Redação premiada

Aluno de um colégio em Goiânia, Marcel venceu mais de seis mil redações que foram inscritas em concurso da Defensoria Pública da União

Postado em: 15-12-2017 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Aluno de um colégio em Goiânia, Marcel venceu mais de seis mil redações que foram inscritas em concurso da Defensoria Pública da União

Marcus Vinícius Beck*

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Marcel Pereira Gomes, 15, lê algumas coisas aleatórias na internet, mas não se debruça em cima dos livros por horas a fio. Campeão da 3° edição do concurso de redação da Defensoria Pública da União, que contou com mais de seis mil textos inscritos, o adolescente é visto pelos pais, amigos e professores como um jovem fora do comum. “Ele é crítico e reflexivo”, reconhece a professora de Redação, Cintia Aparecida, 45. “Nos temas de atualidade, ele é atento”, complementa a docente.

Aluno de um colégio de classe média alta no Setor Bueno, Marcel redigiu uma redação dissertativa argumentativa com o tema “Mais direitos, menos grades”. O texto, que era polêmico e tinha a intenção de discutir a problemática do sistema prisional, foi um desafio para os estudantes, menos para Marcel. “O ato de escrever o texto foi espontâneo, mas não estava dentro das minhas expectativas vencer um concurso”, revela o estudante, que foi alfabetizado em inglês, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, onde morou com a família durante boa parte de vida. 

Segundo a professora Cintia, o jovem não esbarrou nos chavões que são comuns nesse tipo de concurso, o que foi o fator principal para ele conquistar a primeira colocação. “Ele optou por ir exatamente ao contrário do que é comumente abordado nesses temas, ressaltando que o problema carcerário não será resolvido com mais prisões”, constatou a professora, acrescentando que Marcel se difere dos demais alunos da instituição pelo fato de sempre estar atento às questões da atualidade. “15 alunos da escola participaram, mas quem realmente se sobressaiu foi Marcel”, enaltece Cintia. 

A mãe de Marcel também aproveitou para evidenciar o feito do filho. Professora de inglês, Martha Helena Pereira, 50, insinua que o adolescente passa horas ouvindo música e jogando vídeo-game, e dispensa os livros. “Marcel é apaixonado por ciências exatas”, comenta. Segundo ela, é gratificante saber que o filho tem facilidade em buscar alternativas para uma sociedade mais humana. “Meu filho tem certa dificuldade em falar português, e os textos que ele escreve sempre são em inglês, primeiro”, diz.

Por meio da assessoria de imprensa, a Defensoria Pública da União afirma que o concurso de redação é direcionado aos alunos do ensino fundamental e médio, incluindo Educação de Jovens e Adultos (EJA) e das escolas de todo o país. “O certame é parte do plano estratégico da instituição e visa fortalecer a visibilidade da DPU, na defesa dos direitos de quem não pode pagar advogados para ter acesso à Justiça”, explica o órgão.

Dificuldade

Exigidos em vestibulares, provas e concursos, os textos dissertativos argumentativos costumam ser trabalhados entre alunos do Ensino Médio. Afinal, saber expor idéias com clareza pode ser a porta de entrada a vários estudantes ingressarem no ensino superior, ou em concurso público. Mas a verdade é que cada vez mais os alunos das escolas possuem dificuldades para argumentar, defender teses e construir pontos de vista. 

Essa dificuldade se torna mais acentuada quando se avalia alunos de escola pública. De acordo com levantamento realizado pelo jornal Folha de São Paulo, um em cada dez colégios com as maiores notas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2016 são de escolas públicas. No entanto, as explicações para o déficit são muitas, e partem do princípio de que os alunos demoram a pôr a primeira frase no papel e, diante disso, os professores não sabem ensiná-los. 

No entanto, é inegável que o incentivo à leitura e à escrita podem ser fatores que levem alunos a construir textos claros e concisos. Especialistas ligados à educação afirmam que quem não possui hábito de leitura vai ter dificuldade em tecer opiniões, já que todas as provas – e não apenas as de Enem, concurso e de ciências humanas – são constituídas de textos para serem lidos e interpretados. Inclusive, orienta-se que, para acabar com a falta de interesse por parte dos alunos, as escolas tornem o ensino prazeroso, e não obrigatório. 

Desinteresse

As escolas são atraem mais jovens. E a prova disso são as estatísticas do Ministério da Educação (MEC), fornecidas no ano passado. De acordo com a pasta, a quantidade de matrículas no ensino médio despencou de 8,7 milhões para 8,3 milhões na última década. Inclusive, alunos queixam-se dos conteúdos que são ministrados nas salas de aula. Por exemplo, pesquisa da Fundação Victor Civita, em parceira com o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, mostram que mais de 19% dos alunos veem o ensino de literatura como inútil.    

Escolas públicas têm desempenho menor no Enem 

O fator sócio-econômico está diretamente ligado ao desempenho dos alunos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a prática de redigir redações. Pelo menos é o que diz pesquisa feita pelo jornal Folha de São Paulo publicada na última terça-feira (12). Aproximadamente 8.314 escolas fizeram parte da pesquisa, sendo que 6.978, ou 84%, são públicas. As privadas, em contrapartida, somam 1.336 no país. 

Ao dividir o desempenho das escolas por faixa, 831 unidades aparecem entre as 10% com melhores médias. Deste montante, apenas 96, ou 12%, são públicas – sendo duas municipais, e o restante federais, técnicas ou de aplicação. Nas 10% tidas como de elite, o perfil dos alunos são mais abastados. 

Além disso, o Ministério da Educação (MEC) parou de divulgar o Enem por escola com o argumento de que os dados talvez não sejam adequados para avaliar a questão das unidades. Especialistas, por suas vezes, rebatem a afirmação, e dizem que é possível comparar escolas com o mesmo perfil sócio-econômico. 

O Enem é a porta de entrada de quase todas as universidades federais, como a Universidade Federal de Goiás (UFG), e de particular com auxílio de bolsas, como a Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). (Marcus Vinícius Beck é estagiário do jornal O Hoje, sob  orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian) 

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