Renda efetiva das famílias ainda acumula perdas de R$ 50,6 bilhões

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 31 de julho de 2021

Em meio à elevação dos custos dos alimentos, da energia elétrica e do gás de cozinha, que acumulavam altas de 15,3%, 16,95% e 26,3% em 12 meses até a primeira quinzena de junho, desregulamentação do mercado de trabalho e uma sequência de reformas que reduziu valores e alongou os prazos para aposentadoria do trabalhador comum, a renda das famílias sequer chegou a retomar níveis anteriores ao começo da pandemia. Segundo a edição mais recente da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a soma de todos os rendimentos efetivamente recebidos pelas pessoas ocupadas registrava ainda perdas de R$ 50,598 bilhões entre o trimestre finalizado em janeiro do ano passado e o trimestre terminado em maio deste ano, já descontada a inflação.

Em valores reais, a massa salarial efetiva caiu de R$ 264,498 bilhões para R$ 213,90 bilhões, numa queda de 19,1%. A queda nos rendimentos e o desempenho sofrível do mercado de trabalho, diante de dificuldades evidentes para a retomada de fato das contratações, aliado à suspensão do auxílio emergencial entre janeiro e abril deste ano, explicam a forte retração ainda acumulada pela renda das famílias, o que tende a criar dificuldades adicionais para uma reativação real e duradoura da demanda. A volta do auxílio, embora possa representar algum alívio, deverá ter efeitos limitados sobre o consumo, diante da redução da população favorecida e dos cortes nos valores médios pagos por família beneficiada.

Os dados mais recentes da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), divulgados na sexta-feira, dia 30, mostram uma queda vertical nos valores desembolsados para cobrir o auxílio emergencial na primeira metade deste ano, mesmo em termos nominais (ou seja, sem atualização com base na inflação do período). Nos seis meses iniciais de 2020, o Tesouro destinou R$ 121,54 bilhões para o auxílio às famílias mais necessitadas, valor que desabou para apenas R$ 27,355 bilhões, em números arredondados, na primeira metade deste ano, o que significou um corte de R$ 94,185 bilhões, num tombo de 77,5%.

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Desemprego recorde

A PNADC referente ao trimestre de março a maio deste ano, conforme o IBGE, mostra a abertura de 809,0 mil ocupações frente ao trimestre imediatamente anterior, encerrado em fevereiro deste ano, já que a população ocupada avançou de 85,899 milhões para 86,708 milhões, numa variação de 0,9%. Como 1,818 milhão de pessoas a mais passaram a procurar emprego no período, o desemprego continuou avançando, somando mais 372,0 mil desocupados, em alta de 2,6% para o nível mais alto de toda a série histórica, iniciada em 2012. A pesquisa registrou 14,795 milhões de desempregados, diante de 14,423 milhões no trimestre anterior, com a taxa de desocupação subindo de 14,4% para 14,6% (tristemente recorde também).A tendência é basicamente a mesma quando se toma o mesmo trimestre de 2020 como base. O número de trabalhadores na força de trabalho cresceu 2,9% frente a março-maio do ano passado, representando a entrada de mais 2,856 milhões de pessoas no mercado de trabalho. A questão é que apenas 27,0% delas, ou 772,0 mil pessoas, conseguiram uma colocação. Outras 2,085 milhões reforçaram as fileiras do desemprego, significando um salto de 16,4% para o total de desocupados.

Balanço

  • A deterioração nas condições do emprego está escancarada no perfil das novas ocupações geradas nos períodos analisados. Entre fevereiro e maio deste ano, sempre considerando períodos trimestrais encerrados naqueles meses, trabalhadores por conta própria responderam por 89,0% das 809,0 mil ocupações criadas nos três meses considerados. Além disso, perto de 88,3% desses novos trabalhadores por conta própria não tinham registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ).
  • Os números da pesquisa apontam que o total de ocupados por conta própria, geralmente em bicos temporários ou trabalhando como ambulantes em banquinhas espalhadas pelos centros urbanos do País, cresceu 3,0% entre os dois trimestres, saindo de 23,653 milhões para 24,373 milhões de pessoas, representando 28,1% do total de empregados. Os trabalhadores por conta própria sem CNPJ, por sua vez, avançaram 3,6%, de 17,904 milhões para 18,540 milhões.
  • Em um ano, o número de pessoas atuando por sua própria conta e risco aumentou 8,7%, representando 1,958 milhão de trabalhadores a mais (dos quais, 82,7% não tinham CNPJ e qualquer direito). Para comparação, o número total de pessoas ocupadas entre os trimestres terminados em maio de 2020 e no mesmo mês deste ano aumentou muito menos (772,0 mil a mais, como já anotado) – o que significa dizer que todas as demais categorias de ocupados fecharam 1,186 milhão de vagas no período.
  • Fica um pouco pior quando se analisam os dados estimados pelo IBGE para o contingente de informais no mercado, trabalhadores sem direito a férias, 13º salário, sem Previdência e sem o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). No cálculo do instituto, que considera trabalhadores do setor privado e empregados domésticos sem carteira, ocupados sem CNPJ (incluindo empregadores) e trabalhadores familiares não remunerados, haviam 34,712 milhões de informais na economia no trimestre março-maio deste ano, representando 40,0% do total de ocupados. Em um trimestre, o número avançou 2,1%, passando de 34,014 milhões para 34,712 milhões (698,0 mil a mais, equivalendo a 86,3% de todas as novas ocupações abertas no período).
  • Frente ao mesmo trimestre de 2020, quando a informalidade atingia 37,6% dos ocupados, o total de informais cresceu praticamente 7,5%, com a entrada neste segmento de mais 2,415 milhões de trabalhadores. Supondo-se que todo o restante dos ocupados estivessem formalizados, esse número encolheu em torno de 3,1% em 12 meses, saindo de 53,639 milhões para 51,996 milhões, com fechamento de 1,643 milhão de vagas.
  • O total de subocupados por trabalharem menos horas do que considerariam necessárias para prover níveis adequados de subsistência foi igualmente recorde no trimestre encerrado em maio deste ano, chegando a 7,360 milhões de trabalhadores (8,5% do total de ocupados). No trimestre anterior, os subocupados por insuficiência de horas trabalhadas eram 6,890 milhões.
  • Houve um acréscimo, portanto, de 469,0 mil trabalhadores nessa mesma situação nos três meses seguintes, numa elevação de 6,8%. Para ser mais claro, a cada 100 trabalhadores que conseguiram alguma forma de ocupação no período, em torno de 58 não conseguiram empregos que lhes permitissem trabalhar o número de horas necessárias para assegurar seu sustento e de sua família. A relação piora quando se considera o período de 12 meses: o número de subocupados saltou 27,2%, saindo de 5,787 milhões há um ano (1,573 milhão a mais). Esse número foi duas vezes maior do que todas as vagas adicionais abertas pela economia brasileira em igual período.
  • O número de trabalhadores subutilizados atingiu o segundo maior contingente da séria histórica, chegando a 32,946 milhões, com a taxa de subutilização batendo em 29,3% (a mais elevada para o trimestre março-maio pelo menos desde 2012).