Renda das famílias recua quase 3% e tende a frear avanço dos serviços

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 14 de setembro de 2022

O impacto pernicioso da inflação sobre a renda das famílias, a despeito de uma inflexão temporária dos indicadores inflacionários a partir do final de julho, quando começaram a entrar em vigor as medidas de redução de impostos sobre combustíveis, energia e transportes, tenderá a impor um freio ao avanço dos serviços nos próximos meses. A equipe de analistas do Itaú BBA considera como “provável” alguma tendência de desaceleração das atividades no setor ao longo do segundo semestre, associando essa perspectiva “à diminuição da renda disponível”, ao desaquecimento observado nos demais setores da economia e ainda ao “efeito cada vez menor da reabertura” das atividades no setor.

O esgotamento dos efeitos da retomada da circulação das pessoas e das atividades presenciais, naquela visão, afetaria “especialmente os serviços prestados às famílias”. Conforme relatório do banco, o indicador diário de atividade econômica, construído pelo setor de macroeconomia do Itaú BBA para aferir os humores na economia, indica alguma redução para os serviços prestados às famílias em agosto. Os dados mais recentes do Banco Central (BC), que passou a divulgar desde o ano passado a renda nacional disponível bruta das famílias, confirmam a perda de fôlego.

A renda disponível experimentou redução de 2,93% entre os trimestres finalizados em maio e julho deste ano, já descontada a inflação do período e excluídos fatores sazonais que poderiam distorcer esse tipo de comparação. O BC estimou uma renda de R$ 531,316 bilhões no trimestre finalizado em julho deste ano, frente a R$ 547,344 bilhões em maio, numa perda de R$ 16,028 bilhões. Comparada a julho do ano passado, quando havia somado R$ 520,188 bilhões, persiste uma variação positiva de 2,14%. Os valores recebidos pelas famílias brasileiras, no entanto, ainda acumulam queda de 6,11%, com perdas de R$ 34,598 bilhões, desde agosto de 2020, quando o auxílio emergencial havia alcançado níveis mais elevados, fazendo a renda disponível atingir R$ 565,914 bilhões.

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Efeito reverso

O conceito de renda nacional bruta disponível, adotado pelo BC desde o final do ano passado, teoricamente permite identificar todas as formas de renda das famílias, somando salários dos trabalhadores, dividendos e outras rendas recebidos por donos de empresas, rendimentos de aluguéis e juros e demais rendimentos de aplicações financeiras, aposentadorias, pensões e benefícios do sistema nacional de assistência social, como os benefícios de prestação continuada, renda mensal vitalícia e Bolsa Família (hoje Auxílio Brasil), além de transferências eventuais de renda, a exemplo do auxílio emergencial. O BC desconta, depois de tudo somado, os valores pagos ao Imposto de Renda, os impostos sobre patrimônio (como IPTU e ITR), as contribuições para a Previdência e transferências de renda feitas pelas famílias para outras instituições e para fora do Brasil. Nesse conceito, a redução mais recente parece relacionada, além da queda dos salários por conta da inflação, ao fim do impacto do saque extraordinário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e da antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas.

Balanço

  • Na comparação com o mês imediatamente anterior, o volume de serviços em todo o País havia crescido 0,4% e 0,8% em maio e junho, alcançando variação de 1,1% em julho. Em Goiás, o setor havia crescido 0,8% em junho, depois de recuar 0,4% um mês antes, e apresentou salto de 4,7% em julho, na maior variação entre todos os Estados. O número veio ligeiramente acima das projeções do mercado para julho, que giravam ao redor de 0,5% e 0,6%.
  • A pesquisa mensal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre o setor mostra, ainda, elevação de 6,3% em julho, na comparação com igual mês de 2021, com alta de 13,2% em Goiás (terceiro melhor resultado entre os Estados). Em ambos os casos, as receitas nominais haviam registrado variações de 15,9% e de 23,7% na média de todo o País e em Goiás, respectivamente.
  • Na visão do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), “além de crescer, a indicação tem sido de ganho de velocidade nos últimos três meses, o que está associado à normalização dessas atividades com o controle da pandemia e à existência de demanda reprimida nas camadas da população de maior renda”.
  • O nível de atividade no setor supera já há algum tempo aquele observado em fevereiro de 2020, antes da pandemia, com crescimento de 8,9% na média do Brasil e de 22,2% no Estado. Apesar de tudo, o setor ainda estava, em julho deste ano, em torno de 1,8% abaixo de seu melhor desempenho, alcançado em novembro de 2014 pelo setor em todo o País. Em Goiás, a queda chega a 7,75% frente a fevereiro de 2014.
  • Considerando os resultados acumulados nos primeiros sete meses deste ano, o Iedi avalia que os ramos que mais cresceram estão precisamente entre os mais afetados pelas medidas de restrição à circulação das pessoas nos momentos mais críticos da pandemia. Os serviços prestados às famílias cresceram 33,9% em relação aos mesmos sete meses de 2021, com salto de 35,3% no segmento de hotéis, bares e restaurantes. Registrou-se ainda elevação de 13,8% no segmento de transportes, armazenagem e correios, refletindo principalmente o salto de 46,6% nos transportes aéreos. “Esses resultados robustos não chegam a surpreender, já que são ramos particularmente favorecidos pela retomada da mobilidade das pessoas e das atividades presenciais, graças à ampla imunização da população contra a Covid-19”, anota o instituto.
  • Em contrapartida, prossegue o Iedi, “os ramos de serviços que estão para trás compreendem aqueles que pouco foram afetados pela pandemia e, por isso, não estão sujeitos ao processo recente de normalização do setor”. O instituto menciona o setor de informação e comunicação, que observou variação de 2,8% no acumulado do ano até julho, e o ramo de “outros serviços”, em queda de 2,8% em igual período.