Padre Júlio Lancelotti denuncia aporofobia e arquitetura hostil registrada em Goiânia

Desprezo e rejeição aos pobres busca impedir que moradores em situação de rua sejam vistos, mas não resolve o problema da pobreza, da falta de habitação e da desigualdade na capital

Postado em: 13-12-2021 às 16h37
Por: Giovana Andrade
Imagem Ilustrando a Notícia: Padre Júlio Lancelotti denuncia aporofobia e arquitetura hostil registrada em Goiânia
Desprezo e rejeição aos pobres busca impedir que moradores em situação de rua sejam vistos, mas não resolve o problema da pobreza, da falta de habitação e da desigualdade na capital. | Foto: Reprodução

O padre Júlio Lancelotti, pároco paulista que atua em defesa das populações de baixa renda e em situação de rua, está denunciando em suas redes sociais casos de aporofobia praticados em todo o país. De origem grega, a palavra aporofobia remete à aversão à pobreza, se referindo ao medo e à rejeição aos pobres.

Intimamente ligada à arquitetura hostil, a aporofobia está principalmente no uso de grades, lanças e muros para impedir a aproximação de moradores de rua de residências e estabelecimentos, bem como a ocupação por parte dessas pessoas de espaços como praças, calçadas, bancos, e até embaixo de pontes e viadutos.

Uma das imagens compartilhadas pelo padre Júlio, por exemplo, mostra um viaduto localizado em Goiânia, onde a extensão inferior à estrutura foi coberta de pedras, impedindo que o local sirva como abrigo.

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Em fevereiro deste ano, um grupo de 12 moradores em situação de rua estava alojado embaixo da estrutura do viaduto, que fica no setor Sul, próximo ao Cepal. Na época, a prefeitura realizou uma operação para remover as pessoas do local, e as secretarias envolvidas na ação afirmaram que a remoção foi tranquila, contando com abordagem social, e que foram oferecidas opções de abrigo e assistência às pessoas que estavam morando dentro do buraco no viaduto.

Entretanto, uma das integrantes do grupo que vivia no local negou ter recebido a informação a respeito da possibilidade de ir para um abrigo, e argumentou que a estadia nesses lugares é por tempo limitado, de forma que acabaria voltando para as ruas depois, destituída até mesmo do local que costumava habitar, agora coberto por pedras.

Conforme explica Júlio Lancelotti, o aumento do número da população em situação de rua é uma consequência do aumento da miserabilidade e da pobreza na população. “Com isso cresce também a hostilidade, o rechaço e essa arquitetura hostil”, diz o padre.

Nesse sentido, como destaca o pároco, o objetivo não é defender que as pessoas continuem em situação de rua, mas que sejam acolhidas e não rechaçadas, uma vez que a aporofobia e a iniciativa de afastar os pobres não resolve de fato o problema, apenas demonstra a hostilidade com que esses grupos são tratados.

“Nós não estamos querendo que as pessoas morem embaixo dos viadutos. Mas que nós não fiquemos apenas na hostilidade e no afastamento dessas pessoas. Porque essa é uma linguagem simbólica. (…) É importante acender essa questão pra dizer: nós vamos hostilizar ou vamos ser hospitaleiros? Nós vamos acolher para ajudar a transformar”, afirmou o religioso.

Desigualdade

Em Goiânia, houve aumento de 33% no número de moradores em situação de rua em cinco meses, de acordo com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social (SEDHS). Em março, a pasta informou que eram 1,2 mil pessoas que estavam nas ruas, enquanto em agosto o novo dado mostrou que esse total de pessoas subiu para 1,6 mil. Com a pandemia, muitas pessoas ficaram desempregadas e, em busca de sustento, acabaram nas ruas pedindo dinheiro ou vendendo algum tipo de produto.

Simultaneamente, cresceu na capital, durante a pandemia, a venda de apartamentos de luxo. De acordo com dados da pesquisa da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO), realizada pela Brain Inteligência Estratégica, a venda dos apartamentos de luxo e superluxo – que tem valor acima de um milhão de reais – mais que dobraram no primeiro semestre de 2021, em relação ao mesmo período do ano anterior. O crescimento foi de 122%.

O contraste entre duas realidades tão distantes, bem como o tratamento dado a pessoas em situação de rua, destaca a desigualdade social que caracteriza uma cidade de extremos.

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