Coluna

Trabalhadores sem carteira e conta própria ocupam 96% dos novos empregos no País

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 31 de agosto de 2019

O
comportamento do emprego ao longo deste ano tem confirmado um mesmo padrão,
mostrando uma recuperação concentrada na informalidade, com trabalhadores sem
garantias e direitos e ainda mal remunerados, o que explica a estagnação, com
ligeira tendência de queda, do rendimento médio real a partir de fevereiro
passado.  Esse desempenho parece explicar
igualmente porque o consumo das famílias, como anota o Instituto de Estudos
para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), não tem deslanchado – um dos fatores
por trás das taxas bastante modestas de crescimento do Produto Interno Bruto
(PIB).

No
trimestre entre maio e julho deste ano, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílio Contínua (PNADC) do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), o total de pessoas ocupadas registrou variação de 1,3% em
relação aos três meses anteriores, somando mais 1,219 milhão de empregos, e
avançou 2,4% em relação ao trimestre maio-julho do ano passado, com abertura de
2,218 milhões de vagas. O número de ocupados avançou de 91,367 milhões no
trimestre terminado em julho de 2018 para 92,365 milhões no período entre
fevereiro e abril deste ano, atingindo 93,584 milhões ao final do trimestre
maio-julho.

Os
dados parecem indicar uma trajetória consistente de alta, mas nem tanto. Além
de insuficiente para turbinar um aumento equivalente da massa salarial real
(quer dizer, do total de salários pagos a todos os trabalhadores, em valores
atualizados com base na inflação), o crescimento das ocupações tem sido
motivado largamente pelo incremento ainda mais relevante do total de
trabalhadores sem carteira assinada e por conta própria, o que revela uma outra
dimensão da crise em que o setor ainda se encontra mergulhado.

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Degradação

Somados,
os trabalhadores sem carteira (que, neste cálculo, inclui empregados dos
setores privado e público, além de empregados domésticos sem registro) e
aqueles forçados a buscar alguma forma de ocupação em negócios próprios somaram
42,918 milhões no trimestre finalizado em julho passado, representando
praticamente 45,9% do total de ocupados, diante de 44,9% em igual trimestre de
2018. Entre os períodos fevereiro-abril e maio-julho de 2019, a categoria dos
“sem carteira e conta própria” avançou 2,8%, correspondendo a 1,168 milhão de
novas ocupações, o que representou 95,82% do total de empregos abertos no
período em todos os setores da economia. Na comparação com maio a julho do ano
passado (40,988 milhões de pessoas), o aumento foi de 4,7% (1,930 milhão a
mais, numa contribuição de 87,0% para o aumento registrado pelo total de
ocupações). Os números comprovam uma degradação na qualidade dos empregos que a
economia bem criando. Para reverter esse quadro, a atividade deveria crescer de
forma mais robusta, permitindo que as empresas voltassem a registrar seus
empregados oficialmente, reinstituindo seus direitos e pagando salários mais
justos.

Balanço

·  
Não
é o que tem acontecido. O rendimento médio do total de ocupados vem recuando
desde o trimestre encerrado em fevereiro de 2019 e acumulou redução de 1,9% até
o trimestre maio-julho, recuando de R$ 2.330 para R$ 2.286. Trata-se do
rendimento mais baixo, ainda em termos reais (descontada a inflação), desde o
trimestre iniciado em novembro de 2016 e encerrado em janeiro do ano seguinte
(R$ 2.281).

·  
Esse
desempenho “congelou” virtualmente a massa salarial em R$ 208,672 bilhões no
trimestre maio-julho de 2019, apenas 0,2% maior do que no trimestre
imediatamente anterior (R$ 208,273 bilhões). Na comparação com maio-julho de
2018, quando havia alcançado R$ 204,135 bilhões, a massa registrou um acréscimo
de R$ 4,493 bilhões (mais 2,2%).

·  
Novamente,
foi a menor taxa de crescimento desde o trimestre finalizado em agosto de 2017
(+1,8%). Para comparar, tomando os trimestres encerrados em julho de 2017 e
2018, a massa real de rendimentos havia experimentado
alta de 3,1%, trazendo mais R$ 6,168 bilhões para a economia.

·  
Considerando
as pressões crescentes no cenário internacional, com a crise agravando-se na
Argentina, já em moratória disfarçada, e menor crescimento nas principais
economias globais, o mercado doméstico tende a se tornar “um pilar (se
sustentação da atividade econômica) ainda mais importante do que já é” e o
desempenho desestimulante do consumo das famílias “pode frear a recuperação
econômica do País”, adverte o Iedi.

Há outro aspecto a considerar, no momento em que
se discute a reforma da Previdência. O percentual de pessoas ocupadas com
contribuição a regimes de previdência caiu em maio-julho deste ano para um dos
mais baixos níveis da série da PNADC, saindo de 63,71% em 2018 para 62,56%.
Para relembrar, no final de 2015, esse percentual havia alcançado 65,71% da
população ocupada.