Sem essa de “Oreia Seca”

Hoje os trabalhadores da Construção Civil comemoram seu dia. As novas tecnologias do setor pedem profissionais mais capacitados por isso há muito tempo o apelido pejorativo dado a esses trabalhadores não se justifica

Postado em: 26-10-2016 às 14h00
Por: Redação
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Hoje os trabalhadores da Construção Civil comemoram seu dia. As novas tecnologias do setor pedem profissionais mais capacitados por isso há muito tempo o apelido pejorativo dado a esses trabalhadores não se justifica

“Oreia seca”. Ainda hoje esse pejorativo apelido, dado a um trabalhador braçal de baixa instrução e que ganha pouco, persegue os operários da construção civil no Brasil. Mas atualmente, a adoção de novas tecnologias e técnicas de construção requerem, cada vez mais, profissionais mais capacitados e com maior nível de escolaridade.

 Portanto, neste 26 de outubro, Dia do Trabalhador da Construção Civil, a alcunha de “oreia seca” destinada a essa categoria, é no mínimo injusta, especialmente se levarmos em conta que junto com a elevação do nível de escolaridade dos operários, houve também uma significativa valorização dessa mão de obra.

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 Mesmo nesse momento mais complicado em que vive a indústria da Construção Civil, afetada nos últimos dois anos pela crise econômica no País, em Goiás é fácil encontrar operários que ganham mais de R$ 5 mil por mês.

Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do Trabalho e Emprego, o percentual de analfabetos na construção civil diminuiu mais de 60% nos últimos dez anos.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2002, 63,6% dos trabalhadores da construção civil tinham menos de oito anos de estudo. Em 2010, esse percentual caiu para 52,2%, e 26,6% (442,8 mil profissionais) tinham mais de 11 anos de estudo.

O aumento no nível de escolaridade também se refletiu na valorização da mão de obra. De acordo com o IBGE, entre 2010 e 2014, os profissionais da construção civil foram a categoria, dentre os milhões de trabalhadores brasileiros, que conseguiu a maior média de aumento salarial. 

Junto com um novo perfil de profissional, o ambiente de trabalho na construção também mudou. Hoje, os canteiros de obras possuem o almoço para os trabalhadores servido em restaurante self-service. Em Goiânia, existem empresas que chegam a montar escola de informática, academia de ginástica e até sala de música. Tudo para motivar os profissionais.

Experiência

Com 43 anos de experiência no setor da construção civil, o mestre de obras da Dinâmica Engenharia, Heleno Santos, conheceu de perto essa evolução técnica no setor e diz que o trabalho na obra hoje, em comparação ao de décadas atrás, “mudou da água pro vinho”. “Hoje em dia é muito diferente.

Você tem novos sistemas de trabalho, novos tipos de materiais que são mais fáceis de trabalhar e dão um resultado bem melhor. Para se ter uma ideia, no serviço de concretagem, por exemplo, antes você rodava 40 m³ de concreto (as vezes em uma betoneira manual) para concretar uma laje e você gastava duas semanas para um serviço desse.

Hoje, com esses modernos caminhões betoneiras e dependendo do tipo de aplicação, numa obra, você pode trabalhar com mais 200 m³ de concreto e um serviço que você fazia em duas semanas você faz em um dia”, diz o mestre de obras.
 
Mas Heleno ressalta que essas facilidades também fizeram com que o trabalhador da construção civil tivesse que se especializar mais, se capacitar e buscar mais estudo. Do alto de seus mais de 40 anos de experiência profissional, o mestre de obras dá a dica: “mesmo nesse momento difícil, o mercado dá muitas e boas oportunidades para quem se capacita e se esforça”, afirma Heleno.
 
Heleno diz  que mesmo com as décadas de experiência que tem está sempre buscando mais conhecimento. “Um curso muito bom que fiz e que eu recomendo é o de leitura de projetos, algo que até alguns anos atrás era proibido para os operários, porque havia alguns engenheiros que diziam que a gente não entendia nada e que não era função nossa. Hoje felizmente isso mudou muito”, afirma.

Especialização

A modernização dos processos de construção também gerou uma maior segmentação das funções dentro de um canteiro de obras, ou seja, hoje em dia a indústria da construção civil requer uma mão de obra cada vez mais especializada e consequentemente mais cara.

