Segunda-feira, 01 de julho de 2024

Em 3 anos, Lava Jato populariza termos como delação e condução coercitiva

O conjunto de operações realizadas pela Polícia Federal (PF) está em sua 38ª fase, com 202 conduções coercitivas, 78 acordos de delação premiada e nove acordos de leniência

Postado em: 18-03-2017 às 14h00
Por: Toni Nascimento
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O conjunto de operações realizadas pela Polícia Federal (PF) está em sua 38ª fase, com 202 conduções coercitivas, 78 acordos de delação premiada e nove acordos de leniência

Considerada a maior operação contra a corrupção da história do
Brasil, a Lava Jato completou três anos nesta sexta-feira (17). O
conjunto de operações realizadas pela Polícia Federal (PF) está em sua
38ª fase, com 202 conduções coercitivas, 78 acordos de delação premiada e
nove acordos de leniência.

Nesse período, a investigação tornou
populares termos como condução coercitiva, delação e acordo de
leniência. Mas você sabe o que cada um deles significa? Confira abaixo a
explicação de alguns dos termos que ficaram mais conhecidos com a Lava
Jato:

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Delação premiada

A delação premiada
é um acordo firmado com o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia
Federal (PF) no qual o réu ou suspeito de cometer crimes se compromete a
colaborar com as investigações e denunciar outros integrantes da
organização criminosa em troca de benefícios.

O professor de
direito penal da Universidade de Brasília (UnB), Pedro Paulo Castelo
Branco, explica que o delator pode fazer parte de uma organização
criminosa ou estar fora dela. “A delação diz respeito a um meio de
obtenção de provas. O delator não passa de um réu colaborador.
Auxiliando a Justiça, ele pode desarticular uma organização criminosa”,
conclui.

A delação pode ser proposta pelo Ministério Público,
pela polícia ou pela defesa do investigado. Os benefícios variam de
perdão judicial, redução da pena em até dois terços e substituição por
penas restritivas de direitos. Porém, isso depende da efetividade da
colaboração e seu resultado. “O delator normalmente pede a redução da
sua pena, da sua condenação. Se ele já foi condenado há uma revisão da
condenação, se não foi condenado a colaboração dele faz com que a
tipificação possa ser revista para que ele tenha uma pena menor ou não
seja apenado”, explica Castelo Branco.

Nos acordos de delação
premiada, o colaborador renuncia ao seu direito ao silêncio e fica
compromissado a dizer a verdade. Mas a mesma deve apontar provas
concretas e não somente a delação em si. O criminalista destaca que o
delator precisa comprovar a existência do delito. “Ele tem que comprovar
que o que está falando é factível, substancial e necessário ao
inquérito. Caso a pessoa não comprove suas informações, ela pode ser
responsabilizada penalmente pela prática da pronunciação caluniosa”,
explica.

O juiz não deve participar das negociações para
formalização dos acordos de colaboração. Apenas o colaborador, seu
advogado, o delegado de polícia e o representante do Ministério Público
participam. Só então, o termo resultante do acordo é encaminhado ao juiz
para homologação com cópia da investigação e das declarações do
colaborador. Após a homologação, iniciam-se propriamente as medidas de
colaboração. Não há prazo determinado para a coleta de depoimentos, uma
vez que o término da delação depende do volume das informações
fornecidas.

A primeira lei a prever esse tipo de colaboração no
Brasil foi a Lei de Crimes Hediondos. Posteriormente, passou-se a prever
a delação premiada também para crimes contra o Sistema Financeiro
Nacional, contra a ordem tributária e aqueles praticados por organização
criminosa. Contudo, o procedimento em todo seu conjunto foi previsto
apenas pela Lei 12.850/2013, que prevê medidas de combate às
organizações criminosas.

Acordo de leniência

A
medida é parecida com a delação premiada. O acordo de leniência é
firmado com a pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, que cometeu ato
ilícito contra a administração pública, mas se dispõe a auxiliar nas
investigações, em troca de benefícios para sua pena. As definições do
acordo de leniências estão estabelecidas na Lei nº 12.846/2013,
conhecida por Lei Anticorrupção. O programa de leniência também faz
parte do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, conforme a Lei nº
12.529/2011.

O órgão responsável por celebrar os acordos de
leniência no âmbito do Poder Executivo Federal é a Controladoria-Geral
da União (CGU). No entanto, este benefício também pode ser concedido
pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como estabelece
a lei nº 12.529/11.

“O acordo de leniência envolve uma relação
econômica para que possa ser firmado, ele é feito pelo Cade. Se houver
colaboração com as investigações e com o processo administrativo nos
delitos de ordem econômica, essa empresa que tenta o acordo pode ser
favorecida com a não punibilidade das pessoas envolvidas”, destaca
Castelo Branco.

