6,1% no trimestre agosto a outubro de 2022, sempre na comparação com períodos idênticos de 2021.
  • O recorde alcançado neste ano veio com um incremento de 0,5% também em 12 meses, com o total de ocupações saindo de 99,661 milhões no trimestre agosto a outubro do ano passado para 100,206 milhões, correspondendo à geração de 545,0 mil vagas. Na passagem de maio-julho deste ano para o trimestre imediatamente seguinte, o número de ocupadas avançou 0,9%, com a abertura de 862,0 mil colocações.
  • Esse incremento contribuiu para baixar a taxa de desemprego de 8,3% em novembro de 2022 para 7,6% em igual trimestre deste ano, a menor taxa desde o trimestre finalizado em fevereiro de 2015 (7,5%). O aumento no número de ocupados entre os trimestres encerados em julho e novembro foi suficiente para abrigar 228,0 mil trabalhadores que haviam deixado o mercado e estavam fora da força de trabalho e ainda em torno de 372,0 mil que passaram a fazer parte da população em idade ativa (com 14 ou mais anos de idade), produzindo ainda uma redução de 3,1% no total de desempregados (de 8,520 milhões para 8,259 milhões de pessoas sem emprego).
  • Em novembro do ano passado, sempre considerando um período de três meses, o número de desempregados havia alcançado 9,022 milhões de pessoas, o que significa dizer que, desde lá, houve uma redução de 8,5%, com 763,0 mil trabalhadores deixando o desemprego.
  • No curtíssimo prazo, ou seja, entre os trimestres maio-julho e agosto-novembro deste ano, serviços de menor qualificação e a construção civil, considerados em conjunto, ampliaram as contratações em 1,2%, abrindo 597,0 mil vagas, o que correspondeu a 69,3% o total das novas ocupações criadas em igual período. Em valores absolutos, o número de ocupados naquelas áreas avançou de 47,991 milhões para 48,588 milhões de pessoas.
  • Como também tem sido observado neste espaço, o recorde de ocupações precisa ser considerado sob a perspectiva da taxa de participação da força de trabalho na população em idade ativa, que chegou a 61,9% no trimestre agosto-outubro deste ano. Para comparar, no mesmo trimestre de 2019, a taxa de participação havia atingido 63,8%. Se aplicada a mesma taxa à atual população com 14 anos ou mais, em torno de 175,107 milhões de pessoas, a força de trabalho corresponderia a aproximadamente 111,718 milhões de pessoas.
  • Como a economia gerou 100,206 milhões ocupações, o número de desempregados subiria para 11,512 milhões, perto de 3,253 milhões de desocupados a mais do que o dado efetivamente registrado pela pesquisa (39,4% a mais). A taxa de desocupação, dessa forma, estaria mais próxima de 10,6% (ou três pontos percentuais a mais).