Rompendo as mentiras sobre a paternidade

Confira o artigo, desta segunda-feira (05/07), por Manoel L. Bezerra Rocha

Postado em: 05-07-2021 às 09h10
Por: Redação
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Confira o artigo, desta segunda-feira (05/07), por Manoel L. Bezerra Rocha | Foto: Redação

Há algum tempo, visitei um centro de internação de menores infratores com a finalidade de inspecionar as condições físicas da instituição e sobre o tratamento dispensado aos internos. Conversando com os assistentes sociais, pedagogos e psicólogos, fui informado de que mais de noventa por cento dos infratores são oriundos de famílias desestruturadas, onde a grande maioria sequer conhece o pai.

            Pesquisas recentes apontam que a figura do pai é importante não apenas pelo aspecto financeiro, material, como muitas mulheres imaginam – ou na formação do caráter. Ela se dá, principalmente, em razão da simbologia da referência. Eis, portanto, um dos maiores problemas que caracterizam a sociedade atual. A falta de referências ou de valores paradigmáticos. Quando se alude à figura paterna, é no sentido simbólico da referência. O pai, portanto, é a representação arquetípica do ideal, do herói, da proteção, da segurança. A ausência de referências conduz à uma falta de perspectivas na vida. Desta forma, as pessoas estão fadadas a se tornarem mais sucessíveis a acreditarem e a buscarem apoio, segurança e sensação de proteção em oportunistas que se apresentam como “líderes”. Isto é uma das causas do impressionante avanço do surgimento de infinitas denominações religiosas, com seus líderes ávidos e com um apetite insaciável pela lucratividade financeira. Como as utopias são substituídas, dando lugar aos devaneios, consequentemente cria-se o terreno propício ao surgimento e instalação do sectarismo, onde as ideias, o pensamento, a capacidade criativa e evolutiva do indivíduo, é substituída pelo dogmatismo do opressor e do explorador.

            No âmbito político, em nível internacional, não existem mais as figuras dos líderes, dos heróis, aqueles que possam servir de inspiração, na construção de uma ideologia, com o foram os revolucionários de décadas passadas, reais ou teóricos, que tanto despertaram, principalmente na juventude, os ideais libertários, humanistas, etc. Em nível interno, a política brasileira não se constitui na tradução da busca do bem comum, nem revela mais a formação de líderes que possam representar a personificação paradigmática de princípios morais, dos valores humanos. Ao contrário. As instituições públicas são tomadas de assalto por criminosos, moralmente falidos, saqueadores que visam, tão-somente, a locupletação destinada aos interesses de grupos. Os partidos políticos são pandilhas, os fins são escusos, os propósitos são espúrios, as ações são atos de delinquência em concurso de pessoas. A investidura e a permanência à frente das instituições públicas se convertem em uma cleptomania que, infelizmente, conta com a letargia da (in)consciência coletiva – esta, cada vez mais apática e tolerante com a falência das instituições políticas, consequência tanto da conivência, quanto da absoluta sucumbência dos parâmetros de valores sociais. Existe, no mundo inteiro, um vazio abissal de liderança. Essa orfandade de referências paradigmáticas contribui para o surgimento de pessoas inescrupulosas que, com discursos medíocres, torpes e embusteiros, lançam por terrenos férteis seus projetos de poder pessoal, seja através da política, seja através da utilização enganadora da fé, com promessas de uma intermediação entre os clamores da gente sofrida e desesperançada e a providência divina. Inevitavelmente, o resultado é mais opressão, dominação e utilização manipulada para a perpetuação no poder político, enriquecimento financeiro obtido com a exploração mercantilista da fé, eufemisticamente chamada de “dízimo” e, mais modernamente, a arregimentação de indivíduos para que pratiquem atentados suicidas ou que se predisponham a matar e morrer em nome de um “deus” empedernido mas que, em verdade, serve apenas às megalomaníacas pretensões de um poder político fundado em uma teocracia opressiva e fanática.

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            Em Antuérpia, na Bélgica, jovens são convertidos ao Islamismo para irem lutar e morrer em defesa dos interesses de meia dúzia de lunáticos extremistas do grupo Estado Islâmico (EI). No mundo inteiro há um aumento vertiginoso da delinquência praticada por jovens, principalmente na fase da adolescência. Tudo isso é parte das consequências de uma geração ser perspectivas, sem sonhos, sem referencial utópico ou ideológico. A carência ou a absoluta ausência de um ideal conduz o jovem a uma vida sem sentido, tornando-o presa fácil ao aliciamento para o morticínio sem causa. A formação de facções, de grupos cujos integrantes são moradores de determinadas regiões, geralmente destinadas à demarcação de territórios através da prática de crimes e violência contra outros grupos considerados rivais, são efeitos deletérios de uma juventude perdida, que tateia no vão escuro de uma vida vazia, sem horizontes, onde não há acolhida e direcionamento salutar para os seus extraordinários potenciais criativos e transformadores. Essa realidade, característica da sociedade moderna, tem consequências extremamente nocivas para a humanidade, cujos efeitos maléficos se protrairão por sucessivas gerações. Nem toda teologia é maléfica às sociedades. Os dogmas, sim!

            Nos anos de 1960, após o Concílio Vaticano II, cuja finalidade foi a de promover o incremento da fé católica e a renovação dos costumes do povo cristão, adaptando a disciplina eclesiástica aos tempos atuais, surgiu, em reação, a Teologia da Libertação. Essa corrente teológica cristã nasceu na América Latina e considera que o Evangelho exige a opção preferencial pelos mais pobres, valendo-se para a concretização desse ideal, das ciências humanas e sociais. Essa corrente teológica inspirou muita gente a teorizar e a praticar ações concretas visando a construção de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária. Muitos jovens idealistas engajaram-se em um projeto, em um ideal de um mundo melhor, renovando-se a fé e a esperança no potencial humano criativo e transformador. Nela muitos movimentos políticos e sociais se inspiraram. Infelizmente, essa corrente, que ganhava adeptos até dentre os não-cristãos, pois viam nela não um dogma religioso, mas uma ideologia libertária, sucumbiu juntamente (e como consequência) com o fim das utopias. A sociedade atual, ajustando-se ao predomínio da superficialidade, prostra-se, resignada e subjugada, aos talantes e desideratos de novos atores que surgem empenhados no adestramento e dominação social. Apropriando-se das mentes fracas dos indivíduos, cooptam-nos e os manipulam como fantoches de seus caprichos e sandices. A teologia libertária, portanto, por um lado, dá lugar ao fanatismo extremista, à intolerância e à cultura do ódio; por um lado, dá ensejo ao surgimento de uma das mais modernas modalidades de cinismo e canalhice: a denominada “doutrina da prosperidade”, onde só prosperam os exploradores, às custas da fé cega dos explorados.             O mundo precisa que surjam novas correntes filosóficas, novas reações sociais, como forma de despertar-nos da apatia que nos aprisiona como sociedade. É preciso haver uma nova consciência, o surgimento de uma força que contagie, principalmente aos jovens, a fim de que os despertem para o mundo em que vivem e que tenham consciência de que, para fazê-lo melhor, é preciso lutar constantemente, reinventando-se sempre. Novos valores morais e sociais devem surgir como referências à essa juventude ávida de reação e protagonismo. É preciso criar-se as condições para que a extraordinária força criativa e transformadora da juventude encontre as condições de efetivamente ser exercitada, na consecução dos propósitos da evolução humana.

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