Pesquisa aponta saídas para o Brasil

Mercado de trabalho pode contribuir para reduzir as mazelas sociais no País

Postado em: 26-09-2017 às 06h00
Por: Márcio Souza
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Mercado de trabalho pode contribuir para reduzir as mazelas sociais no País

No Brasil, os seis maiores
bilionários têm a mesma riqueza e patrimônio que os 100 milhões de brasileiros
mais pobres. Caso o ritmo de inclusão no mercado de trabalho prossiga da forma
como foi nos últimos 20 anos, as mulheres só terão os mesmos salários dos
homens no ano de 2047, e apenas em 2086 haverá equiparação entre a renda média
de negros e brancos. De acordo com projeções do Banco Mundial, o país terá, até
o fim de 2017, 3,6 milhões a mais de pobres.

Essas são as constatações do
relatório A Distância Que Nos Une, Um Retrato das Desigualdades Brasileiras,
divulgado ontem pela Oxfam Brasil. A organização, que trabalha no combate à
pobreza e à desigualdade, resolveu publicar pela primeira vez um estudo em que
investiga, com base em vários dados, as raízes e soluções para um país onde se
distribui de forma desigual fatores como renda, riqueza e serviços essenciais.

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De acordo com Katia Maia,
diretora-executiva da entidade, o objetivo é divulgar um relatório anual sobre
a desigualdade e mostrar os diferentes problemas do tema, como, por exemplo, o
da tributação brasileira. “Nós pagamos muitos impostos. Mas não é que a nossa
tributação é excessiva, na verdade ela é injusta. A gente está abaixo da média
dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico)
[em termos de carga tributária]. Mas é uma tributação onde quem paga o pato é a
classe média e as pessoas mais pobres”, disse.

Tributação indireta

O documento identifica falhas na
forma como o imposto é arrecadado no Brasil, em contraste com outros países.
Além da alta tributação indireta, há questionamentos à isenção de impostos
sobre lucros e dividendos de empresas e à baixa tributação de patrimônio, que,
com isso, acabam contribuindo para aumentar a concentração de renda dos mais ricos.

A coordenadora do relatório
defende que é possível que as autoridades brasileiras combatam fatores que
impedem a tributação proporcionalmente igualitária, mesmo antes de uma
necessária reforma tributária. Um deles é a evasão tributária, em que somente
em 2016, segundo o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz),
deixaram de ser arrecadados R$ 275 bilhões.

Como pontos positivos dos últimos
anos, A Distância Que Nos Une credita ao mercado de trabalho o “principal
fator” da recente redução da desigualdade de renda no Brasil. Com a
estabilização da economia e da inflação nos últimos 20 anos, foi possível ao
país investir na queda do desemprego, na valorização real do salário mínimo e
no aumento do mercado formal. Há diferenças, porém, que ainda precisam ser
enfrentadas, de acordo com o relatório. Ele também enumera dados sobre as já
recorrentes diferenciações salariais entre mulheres/homens e negros/brancos que
possuem a mesma escolaridade.

“A média brasileira de anos de
estudo é de 7,8 anos, abaixo das médias latino-americanas, como as do Chile e
Argentina (9,9 anos), Costa Rica (8,7 anos) e México (8,6 anos). É ainda mais
distante da média de países desenvolvidos”, indica o estudo, complementando que
apenas 34,6% dos jovens de 18 a 24 anos estão matriculados em universidades,
dos quais apenas 18% concluem o curso.

Juventude negra e pobre é a mais afetada

“Em geral, a juventude negra e
pobre é a mais afetada pelas barreiras educacionais. Baixo número de anos de
estudo, evasão escolar e dificuldade de acesso à universidade são problemas
maiores para esses grupos, que, não por acaso, estão na base da pirâmide de
renda brasileira”, afirma.

Para Katia Maia, a construção da
sociedade brasileira é baseada em uma divisão entre cidadãos de “primeira e de
segunda categoria. “Os números são muito fortes: 80% das pessoas negras ganham
até dois salários mínimos, e estamos falando de 50% da população brasileira. A
gente olha no nosso entorno e vê as bolhas de pessoas brancas, enquanto as
negras são colocadas na periferia da cidade. É importante a gente debater e
conversar sobre o racismo, mostrando que somos iguais. Esse déficit a gente tem
de assumir, que somos país racista e enfrentar, buscar solucionar isso. É grave
porque do jeito que estão colocados, os números falam por si, a gente quase não
resolve isso nesse século”, alerta.

Embora aponte uma “notável
universalização do acesso à educação básica”, o relatório pede cuidados para
lidar com a evasão escolar, especialmente em séries mais adiantadas. No que diz
respeito a outros serviços essenciais, apesar de elogiar uma “importante
expansão” nos últimos anos, o documento coloca como desafio a ampliação do
acesso de mulheres e negros ao sistema público de saúde.

O documento lembra – como
exemplos de desigualdade – a situação de dois dos 96 distritos de São Paulo, a
maior cidade brasileira: “Dados mais recentes dão conta de que, em Cidade
Tiradentes, bairro de periferia de São Paulo, a idade média ao morrer é de 54
anos, 25 a menos do que no distrito de Pinheiros, onde ela é de 79 anos.
Trata-se de um dado que resume como as desigualdades se manifestam de diversas
formas, sempre a um preço muito alto para a base da pirâmide social no Brasil”.

Com elogios à redução geral da
desigualdade de renda e pobreza após a promulgação da Constituição Federal de
1988, o relatório considera ainda a retirada, nos últimos 15 anos, de 28
milhões de pessoas da pobreza e a saída do Brasil do Mapa da Fome, em 2015. A
parcela da população abaixo da linha da pobreza caiu, entre 1988 e 2015, de 37%
para 10%, conforme o estudo. Devido à crise econômica dos últimos anos, porém,
os governos têm feito “mudanças radicais” que, segundo o levantamento,
evidenciam uma “acelerada redução do papel do Estado” que “aponta para um novo
ciclo de aumento de desigualdades”, segundo a organização.

Garantia de direitos

A Emenda do Teto dos Gastos, que
limita os gastos públicos por 20 anos, é considerada no documento como um
“largo passo atrás na garantia de direitos”. De acordo com as constatações da
Oxfam Brasil, há a necessidade de se revisar a reforma trabalhista aprovada
recentemente pelo Congresso Nacional, “onde ela significou a perda de
direitos”. Outros entraves ao fim das “desigualdades extremas” do Brasil,
segundo a pesquisa, são a melhoria dos mecanismos de prestação de contas, mais
transparência, combate à corrupção e uma “efetiva regulação da atividade de
lobby”.

De acordo com Katia, a meta do
relatório não é defender que todas as pessoas tenham a mesma coisa e sim
mostrar os extremos que não devem ser aceitos pela sociedade. No dia em que se
completam dois anos da assinatura dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS) pelos 193 Estados Membros da Organização das Nações Unidas (ONU), com
metas para os países até 2030, a coordenadora do relatório acredita,
corroborando o documento, que as desigualdades “não são inevitáveis”.

“Elas são fruto de decisões
políticas, de interesses, e nos níveis que nós temos hoje no Brasil, são
eticamente inaceitáveis. Estamos construindo uma sociedade onde uma parte da
população vale mais que outra. Não pode ser assim, somos todos parte da mesma
sociedade. Essa distância entre nós está tão grande que a única forma de
reduzir é atuando juntos, nos unindo”, finaliza. 

Com informações da Agência Brasil. Foto: Fernando
Frazão/ Agência Brasil 

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