O professor explica que esse tipo de acordo teve origem no direito
norte-americano, com o objetivo de coibir a prática de infração à ordem
econômica. Em troca de colaboração nas investigações, os direitos dos
acusados são: ter suas penas amenizadas, pagar multas menores ao Estado e
continuar a poder participar de licitações públicas. Além disso, há a
possibilidade de sequer existir punição, isentando a empresa ou a pessoa
de responsabilidade criminal.

Condução coercitiva

A expressão ficou mais conhecida quando em março do ano passado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
foi levado para depor. A medida foi autorizada pelo juiz Sérgio Moro,
responsável pela Operação Lava Jato, sob a justificativa de que serviria
para proteger o próprio Lula. Após ser liberado, o ex-presidente
afirmou que não foi intimado previamente, garantindo que, caso tivesse
sido convocado, teria comparecido voluntariamente.

A condução
coercitiva não se trata de prisão em nenhuma de suas modalidades, que
são flagrante, temporária ou preventiva. É um instituto processual
presente no artigo 218 do Código de Processo Penal. Os requisitos para a
condução coercitiva são a intimação ou comunicação regular para
comparecimento ao ato e a recusa injustificada de quem foi intimado e
não compareceu. O instrumento prevê a competência do agente policial de
conduzir pessoas para prestar depoimentos, respeitando-se suas garantias
legais e constitucionais.

Até o momento, a Lava Jato teve 202
conduções coercitivas. Para Castelo Branco, ela também é uma medida de
caráter cautelar, que objetiva a colheita de provas necessárias à
fundamentação de uma condenação ou absolvição de uma pessoa.

“O
juiz manda conduzir coercitivamente uma pessoa, mas não pode prendê-la
por mais de 24 horas, porque isso geraria o abuso de autoridade. Ninguém
pode ser preso se não for em flagrante de delito ou ordem escrita da
autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença
condenatória ou no curso de investigação ou do processo em virtude de
prisão temporária e preventiva”, destaca o criminalista.

Offshore

Offshore,
palavra cujo significado em inglês é “afastado da costa”, é um termo
utilizado para se referir a contas bancárias ou empresas abertas no
exterior, geralmente em paraísos fiscais, onde os titulares buscam
melhores condições em relação ao seu país de origem, como isenção de
impostos e sigilo fiscal. A abertura de uma empresa offshore é
permitida pela legislação brasileira, desde que seja declarada à Receita
Federal e ao Banco Central, em caso de patrimônio superior a US$ 100
mil.

Para o Ministério Público Federal (MPF), trata-se de empresa
criada em um paraíso fiscal no qual as leis dificultam a punição de
crimes e a identificação do real beneficiário. “Embora possa ser
utilizada para fins lícitos, é comum o seu uso para propósitos
criminosos, caso em que funciona como uma empresa de fachada” segundo o
MPF.

Quando criada para fins ilícitos, a offshore é
registrada em nome de “laranjas” do país em que é constituída, os quais
outorgam procuração ao verdadeiro dono com amplos poderes de gestão da
instituição de fachada. Esse verdadeiro dono pode ser, por exemplo, um
agente público corrupto que, no momento seguinte, usará a offshore para abrir uma conta em algum outro país, onde esconderá o dinheiro sujo.

Embora
constituída em um paraíso fiscal no exterior, essa empresa nunca
desenvolve negócios reais no exterior, não possuindo, usualmente, mais
do que uma caixa postal para o recebimento de correspondências. “No caso
Lava Jato, o uso fraudulento de offshores foi identificado.
Descobriu-se, por exemplo, que funcionários da Petrobras abriram contas
para receber propina, em vários países, as quais estavam em nome de
empresas offshores. Doleiros, igualmente, usaram offshores para, em nome delas, esconder dinheiro sujo no exterior”, diz o MPF.

Usufrutuário

A palavra foi usada pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao se defender da acusação de ser o titular de
contas milionárias na Suíça. Ele alega que é “usufrutuário em vida” de
ativos geridos por um truste (monopólio de empresas). Usufrutuário é
aquele que não é dono, mas tem direito, por lei, de usar determinado
bem.

Declínio de competência

Para os
casos de políticos e demais pessoas que perderam o foro privilegiado,
como os integrantes do governo  Dilma, por exemplo, o Ministério Público
fez 211 pedidos de remessa de trechos das delações para instâncias
inferiores da Justiça. Isso é chamado “declínio de competência”, já que o
inquérito seria retirado do Supremo Tribunal Federal (STF).

(Agência Brasil)

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