Coluna

Rendimentos do trabalho registra terceiro pior desempenho

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 29 de fevereiro de 2020

da Redação

Antes
mesmo do fim do Carnaval, o emprego já parecia ter finalmente engrenado,
abrindo o ano de forma positiva. Alvíssaras. Como diriam os mais “antenados”,
só que não. Quer dizer, houve alguma melhora, embora o emprego ainda patine e
seu crescimento continue sustentado principalmente pelo avanço de ocupações de
menor qualificação, o que tem determinado, de outro lado, certa estagnação no rendimento
médio real recebido pelos trabalhadores e um lento avanço, entre altos e
baixos, para a massa de rendimentos (que vem a ser a soma de todos os salários
pagos aos trabalhadores e outras formas de remuneração recebidas por pessoas
ocupadas por conta própria e empregadores).

A
evolução da massa de renda do trabalho pode ser uma boa medida para aferir a
capacidade de consumo das famílias, que pode ainda ser turbinada pelo crédito
(assunto para uma próxima coluna). Neste caso, as chances de uma retomada mais
vigorosa da demanda podem estar sendo novamente adiadas. Os dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNADC), divulgada ontem pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram uma variação
real de 2,2% para a massa de rendimentos no trimestre encerrado em janeiro
deste ano (cobrindo, portanto, também os meses de novembro e dezembro do ano
passado) na comparação com igual período de 2018/2019.

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A
variação já exclui o efeito da alta da inflação sobre os rendimentos e indica
um acréscimo de R$ 4,764 bilhões na massa salarial. Parece muito, mas não é
tanto assim. Na verdade, trata-se da terceira pior variação para o mesmo
trimestre em toda a série histórica do IBGE, iniciada em 2012. Só não foi pior
do que nos anos de 2016 e 2017, quando a massa de rendimentos (sempre no
trimestre até janeiro daqueles anos) sofreu baixas de 4,0% e de 0,8%
respectivamente. Para comparar, entre novembro de 2018 e janeiro de 2019, a
massa havia crescido R$ 6,089 bilhões, numa variação real de 2,9% em relação ao
mesmo período de três meses terminado em janeiro de 2018. Feitas as
comparações, pode-se concluir quo o acréscimo de quase R$ 6,1 bilhões foi
praticamente 28% maior do que o valor agregado à massa de rendimentos no
trimestre encerrado em janeiro de 2020.

Melhora aonde?

A
esta altura parece bastante claro que vários fatores ajudaram a construir (ou
desmontar, a depender do ponto de vista de quem analisa) o baixo crescimento da
economia em 2019. Houve o desastre de Brumadinho, que atingiu em cheio a
produção de minério de ferro. Houve a guerra comercial entre Estados Unidos e
China, causando certo desaquecimento no crescimento global. A boçalidade em
vigor em Brasília não ajudou a construir um ambiente favorável aos negócios. E
a renda das famílias, mesmo crescendo mais do que aparenta avançar neste início
de 2020, igualmente não foi um fator de impulso para a atividade econômica. Se
os rendimentos agora crescem até menos do que lá, por que o resultado seria
muito diferente do que se observou ao longo do ano passado? Agora, o novo fator
de desequilíbrio tem sido a epidemia causada pelo coronavirus e pela onda de
quase histeria que tem acompanhado o avanço do vírus pelo mundo. O mais
provável é que a economia global (e a brasileira, por contaminação,
literalmente) sofra e apresente resultados minguados nos primeiros meses do
ano. A perspectiva de uma recuperação mais à frente ainda deve ser vista com
alguma cautela, ainda que não possa ser descartada.

Balanço

·  
De
volta aos números da PNADC, a massa de rendimentos não cresce desde o trimestre
setembro-novembro do ano passado, quando somou R$ 217,750 bilhões. Em parte,
porque o rendimento médio real das pessoas ocupadas tem se mantido estagnado na
faixa de R$ 2.361 há 12 meses. Registre-se que a queda da taxa de inflação no
primeiro mês deste ano não parece ter favorecido uma reação dos salários reais,
o que por si já seria um indicador da tibieza do mercado.

·  
Em
12 meses, o total de pessoas ocupadas avançou 2,0%, passando de 92,291 milhões
para 94,151 milhões, representando a abertura de 1,860 milhão de empregos. A
população desocupada registrou baixa de 5,6% (de 12,625 milhões para 11,913
milhões). Mas isso significou que 712,0 mil pessoas saíram do desemprego, quer
dizer, o equivalente a apenas 38,2% do total de novas ocupações criadas no
período.

·  
Detalhando
os dados da pesquisa: naqueles 12 meses, a população em idade de trabalhar (com
14 anos e mais de idade) recebeu mais 1,605 milhão de pessoas, das quais 456,0
mil desistiram de conseguir emprego. O restante, um contingente de 1,149 milhão
de pessoas, conseguiu uma colocação e o total de empregos gerados foi
suficiente para abrigar 712,0 mil dos 12,625 milhões que estavam sem emprego no
trimestre novembro de 2018 e janeiro de 2020.

·  
Assim,
o número de desocupados em janeiro deste ano baixou para 11,913 milhões de
pessoas, um número elevado ainda, que corresponde a uma taxa de desemprego de
11,2% (frente a 12,0% no começo de 2019).

·  
Mas
para onde foram esses novos empregados? Perto de 41,4% deles (770,0 mil)
conseguiram colocação em empregos sem nenhum registro oficial, sem direitos e
sem benefícios. São empregados sem carteira no setor privado, em serviços
domésticos e no setor público e ainda ocupados por conta própria e empregadores
sem registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ).

·  
Os
empregos com carteira assinada avançaram 2,1% com absorção de 747,0 mil novos
trabalhadores, representando 40,16% das novas ocupações. A indústria contratou
mais 512,0 mil trabalhadores (crescendo 4,4%), numa contribuição de 27,53% para
o aumento no total de ocupados.

·  
A
contribuição mais relevante veio dos serviços de menor qualificação, que
passaram a empregar 39,923 milhões de pessoas (42,4% do total de ocupados, num
avanço de 2,5% em 12 meses). Foram agregados àqueles segmentos perto de 962,0
mil novos contratados, ou seja, 51,72% do total de novas pessoas ocupadas.