Projeto promove equidade de gênero entre beneficiários do Bolsa Família

Mais de 90% dos quase 14 milhões de titulares do programa federal Bolsa Família são mulheres, das quais 68% são negras

Postado em: 17-07-2016 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Mais de 90% dos quase 14 milhões de titulares do programa federal Bolsa Família são mulheres, das quais 68% são negras

Para intensificar a promoção da igualdade de gênero entre os beneficiários do Bolsa Família e ampliar a participação feminina nas decisões sobre gastos, um projeto envolveu homens e mulheres do programa na discussão sobre equidade. Com apoio do Fundo para a Igualdade de Gênero da ONU Mulheres, a metodologia e implementação do trabalho são da organização não governamental (ONG) Instituto Promundo.

Durante três anos e meio foi feita uma série de atividades e campanhas educativas em comunidades rurais e urbanas do Rio de Janeiro e Recife para questionar os estereótipos sobre o papel de mulheres e homens. Pesquisas qualitativas realizadas antes e depois dos trabalhos mostram mudanças significativas nas percepções dos homens e das mulheres sobre o tema.

Entre os participantes da iniciativa, o percentual de homens que achavam que cuidar dos filhos também é responsabilidade do pai subiu de 75% para 100% depois do projeto. O número de homens que afirmavam que cuidar da casa, das crianças e cozinhar para a família são as principais funções da mulher caiu de 35,5% para 22%. Antes do projeto, 13% dos homens declaravam que a decisão sobre os gastos familiares era exclusividade masculina. Esse percentual caiu para 8% ao fim do projeto.

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No caso de algumas mulheres, a resignação sobre o papel feminino no cuidado com a casa e os filhos foi substituída pela consciência da responsabilidade dos homens nessas tarefas e sobre o direito das mulheres de buscar maior independência emocional e financeira.

Para envolver os homens no projeto, foi criado um campeonato de futebol. No Morro dos Prazeres, em Santa Teresa, zona norte do Rio de Janeiro, o comunitário e carteiro voluntário Orlando Dato foi o juiz e organizador do campeonato. Ele contou que, inicialmente, viu o projeto com descrédito, devido à cultura machista da comunidade.

“A equidade de gênero não é comum na favela, até porque somos vítimas dessa relação equivocada, temos uma carência grande de família, justamente por causa dessa iniquidade. Então a ideia deles [do projeto] ia na contramão da nossa cultura. Homem respeitar mulher na nossa comunidade eu achava utópico. Por isso, o resultado final me deixou perplexo, foi avassalador”, disse.

Para participar do campeonato, os jogadores tinham que frequentar as palestras e rodas de conversas sobre gênero que antecediam os jogos. “Alguns iam para a palestra somente por causa do futebol, mas acabaram se envolvendo. As palestras conscientizaram muito os jovens, e grande parte das pessoas que participaram do projeto era gente com liderança e eles saíram com outra visão”, completou Orlando Dato.

O líder comunitário contou que também aprendeu com o projeto. As atividades ocorreram em 2013, mas ele replica as estratégias de promoção de gênero nas aulas de futebol que dá no morro até hoje. “Nas minhas aulas de sub-10, sub-13 e sub-17 e de jovens adultos, todos os times têm obrigatoriamente 50% mulheres. Muitas coisas não precisam ser criadas, basta serem bem replicadas e essa ideia copiei deles.”

De acordo com Orlando Dato, os casos de violência doméstica e de gravidez na adolescência diminuíram no morro “por causa do projeto e pelo trabalho importantíssimo do Grupo Proa, que trabalha com prevenção”.

Segundo o Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2,4 mil habitantes vivem no morro, mas o carteiro acredita que o número é maior. “Tenho posição privilegiada na comunidade, pois corro todo o território e converso quase que pessoalmente com cada morador. Acredito que vivam aqui cerca de 16 mil pessoas”, completou.

 

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