“Algumas funções como carpinteiro e pedreiro de acabamento (responsável pelo acabamento fino), que requerem uma capacitação técnica maior, são muito valorizadas hoje.  Dependendo do nível técnico e da experiência desse profissional, ele chega a ganhar fácil um salário acima de R$ 5 mil”, afirma o engenheiro civil Leonardo Bifaroni, da Construtora Queiroz Silveira.

Operário empresário

Muitos operários chegam a um nível de valorização profissional tão grande, que preferem deixar de trabalhar com carteira assinada e montar sua própria empresa para prestar serviço terceirizados para as construtoras. Esse, por exemplo, é o caso de Carlos Roberto Quaresma Varge, 41 anos, que depois 15 anos como empregado em vários empreendimentos resolveu virar dono de seu próprio negócio.

 “Confesso que é uma coisa que eu nunca esperava conseguir com meu trabalho na construção civil: ser o dono do meu próprio negócio”, revela Carlos Roberto, que há cinco anos e juntamente com outros dois sócios, que também são operários,  resolveu abrir uma empresa.

Com mais 20 anos de experiência na construção civil, Carlos Roberto se especializou como pedreiro de acabamento fino, ou seja, a parte da obra mais cara e que requer mais conhecimento técnico.

Ele conta que além das duas décadas de experiência, sempre aproveitou os cursos oferecidos nas empresas em que trabalhou, entre elas a Queiroz Silveira, que hoje contrata os serviços de sua empresa.

“Esses cursos e treinamentos me ajudaram muito. Foi muito bom para aprender essas novas tecnologias”, afirma.

Ele avalia que, com melhores condições de trabalho nos canteiros de obras, que hoje são muito mais seguros do que há 30 ou 40 anos, a mudança de cultura e com as novas tecnologias muita gente tem deixado de ver o trabalho de peão de obra como algo temporário e uma profissão da qual antes não se tinha muito orgulho.

 “Eu desde os meus 20 ou 21 anos, quando comecei na construção sempre gostei dessa área e por isso me dediquei. Hoje continuo gostando muito e me orgulho muito do que faço”, alega Carlos Roberto.

Mudança de cultura

Essa mudança de cultura e valorização dos operários da construção civil já é uma realidade consolidada em muitas grandes empresas do ramo. Visando manter e atrair os bons profissionais para suas obras, muitas construtoras, além de bons salários, têm investido em benefícios que ajudam a melhorar as condições e o ambiente de trabalho.
 
Em Goiânia, a Consciente Construtora e Incorporadora é uma das empresas já reconhecida no mercado por suas políticas sociais em favor de seus colaboradores. Lá, os operários têm acesso, dentro dos canteiros de obras, a refeitório com self service e cardápio elaborado por uma nutricionista, a academia de ginástica com professor de educação física e a salas de aula de Ensino Fundamental e Médio.

“Mais do que uma questão social, essas ações trazem um retorno muito bom para a empresa, pois fideliza os bons profissionais e atrai outros”, afirma Felipe Inácio Alvarenga, coordenador do Setor de Responsabilidade Socioambiental da Consciente.
 
Trabalhando há oito anos na empresa, o encarregado de eletricista, Rafael Costa de Souza, 31 anos, afirma que construtoras como a Consciente, são muito bem vistas pelos trabalhadores, por causa da “forma acolhedora e do ambiente de trabalho harmonioso que elas proporcionam. “Eu mesmo, conheço muitos colegas que trabalham em outros lugares e sempre me perguntam por vagas aqui na empresa”, conta Rafael.

Sobre os benefícios oferecidos pela empresa, o encarregado de eletricista diz que tais ações realmente fazem a diferença e que muitos empregados pensam duas vezes antes de sair da empresa por causa do ótimo ambiente de trabalho.

“Essas coisas trazem mais qualidade de vida para o trabalhador e isso indiretamente melhora a produtividade desse profissional. Eu mesmo no começo desse projeto de academia na obra usei muito. Hoje até tomei gosto pelo esporte e pratico jiu jitsu. Também conheço muito colegas que tinham problema de coluna e com as orientações do professor na academia já não sentem nada”, afirma Rafael. (Foto: Dênio Simões/ Agência Brasília)

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