Vagas de “faz de conta” para deficientes

Deficientes físicos enfrentam dificuldades para preencher vagas de trabalho. Ofertas demoram mais de ano para serem ocupadas

Postado em: 07-12-2017 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Deficientes físicos enfrentam dificuldades para preencher vagas de trabalho. Ofertas demoram mais de ano para serem ocupadas

Wilton Morais*

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A coordenação de seleção da Associação dos Deficientes Físicos do Estado de Goiás (Adfego) estima que sejam disponibilizadas pelas empresas mais de 200 vagas para Pessoas com Necessidades Especiais (PNE), apenas por meio de divulgação na entidade. Apenas ontem (6), a Rede Sine, em Goiás, disponibiliza 89 vagas de emprego exclusivas para pessoa com deficiência, como auxiliar de limpeza. Na área administrativa eram 15 vagas para auxiliar, entre as ofertas. 

De acordo com a coordenadora de seleção da Adfego, Andreia Matos Alves, aqueles que buscam as vagas especiais ainda enfrentam muitas dificuldades. Mesmo diante do número aparentemente elevado para pessoas com deficiência, as ofertas em geral são para áreas “tidas como primarias”. Andreia ressalta que a maioria das vagas de emprego são destinadas para atendentes de telemarketing. “Nessa área não há dificuldade de acesso. Mas para as outras, auxiliar de produção e serviços gerais, a maioria das pessoas possuem dificuldades. As pessoas com deficiência buscam áreas administrativas”.

Andreia relatou em entrevista ao O Hoje que as empresas divulgam as vagas em vários meios, sejam esses por meio do Sine, jornais ou outros. “Para atendente de Call Center chega até 15 ou 20 vagas diretas, apenas de uma empresa, diariamente. As outras, a maioria é para serviços gerais e produção. Mas tem vagas que são divulgadas há mais de ano, e não são preenchidas. A pessoa com deficiência não tem como exercer, o grau de escolaridade delas é maior”, pontuou.

Conforme a coordenadora de seleção, muitas vagas servem para cumprir a lei. “A empresa foi notificada e precisa fechar o quadro de funcionários, após a autuação. Passou à fiscalização, a empresa retira a procura das vagas”. Para aqueles que possuem curso superior, as vagas são ainda mais raras. “Há muitas pessoas buscando essa vaga. Então há muita contradição na busca em comparação com a oferta. O que é ofertado não é o mesmo que a pessoa com a deficiência busca”, ponderou.

Descriminação

Márcio Barbosa está procurando emprego há três anos, na área de administração. “Estou a procura de emprego desde 2014, mandei vários currículos, mas não tenho respostas. A dificuldade é tanto por conta da deficiência quanto minha idade, já acima dos 40 anos. Nunca obtive uma resposta por parte das empresas. Cheguei até a ir ao Ministério do Trabalho, mas não obtive resposta”, expôs.

Entre os relatos, Márcio destaca que há preconceito em ofertas de vagas que exijam um pouco mais de conhecimento. “Certa vez fiz uma entrevista, realizei o exame adimensional e levei todos os documenta. Já com o uniforme e pronto para trabalhar, a psicóloga do restaurante disse que eu era muito feio para assumir a vaga. ‘Aparência conta tudo’, ela me disse. A vaga era para o caixa de um restaurante”, contou. 

Para Márcio, o processo é desumano. “Eu recebo auxilio acidente, mas serve apenas para calar a boca. Não é suficiente. Eu sofri acidente de trabalho há 20 anos, e sempre encontro essa dificuldade”. Indignado, ele complementa, “o desamparo é muito grande, procuramos o emprego e a empresa faz de conta que respeita a lei. Quem sai prejudicado é o próprio deficiente”.  

Contratação deve ser igualitária, defende Comissão da OAB 

O presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da Ordem dos Advogados do Brasil, em Goiás, Hebert Batista, ressalta que a legislação determina as cotas de vagas para pessoas com deficiência, tanto na iniciativa privada quanto pública. “A reserva para empresas com mais de 100 funcionários é de 2%. Depois de 201, são 3%. Depois de 501 é 4%, das vagas. E acima de 1 mil, são destinadas 5% das vagas”, explicou. 

Em concursos públicos, a determinação da legislação é a quantidade máxima e mínima de pessoas com deficiência, para o número de vagas. “Deve haver pelo menos 15% dessas vagas reservadas, e até 20%, no máximo”. Nos cargos comissionados, em Goiás, desde o segundo semestre deste ano, cerca de 1% deve ser destinado para pessoas nessas condições. 

Fiscalização 

Hebert ressalta que a fiscalização com maior rigor cabe ao Ministério Público do Trabalho. “Esse tem legitimidade inclusive para assinar Termos de Ajuste de Condutas [TAC], com empresas. Além de propor ações civis públicas, contra empresas. Apesar disso, as associações também podem propor ações e exigir o cumprimento da lei”, ressaltou.

De acordo com o presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência, empresas individualizam em seleções distintas para os preenchimentos de vagas. “Não deveria acontecer essa seleção em que as empresas destinem essas vagas separadamente, as comuns e as especificas para deficientes. Se a empresa tem 100 vagas, e tem que contratar 10 com deficiência. Qualquer pessoa com deficiência deveria concorrer a essas vagas, independente do tipo”, defende.

Na visão de Hebert é preciso ter processos de seleção igualitários. “Temos inúmeras pessoas com deficiência e qualificados, são de várias profissões. É preciso acabar com essa ideia de que o deficiente não conseguiu estudar ou ir para a faculdade. Temos um número elevado de pessoas qualificadas e que são pessoas com deficiência”, ressalta o presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB, Hebert Batista. (Wilton Morais é integrante do programa de estágio do Jornal O Hoje, sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian). 

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