Medidas podem fazer ciclovias ‘decolarem’

Financiamentos, estímulos financeiros, troca de quilômetros pedalados por benefícios, interligação entre modais e construção de ciclovias podem auxiliar poder público a fazer usuário finalmente preferir usar a ‘magrela’

Postado em: 30-07-2016 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Financiamentos, estímulos financeiros, troca de quilômetros pedalados por benefícios, interligação entre modais e construção de ciclovias podem auxiliar poder público a fazer usuário finalmente preferir usar a ‘magrela’

Mardem Costa Jr. 

Ela já foi considerada um mero instrumento de lazer e entretenimento aos finais de semana ou mesmo locomoção de pobre. Hoje, a bicicleta está ganhando espaço nas ruas e avenidas de várias cidades pelo mundo como um meio de transporte complementar aos carros, motos e ônibus, com a vantagem de não poluir o meio ambiente e ainda colaborar para a melhoria da saúde de quem faz seus trajetos com a “magrela”.

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Goiânia, ainda timidamente, começa a enfrentar a resistência dos motoristas e o ceticismo da população no sentido de viabilizar uma estrutura que atraia usuários para as rotas cicláveis. De acordo com o Consórcio Metropolitano de Transporte Coletivo (CMTC), a capital conta com 95 quilômetros de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas. Poucas, mas fundamentais em uma cidade ainda dominada pelos automóveis.

Você já parou para pensar as vantagens da mobilidade via bicicleta tanto para o usuário da bike quanto para a cidade? Aqui vão algumas, de acordo com a ONG Vá de Bike – para os ciclistas, a redução no tempo do trajeto, economia com os custos diretos e indiretos de manutenção do automóvel, maior produtividade no trabalho e melhoria da saúde e bem-estar dos cidadãos adeptos à bike.

A bicicleta estimula uma experimentação da cidade – com reflexos positivos ao comércio local e a humanização dos cidadãos. Para a cidade, os benefícios são múltiplos: a redução da poluição do ar, do custo de manutenção da infraestrutura de trânsito, dos congestionamentos. Ainda a queda no número de atendimentos por acidentes e por doenças vindas pelo sedentarismo.

A ONG Transporte Ativo e o laboratório de mobilidade de uma importante universidade brasileira fizeram um levantamento, no passado, em dez grandes cidades brasileiras. 45% dos entrevistados eram novos ciclistas, ou seja, pessoas que adotaram a bicicleta como meio de transporte nos últimos dois anos.

O jornalista português André Gonçalves, 41, mora há cinco anos na capital goiana e pedala por 4 quilômetros diariamente. Ele decidiu aderir à bicicleta após constatar que o custo-benefício de usar automóvel não compensava. “Quando morava em Lisboa, eu usava o carro no trajeto casa-trabalho, mas ao mesmo tempo procurava inserir o metrô na minha rotina”.

Os problemas de mobilidade em Goiânia o impressionaram. “Fiquei em choque quando vi a ineficiência transporte coletivo, a má conservação das calçadas e a intolerância dos motoristas”. André elenca as vantagens do uso da bicicleta em sua rotina. “Me ajuda a economizar com combustível, estacionamento e ainda faço uma atividade física.  O exercício de pedalar me traz um bem-estar que não sentiria em uma academia, por exemplo”.

Intermodalidade

Um dos desafios dos ciclistas é a integração com outros modais. A bicicleta tem uma experiência agradável de 1 a 5 km, dependendo da pessoa e de seu tipo de trajeto. Acima disso, é recomendável a integração com outro meio de transporte. No caso de Goiânia, apenas o ônibus poderia suprir essa lacuna. O diretor da CMTC Sávio Afonso, informa que o órgão estuda para que haja bagageiros nos próximos veículos a serem adquiridos pelos rodoviários.

“Primeiro precisamos implementar a estrutura. Hoje as ciclovias de Goiânia estão ligadas  à três dos principais terminais de ônibus da capital e aos principais. Estamos trabalhando para cumprir a determinação do prefeito Paulo Garcia (PT) de construir 100 quilômetros de rotas cicláveis. O bagageiro nos veículos do transporte coletivo e outras melhorias serão consequências dessa política”.

