Segunda-feira, 22 de julho de 2024

Varejo abre segundo semestre com perdas para a maioria dos setores

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 15 de setembro de 2022

Depois de fechar todo o primeiro semestre em estagnação virtual, o comércio abriu a segunda metade do ano em baixa, com perdas para a maioria dos setores, seja em sua versão mais restrita, que inclui lojas dedicadas exclusivamente ao varejo, seja em sua concepção ampliada, que considera ainda segmentos mistos, com vendas também nos mercados de distribuição e de atacado. O dado reafirma constatação, já anotada neste espaço, a respeito dos efeitos muito limitados da antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas e da liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do PIS/Pasep sobre a demanda das famílias. Aparentemente, aquelas medidas não teriam sido suficientes para compensar a corrosão causada pela alta dos preços em geral sobre o valor real da renda familiar.

Descontados fatores sazonais, as vendas do varejo restrito recuaram 0,8% na saída de junho para julho, no terceiro mês consecutivo de números negativos nesta área. Nos últimos 12 meses, sempre na comparação com o mês imediatamente anterior, o setor ficou no vermelho na metade do período (alternando, obviamente, com seis meses de números positivos, o que não anula o fato de que os resultados foram negativos entre maio e julho deste ano). Num nítido processo de desaquecimento, entre abril e julho, o setor varejista encolheu 2,73%. Em relação a julho do ano passado, as vendas nesta área caíram 5,2%, no pior resultado para o mês desde julho de 2016 (quando haviam registrado baixa de 5,6%). Nesse tipo de comparação, houve queda em nove dos últimos 12 meses.

O varejo ampliado, que acrescenta concessionárias de veículos e motos, lojas de autopeças e de materiais para construção, segue trajeto semelhante, com quedas em junho e julho e perdas igualmente em nove dos últimos 12 meses na comparação com o mês imediatamente anterior. Depois de recuar 0,7% em julho, frente a junho, o setor passou a acumular retração de 4,56% frente a fevereiro deste ano. A retração tornou-se mais acentuada em julho, agora em relação a igual período do ano passado, com as vendas sofrendo retração de 6,8% – resultado superado apenas pelo tombo de 10,7% anotado em julho de 2016, ainda como rescaldo da recessão. Os dados, como já se sabe, são todos da pesquisa mensal de comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Perdas em série

“A sequência recente de resultados negativos reflete a perda de poder de compra da população devido à inflação, o aumento dos juros e o esgotamento de medidas anticíclicas, como liberação do FGTS e antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas”, reforça o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Considerando o varejo como um todo, nove entre 10 setores registraram números negativos na passagem de junho para julho, enquanto 70% deles ficaram no vermelho quando comparados a julho do ano passado. No ano, as vendas recuaram 0,8% diante do acumulado nos sete primeiros meses de 2021.

Balanço

  • O varejo restrito ainda conseguiu avançar modestos 0,4% na comparação com julho do ano passado, um desempenho muito tímido, contrastando com o desempenho mais vigoroso dos serviços – o que parece reforçar a hipótese sugerida pelo Iedi segundo a qual a reação naquele setor estaria relacionada principalmente ao incremento da demanda nas classes de poder aquisitivo mais elevado, privadas de viagens, festas, bares, restaurantes e shows nas fases mais agudas da pandemia.
  • A expectativa é de manutenção da tendência de desaceleração ao longo dos próximos meses, na visão do Itaú BBA, também por conta da redução da renda disponível e do “maior impacto do aperto da política monetária” sobre a atividade econômica. Mais claramente, a alta continuada dos juros tende a produzir resultados ainda mais negativos sobre a economia como um todo, levando a crescente restrições na concessão de crédito, especialmente num cenário de endividamento crescente das famílias.
  • O efeito da perda de poder de compra pode ser melhor avaliado quando se observam os números do setor de hiper e supermercados, com baixa de 0,6% de junho para julho, estagnação frente a julho de 2021 (recuo de 0,1%) e uma variação positiva de apenas 0,4% no acumulado deste ano.
  • A despeito daquelas condicionantes, o Itaú BBA ressalta que “os segmentos (do varejo) sensíveis à renda podem ser mais resilientes devido ao aumento do Auxílio Brasil, embora o indicador diário de atividade (IDAT), criado pelo próprio banco, tenha apontado “para outra queda em agosto”, com “os primeiros sinais de setembro também (…) negativos”.
  • O Iedi pondera ainda que o “novo ‘pacote de bondades’, com o aumento do Auxílio Brasil, vale gás e transferências para algumas categorias, como caminhoneiros e taxistas, teve recursos liberados a partir de agosto” último e não tiveram seus efeitos ainda capturados pela pesquisa do IBGE. A conferir nas próximas edições.
  • Em Goiás, o comércio varejista chegou a ensaiar um respiro em julho, ao avançar 0,7% diante de junho, mas despencando 5,5% frente a julho do ano passado. A reação veio depois de dois meses de resultados ruins, com quedas de 1,6% e de 1,2% em maio e junho (frente a abril e maio deste ano, respectivamente). Em sete meses, o setor sofreu redução de 0,7%. A tendência mais recente surge com maior clareza quando se comparam os números de julho e março deste ano, mostrando redução de 4,04% na série com ajuste sazonal.
  • No varejo ampliado, as vendas recuaram 0,9% em julho, diante de junho, e caíram 2,3% se comparadas ao mesmo mês do ano passado. Na comparação com fevereiro de 2020, mês imediatamente anterior ao começo da pandemia no País, o varejo restrito ainda apresenta baixa de 3,3%. Mas o varejo ampliado cresceu 10,1%.
  • O tamanho do estrago a ser corrigido ainda parece imenso. Comparado ao seu melhor resultado, colhido em maio de 2014, o nível das vendas no varejo tradicional ainda apresentava perda de 29,1%. No varejo amplo, o retrocesso frente a agosto de 2012 (quer dizer, há uma década, quando os indicadores do setor haviam alcançado seu melhor desempenho) era de 23,2%.