Coluna

Segundo estudo, reforma da Previdência pode desaquecer a economia ainda mais

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 16 de julho de 2019

Todo
o debate em torno da reforma da Previdência tem se concentrado quase
exclusivamente sobre seus efeitos fiscais, ou seja, nas possibilidades de
redução do rombo nesta área, com impactos, portanto, sobre o conjunto das
contas do setor público e sobre a dívida pública interna. A retórica da redução
de desigualdades e correção de distorções, que tem embalado as discussões sobre
o tema, apenas tenta dar um verniz mais “civilizatório” aos objetivos meramente
fiscais(cortes de pensões, aposentadorias e de outros
benefícios previdenciários e assistenciais) adotados pelo governo ao definir as
linhas centrais da reforma aprovada em primeiro turno pela Câmara de Deputados.

Na
segunda-feira passada, dia 8, um grupo de pesquisadores e economistas do Centro
de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas
Gerais (Cedeplar/UFMG) publicou a nota técnica “Impactos econômicos da redução
de aposentadorias e benefícios na economia brasileira”, que tenta resgatar essa
dimensão mais socioeconômica da reforma. Afinal, lembram muito apropriadamente
os pesquisadores Edson Paulo Domingues, Débora Freire Cardoso, Luís Eduardo Afonso
e Guilherme Cardoso, do Cedeplar, “modificações na idade de aposentadoria e nos
benefícios previdenciários têm impactos sobre o mercado de trabalho,
investimento, consumo e várias outras variáveis macroeconômicas, que, por
estarem inter-relacionadas, provocam efeitos sistêmicos na economia”.

Em
síntese, o trabalho mostra que os cortes nos benefícios da Previdência trarão
retração da atividade econômica, ao afetar a renda das famílias e esse impacto
negativo somente poderia ser compensado diante de um aumento vigoroso dos
investimentos em toda a economia, mas alerta que essa perspectiva pode ser
vista como pouco realista diante da redução dos recursos destinados a esta área
e ainda por conta da própria redução da demanda total. A nota técnica adota um modelo
macroeconômico desenvolvido pelo Núcleo de Estudos em Modelagem Econômica e
Ambiental Aplicada (Nemea-Cedeplar) que permite estimar mais adequadamente “questões
relacionadas a transferências, tributação, e geração, apropriação e
distribuição da renda na economia brasileira”.

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Mais
desigualdade

Além
do caráter recessivo das medidas, a nota técnica aponta para um aumento (e não
queda) da desigualdade especialmente no caso do Regime Geral da Previdência
Social (RGPS). O impacto sobre a distribuição da renda, tornando-a ainda mais
injusta, seria mais dramático caso tivessem sido mantidas as mudanças no
programa de Benefício de Prestação Continuada (BPC). No caso do Regime Próprio
de Previdência Social (RPPS), que regula pensões e aposentadorias no setor público,
os ajustes teriam caráter mais progressivo – quer dizer, tenderiam a reduzir as
transferências de renda do sistema previdenciário para os mais “ricos”, com
alguma melhora nos indicadores de distribuição da renda. Mas os ajustes seriam
negativos no regime geral. As diferenças estão condicionadas especialmente pela
própria conformação dos dois sistemas.

Balanço

·  
Dentro
do RPPS, pouco mais de dois terços das aposentadorias e pensões (66,4%) são
apropriados por pessoas com renda entre 15 e mais de 30 salários mínimos (que
abrigam, por sua vez, apenas 9% de toda a população, apenas como informação
adicional).

·  
Portanto,
um ajuste nos valores mais altos tornaria o sistema menos injusto em termos de
redistribuição da renda.

·  
Dentro
do RGPS, ao contrário, as faixas de renda até 10 salários mínimos, onde se
encontram 83,8% da população total, respondem por 64,5% dos benefícios.
Aposentados e pensionistas com rendimentos de até cinco salários mínimos,
embora representem 61,2% da população, detêm 37,6% do total de benefícios do
sistema.

·  
Considerando
um corte ao redor de R$ 800,0 bilhões nas despesas previdenciárias ao longo dos
próximos 10 anos, no cenário padrão, o Produto Interno Bruto (PIB) poderá
sofrer retração de 1% no mesmo período.

·  
Numa
hipótese considerada excessivamente otimista, caso toda a redução nas
transferências de pensões e aposentadorias às famílias fosse compensada por um
crescimento equivalente dos investimentos, a economia poderia até crescer 2%
durante a próxima década.

·  
Muito
claramente, a simples retomada da confiança, depois de aprovada a reforma, não
seria suficiente para detonar um ciclo virtuoso e crescente de investimentos.
Deve-se lembrar que a demanda seria ainda mais enfraquecida com a redução das
despesas previdenciárias, o que não seria exatamente um estímulo à retomada do
investimento.

·  
Para
complicar, a equipe econômica continua empenhada no desmonte do BNDES, o que
exterminaria a única fonte de recursos de longo prazo na economia.