Coluna

Sem força, empresas não conseguem repassar alta de preços ao consumidor

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 23 de outubro de 2019

Os
números parciais indicam que os preços se mantiveram razoavelmente
bem-comportados na primeira quinzena de outubro, sugerindo que o mês tende a se
encerrar com uma taxa de inflação inferior àquela alcançada em outubro do ano
passado, quando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia atingido
0,45%. Com a inflação em 12 meses muito abaixo do centro da meta inflacionária,
fixado em 4,25% para este ano, com tolerância de meio ponto de porcentagem para
baixo ou para cima, presume-se que as próximas rodadas de reuniões do Comitê de
Política Monetária (Copom) tenderiam a referendar uma trajetória ainda de
redução dos juros básicos. Ao menos é o que determina o tal regime de metas
inflacionárias, obedecido pelo Banco Central (BC) com presteza apenas quando se
trata de aumentar os juros, o que sempre leva a uma explosão no custo do
crédito, detonando o investimento.

A
opção mais “cautelosa” do BC, para reforçar um argumento recorrente exposto
pela coluna, apenas ajudou a alongar a tormentosa e claudicante trajetória da
atividade econômica, com desemprego elevado e recordes no número de
trabalhadores em desalento e no subemprego. O crescimento muito aquém daquele
necessário para reverter o cenário atual surge mais uma vez nos indicadores
apurados também pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). O comportamento do Índice
Geral de Preços-Mercado (IGP-M), calculado pela instituição, sugere uma
economia muito abaixo do seu potencial, como demonstram os dados a seguir.

Até
a segunda quinzena de agosto, o IGP-M acumulado no ano alcançou 4,98%, puxado
pela alta de 5,98% dos preços no atacado, conforme aponta o Índice de Preços ao
Produtor Amplo (IPA), que contribui com 60% na formação do IGP-M. Ainda no
atacado, os produtos agropecuários subiram 6,52% desde janeiro, com alta de
5,80% para os produtos industriais. Para comparar, os preços ao consumidor
tiveram variação modestíssima, diante das elevações observadas no mercado
atacadista e dentro das empresas, subindo apenas 2,72%.

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A debilidade da
demanda

Obviamente,
não há uma relação automática entre os preços nos dois setores, ou seja,
aumentos de preços para os produtores e no atacado nem sempre levam a aumentos
de preços para o consumidor final. Em condições normais, no entanto, essas
altas no atacado acabam se transferindo, em algum momento, ainda que com
intensidades diversas, para o mercado de varejo. Parece evidente, portanto, que
não é isso o que está ocorrendo, o que apenas reforça o cenário atual de baixa
demanda na ponta final do consumo. Mais literalmente, as empresas não têm
conseguido repassar altas de preços (e de custos, já que os preços das
matérias-primas brutas saltaram 14,45% desde janeiro) para o consumidor final,
o que parece ser uma das explicações para as taxas de inflação reduzidas.

Balanço

·  
A
segunda prévia do IGP-M, que compara os preços coletados entre 21 de setembro e
10 de outubro com os preços apurados de 21 de agosto a 20 de setembro, apontou
elevação de 0,85%, diante de uma queda de 0,28% entre os 10 dias finais de
agosto e os primeiros 10 dias de setembro.

·  
O
IPA saiu de uma deflação (inflação negativa, significando isso mesmo, queda nos
preços médios) de 0,52% para um aumento de 1,29%, principalmente pelo encarecimento
dos produtos industriais (que subiram 1,42% depois de terem anotado recuo de
1,14%).

·  
Mas
o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) manteve-se em terreno negativo,
repetindo o recuo de 0,05% observado na segunda prévia do IGP-M de setembro. As
maiores contribuições para a manutenção do índice vieram dos setores de
alimentação (em queda novamente, embora em menor intensidade) e de habitação
(que saiu de elevação de 0,33% para redução leve de 0,16%).

·  
O
IPCA-15 de outubro apresentou variação de apenas 0,09%. Houve inversão de
sinais em relação aos 30 dias de setembro, quando o IPCA “cheio” havia recuado
0,04% (quase estabilidade, na verdade). De qualquer
forma, foi a menor taxa para o período desde outubro de 1998 (0,01%).Apenas
como exercício, se essa mesma taxa se repetisse ao longo dos próximos 12 meses,
a inflação em um ano ficaria abaixo de 0,5%.

·  
A
grande pressão veio dos produtos de higiene pessoal e farmacêuticos, que
somados contribuíram com 0,08 ponto de porcentagem para o IPCA-15 deste mês. Em
outro exercício matemático, isso significa que, excluídas aquelas duas classes
de produto, todos os demais itens que compõem o IPCA teriam anotado uma
variação de apenas 0,01%.

·  
Itens
importantes subiram igualmente, a exemplo da gasolina (saindo de recuo de 0,06%
para alta de 0,76%), óleo diesel (3,33% de alta) e etanol (0,52%). Esses
movimentos foram compensados pela redução de 0,25% nos custos da alimentação,
de 0,23% nas despesas com habitação e de 0,21% nos gastos com artigos para
casa.