Reparação da mama ainda demora no SUS

A realização do procedimento esbarra no déficit de centros cirúrgicos e baixa remuneração dos médicos

Postado em: 04-07-2016 às 10h40
Por: Sheyla Sousa
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A realização do procedimento esbarra no déficit de centros cirúrgicos e baixa remuneração dos médicos

Karla Araujo

A cirurgia de reconstrução de mama é um direito assegurado a toda mulher pela Lei nº 9.797/1999. O texto determina que “cabe ao Sistema Único de Saúde (SUS), por meio de sua rede de unidades públicas ou conveniadas, prestar serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama”. A norma foi modificada pela Lei nº 12.802/2013, que impôs a realização da cirurgia imediatamente após a paciente alcançar as condições clínicas requeridas. Ou seja, mesmo que a mulher não possa ter a reconstrução da mama no mesmo momento da retirada do câncer, ela tem direito ao procedimento assim que for liberada pelo médico. A condição também vale para os planos de saúde. No SUS, porém, o desafio ainda é grande.

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De acordo com o mastologista do Hospital Araújo Jorge e presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, Ruffo de Freitas Jr., há oito anos, 15% das mulheres conseguiam fazer a cirurgia pelo SUS. Hoje, o número subiu para 30%. Do total de pacientes, outros 30% não podem fazer a reconstrução devido a alguma questão clínica. “A boa notícia é que em poucos anos conseguimos aumentar em 100% a quantidade de procedimentos realizados. A notícia ruim é que ainda temos 40% das mulheres esperando pela cirurgia”, afirma Freitas. 

O presidente explica que a realização do procedimento esbarra no déficit de centros cirúrgicos e baixa remuneração dos médicos. Por toda a cirurgia, diz Freitas, o custo para o SUS é de R$ 350. Deste total, os médicos recebem R$ 175. “Diante dos desafios, a prioridade é para retirar tumores. A reconstrução fica em segundo plano. Assim, é preferível fazer duas cirurgias de retirada do câncer em duas mulheres do que dois procedimentos – câncer e reconstrução –  na mesma mulher”, explica Freitas.

Desafio

O advogado especialista em Direito Médico e Hospitalar Ricardo Mendonça lembra que a cirurgia não pode ser vista apenas como um fator estético. “É um procedimento totalmente clínico e interfere diretamente no psicológico da mulher”, explica. Para Mendonça, a falta de valorização dos médicos no SUS é o fator que mais prolonga a espera na fila pelo procedimento de reconstrução. “Na rede particular, o médico ganha até três vezes mais que no SUS. Como em toda profissão, existem aqueles que trabalham por ideal e é por causa destes que a fila para este tipo de cirurgia está andando, mesmo que devagar”, afirma Mendonça

 Mulheres protagonizam histórias de superação

Cristina Musmanno, 42, é bióloga e foi diagnosticada com câncer de mama em 2006, quando estava grávida da segunda filha. Na época, ela morava no Rio de Janeiro e fez a cirurgia pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão do Ministério da Saúde. Diante da gravidade dos tumores, ela precisou retirar as duas mamas, mas não pôde fazer o procedimento de reconstrução em seguida por causa da gravidez. “Só busquei a cirurgia dois anos depois, mas a fila estava muito grande, não queria esperar tanto. Como minha família já tinha plano de saúde, optei por pedir o encaminhamento do SUS para a rede particular e sair da fila”, explica Cristina. 

“Foi um momento muito difícil, mas minha família ficou mais unida depois. Temos muita fé e isso é muito importante. Alguns dias, não tinha forças para rezar, então eu cantava. Se para quem tem fé é difícil, imagino que é muito pior para a pessoa que não acredita em nada”, diz Cristina. Ao contrário da maioria das mulheres, Cristina preferiu não colocar prótese de silicone. A cirurgia de reconstrução foi feita com pele e gordura do abdômen.

Depois de vencer o câncer e dois anos sem o maior símbolo de sua feminilidade, Cristina, o esposo, Luiz Henrique Fernandes Musmanno, 47, e as filhas, Clara, 14, e Luiza, 12, vivem em Goiânia. Em 2009, Cristina passou em um concurso público para trabalhar na Prefeitura de Goiânia. Anos depois ela passou em outro concurso, desta vez, do Inca. “Entrei no Inca como paciente e hoje é o meu trabalho. Fechei um ciclo”, comemora.

Espera

Adelice Borges, 58, descobriu que tinha câncer de mama em 2002, quando fez a cirurgia de retirada do seio e iniciou o tratamento de cinco anos com medicação pelo SUS. Em 2006, ela fez a cirurgia. Adelice levou dois anos para conseguir realizar o procedimento. “Sou uma pessoa muito tranquila e de bem com a vida, tive pouca dificuldade com a doença, se comparado com outras pessoas que conheço. O que dói é o preconceito e a humilhação para conseguir uma medicação no SUS”, lembra.   

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