 É preciso estimular o potencial ciclista, diz urbanista

Para atrair potenciais usuários da bicicleta, o Poder Público precisa criar condições favoráveis ao tráfego das “magrelas” – como a construção de vias cicláveis, paraciclos e outros equipamentos que tornem ainda mais agradável a experiência. As ações podem ser executadas com recursos públicos e ainda por meio de parcerias com empresas privadas, que também podem estimular o transporte cicloviário, instalando vestiários.

A urbanista Carol Farias, do estúdio Sobreurbana, acredita que as ações governamentais já estão surtindo efeito, mas é preciso ir além para que uma pessoa passe a utilizar a bike no dia a dia. “Moro perto da ciclovia da Avenida T-7 e é perceptível o aumento no número de ciclistas desde a implantação do equipamento. Ao mesmo tempo, é preciso investir em campanhas educativas e fiscalização para que os motoristas entendam que o ciclista faz parte da dinâmica da mobilidade e que a via não é exclusiva dos veículos automotores.”, avalia.

Carol pontua que a via ciclável acaba adquirindo um significado para a cidade muito além daquela inicialmente prevista. “Vejo que pedestres utilizam a ciclovia por se sentirem mais seguras em relação ao passeio, especialmente no período noturno. Não é difícil entender o porquê, com calçadas quebradas e má iluminação, a ciclovia traz uma sensação de segurança para o pedestre.”

Perguntada por O HOJE se Goiânia poderia aderir à iniciativa da capital paulista (veja matéria ao lado), a urbanista acredita que o projeto é viável, mas que é preciso implantar inicialmente uma estrutura cicloviária na cidade.

“Ao contrário do que muita gente pensa, não basta só estimular o uso. É preciso que a pessoa sinta haver condições para realizar o trajeto com segurança. Sobre a bonificação, é uma iniciativa que outras cidades fazem – Paris e Helsinque, por exemplo. O custo dela certamente seria mais baixo em comparação a construção ou manutenção de vias para os automóveis ou mesmo comparado com o custo dos acidentes de trânsito”, finaliza.  

São Paulo planeja pagar quem trocar o carro pela bicicleta 

Um projeto de lei (PL) do vereador paulistano José Police Neto (PSD), em parceria com a Prefeitura de São Paulo, pretende remunerar financeiramente a pessoa que trocar o carro ou ônibus pela bicicleta na capital paulista.  Intitulado “Programa Bike SP”, o projeto prevê ainda incentivo fiscal para as empresas participantes. Para isso, seria criado um cartão – que substituiria o atual bilhete único paulistano.

Com ele, a pessoa que fizer parte do trajeto diário de bike acumulará créditos, calculados de acordo com a distância, local e horário percorridos. Eles poderão ser resgatados em dinheiro – através da Nota Fiscal Paulista – ou utilizados numa rede de serviços credenciada pelo Executivo municipal. 

Para estimular a mudança, a gestão de Fernando Haddad (PT) estuda conceder descontos no valor da tarifa de ônibus, viagens de táxi ou em veículos de transporte privado por meio de aplicativos – como o Uber.

De acordo com o PL, o programa será arcado com o valor que a Prefeitura de São Paulo destina aos rodoviários como subsídio – algo em torno de R$ 2 bi. Aliás, a capital paulista é a única no País que subsidia parte da tarifa do ônibus. Caso contrário, pegar um coletivo lá custaria R$ 5, ante os R$ 3,80 cobrados.

“Subsídio não deve ser repassado apenas para o transporte coletivo. Temos de mudar essa lógica e usar melhor esse dinheiro. Ao incentivar o uso da bicicleta, tiram-se carros das ruas e passageiros dos ônibus superlotados”, avalia o vereador, que acredita que ser razoável a distribuição de créditos em um valor entre R$ 4 a R$ 8.

“Seria um valor significativo para atrair e para ajudar a bancar a manutenção da bicicleta, o seguro, os equipamentos. Quem aceita o desafio de ajudar a cidade deve ser reconhecido e recompensado”, diz. O PL aguarda para ser apreciado em segunda e última votação na Câmara Municipal de São Paulo. A previsão é que a iniciativa entre em vigor já em 2017.

 

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