Especialistas defendem políticas voltadas à infância para reduzir desigualdades

Tamanha desigualdade gera impactos em toda a sociedade, e os mais afetados são as crianças, cujas necessidades nem sempre são consideradas no momento da elaboração das políticas

Postado em: 07-11-2017 às 14h00
Por: Márcio Souza
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Tamanha desigualdade gera impactos em toda a sociedade, e os mais afetados são as crianças, cujas necessidades nem sempre são consideradas no momento da elaboração das políticas

No Brasil, os donos das seis
maiores fortunas detêm a mesma riqueza e patrimônio que os 100 milhões de
brasileiros mais pobres. Tamanha desigualdade gera impactos em toda a
sociedade, e os mais afetados são as crianças, cujas necessidades nem sempre
são consideradas no momento da elaboração das políticas. A avaliação é de
especialistas reunidos no 7º Simpósio Internacional de Desenvolvimento da
Primeira Infância, que está sendo realizado nesta terça-feira (7), em
Fortaleza.

Os dados preocupam: 74% dos
domicílios com crianças de até 3 anos estão na faixa de rendimento domiciliar
per capita de até um salário mínimo, segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). A situação impacta diretamente o acesso à
educação:  75% das crianças com menos de
4 anos não frequentam creche ou escola.

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“Não é possível desenvolver uma
cidade ou um país sem investimento na primeira infância, porque a desigualdade
começa logo no início da vida”, afirmou o presidente do Conselho dos Curadores
da Fundação Marília Cecília Vidigal, Dario Guarita Neto. Crianças pobres
aprendem 500 palavras a menos do que as que foram corretamente estimuladas ao
longo da vida. No futuro, essa criança ganhará, em média, 25% a menos do que
las que foram corretamente estimuladas, disse Dario Guarita.

Além dos baixos níveis educacionais,
a desigualdade e a falta de cuidados na primeira infância contribuem para o
aumento de doenças crônicas e o atraso no desenvolvimento das capacidades
desses indivíduos, ressaltou a gerente de Parcerias para o Setor Privado do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), a antropóloga Luciana
Aguiar. Ela defende prioridade de investimentos nesse segmento populacional com
vistas à redução da desigualdade. De acordo com Luciana, a cada dólar investido
em políticas públicas voltadas para crianças na faixa etária até 6 anos,
economizam-se US$ 7 em políticas de compensação e de assistência social.

“Você consegue reduzir os
impactos de gestão pública de longo prazo”, acrescenta Luciana.

Pré-distribuição de renda

O pediatra Daniel Becker, professor
do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ, considera o investimento na
invância uma forma de pré-redistribuição de renda, que, por isso, deve ser
visto como prioridade. “Esse imperativo vale mesmo em um cenário de escassez,
como estamos vivendo agora”, pois “a desigualdade é a maior causa de sofrimento
e adoecimento no Brasil e no mundo”. De acordo com Becker, quanto mais precoce
o investimento, maior a taxa de retorno que a sociedade terá.

Para estimular a adoção de
políticas, foram convidados gestores e líderes públicos das áreas de educação,
saúde, assistência social, planejamento e cultura para o simpósio, que tem como
tema “Práticas efetivas para uma política integrada”. O evento é organizado
pelo Núcleo Ciência Pela Infância, articulação formada pela Fundação Maria
Cecilia Souto Vidigal, pelo Center on the Developing Child da Universidade de
Harvard, Insper, David Rockefeller Center for Latin American Studies da
Universidade de Harvard, pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
e pelo Hospital Infantil Sabará.

A vice-governadora do Ceará,
Izolda Cela, destacou o desafio de desenvolver políticas integradas e atacar
problemas centrais como desigualdade e violência. O Ceará é o estado com maior
número de adolescentes mortos no país, segundo o último Índice de Homicídios na
Adolescência (IHA), do Unicef, que leva em conta dados de 2014. “Nós pagamos o
preço, na expressão da violência, pela falta de cuidado, pelos contextos
insuficientes para o desenvolvimento das pessoas”, afirmou.

Apesar desse problema, Izolda
citou como exemplos positivos de políticas públicas voltadas paraa a infância,
como a criação do Plano de Cultura Infância do Ceará e também dos Núcleos de
Estimulação Precoce, existentes nas 19 policlínicas regionais, nas quais as
crianças são atendidas por equipes multidisciplinares, que a avaliam e elaboram
plano de tratamento. Nas policlínicas, a mãe também recebe orientações sobre
como estimular o desenvolvimento do filho em casa.

Daniel Becker citou intervenções
integradas, com base na família e na escola, que podem ser desenvolvidas por
gestores, em parceria com grupos da sociedade civil, a fim de causar impacto
positivo na infância, tais como ações de promoção da amamentação, terapias
comunitárias e hortas comunitárias. Becker destacou a importância, nesse
sentido, da Estratégia Saúde da Família, dada a proximidade de integrantes da
equipe, principalmente de agentes comunitários de saúde, da dinâmica familiar,
viabilizando a percepção precoce de problemas e o acompanhamento do
desenvolvimento da criança.

Tecnologia

Já Luciana Aguiar ressaltou a
importância de ações com base em tecnologias para a promoção de soluções de
baixo custo e com escala. Como exemplos, apresentou experiências desenvolvidas
na Índia, nos Estados Unidos e também no Brasil de uso de aplicativos para
divulgação de informações sobre pré-natal, amamentação e políticas públicas.

Para Luciana, a inovação é
necessária se quisermos transformar a nossa realidade e avançar em nossos
compromissos dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, metas fixadas pelas
Nações Unidas que devem ser alcançadas até 2030. Mesmo com problemas
estruturais, os especialistas afirmam que é possível e necessário implementar
ações em defesa da infância. “É uma questão de Estado. Deixa de ser uma questão
individual e passa a ser uma questão mais ampla de futuro e de nação”, afirmou
Luciana. 

Fonte: Agência Brasil. Foto: Reprodução 

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