Maioria das nascentes estão degradadas, segundo pesquisadores

Pesquisa realizada em Aparecida de Goiânia revela que apenas uma nascente, das nove averiguadas, estava em boas condições. Locais de vegetação nativa dão lugar a residências, igrejas e ruas

Postado em: 20-04-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Pesquisa realizada em Aparecida de Goiânia revela que apenas uma nascente, das nove averiguadas, estava em boas condições. Locais de vegetação nativa dão lugar a residências, igrejas e ruas

Gabriel Araújo*

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Na Grande Goiânia, a maior parte dos bairros é abastecida com água que vem do rio Meia Ponte e do ribeirão João Leite. Estes fluxos d’água são responsáveis pela garantia de qualidade e quantidade ideal de água para a população, mas muitas das nascentes estão morrendo. Estudo de pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) mostra que maioria das nascentes em Aparecida de Goiânia está com água em boa qualidade.

Wesley da Silva Belizário, mestre em geografia, analisou a qualidade e quantidade de água que estava fluindo nas nascentes. Para o pesquisador, foi preciso observar lixo, odor e a cor da água para entender o que estava ocorrendo nos olhos d’água. “São áreas próximas a ruas e avenidas de circulação e sem proteção. Algumas delas têm em suas proximidades áreas de depósito de entulho, lixo domiciliar e lançamento de esgoto e efluentes industriais”, afirmou o pesquisador.

A preservação das nascentes é a grande preocupação no momento, já que a água é considerada um recurso de alto valor econômico e social. “As nascentes são as responsáveis pelos fluxos superficiais, são elas que dão origem aos córregos, rios e bacias em geral. Preservá-las e conservá-las é, portanto, o grande desafio e no espaço urbano esse desafio se torna ainda maior, tendo em vista a forma como esse espaço tem sido apropriado e produzido, bem como a maneira como a natureza tem sido manuseada e atingida”, concluiu.

O Hoje visitou uma das nascentes localizada no Jardim Imperial, em Aparecida de Goiânia, e constatou o aterramento do local. De acordo com um morador da região que preferiu não se identificar há cerca de três anos algumas casas foram construídas no local da antiga nascente, que agora apareceu em outro lugar. “O pessoal começou a chegar e aterrar onde era a nascente e agora ela tá aqui embaixo. Dá para ver que o asfalto vive quebrando por causa de infiltrações e toda vez que chove isso vira um rio”, relatou.

A nascente visitada, que deságua no córrego Santa Rita, é apenas uma das que estão morrendo e que precisa de um trabalho de recuperação. “É preciso uma mudança urgente na forma como a população, o poder público e iniciativa privada veem a questão dos recursos hídricos e, sobretudo, a importância das nascentes”, informou. 

Sem cuidado, aumenta o risco de falta de água 

Goiânia e toda a Região Metropolitana corre risco de sofrer com a escassez de água. De acordo com estudo da Universidade Federal de Goiás (UFG), os principais rios e o lençol freático estão chegando a um ponto crítico de desgaste, o que eleva o risco de colapso no abastecimento hídrico.

Os pesquisadores afirmaram que o crescimento desordenado e a falta de preocupação com o desenvolvimento dos municípios coloca em risco todo o abastecimento. O relatório ainda lembra a falta de informações, sobre a captação e a qualidade da água. “Constatamos ainda uma ausência de preocupação com futuros mananciais nos planos diretores municipais”, acrescentam os coordenadores do estudo, os professores Karla Emmanuela e Maurício Sales.

De acordo com os pesquisadores, o crescimento urbano e o desmatamento são os principais responsáveis pelo aumento nos riscos, já que a malha urbana afeta a permeabilidade do solo e dificulta a absorção de água na região. 

O relatório informa que 75% da Região Metropolitana de Goiânia é constituída de pastagem, lavouras e áreas construídas, além das Áreas de Proteção Permanente (APP) não estarem completamente protegidas. “Há pouca representatividade de Unidades de Conservação em escala metropolitana e se verifica degradação elevada nas áreas de proteção permanente (APP) dos cursos de água”, contataram os pesquisadores.

Segundo o estudo, a melhor opção na busca de uma recuperação de capacidade de produção de água é a gestão compartilhada entre todos os órgãos públicos da Grande Goiânia, a população e o setor produtivo. “Não é possível garantir água para todos se não repensarmos nosso modelo de ocupação urbana e se não protegermos os mananciais. Não há outro caminho”, afirmaram.

O território em referente a esta região é banhado pelas sub-bacias do Rio Turvo, do Rio dos Bois, do Rio Meia Ponte e do Rio Corumbá.

Legislação

Conforme o Ministério do Meio Ambiente (MMA), as Áreas de Preservação Permanente, conhecidas como APP’s, foram instituídas pela última versão do código florestal em maio de 2012. Essas áreas buscam proteger o solo e corpos d’água de ocupação inadequada, além da prevenção de inundações e enxurradas. “A função ecológica de refúgio para a fauna e de corredores ecológicos que facilitam o fluxo gênico de fauna e flora, especialmente entre áreas verdes situadas no perímetro urbano e nas suas proximidades”, afirmou o órgão.

Para o MMA, o não seguimento destas normas é prejudicial tanto para o meio ambiente quanto para as populações dos centros urbanos. “Os efeitos indesejáveis do processo de urbanização sem planejamento, como a ocupação irregular e o uso indevido dessas áreas, tende a reduzi-las e degradá-las cada vez mais. Isso causa graves problemas nas cidades e exige um forte empenho no incremento e aperfeiçoamento de políticas ambientais urbanas voltadas à recuperação, manutenção, monitoramento e fiscalização das APP nas cidades”, completou. 

Preservação garante abastecimento 

No último dia 13 de março o governo estadual decretou situação de emergência hídrica nas bacias dos rios Meia Ponte e João Leite. O Estado informou que a medida buscava evitar uma piora na situação das bacias, que já estão em estado crítico, e define o uso da água de acordo com os processos de licenciamento para evitar o consumo desordenado.

A lei federal define o uso prioritário da água para o consumo humano e limpeza de animais. A Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima) indicou ao Estado que medidas urgentes para conter a situação de escassez hídrica eram necessárias.

O regime de chuvas vem diminuindo nos últimos 20 anos nas Bacias dos Rios Meia Ponte e João Leite, e a expectativa de precipitação pluviométrica para o período de fevereiro a setembro deste ano aponta para uma grande probabilidade de chuvas abaixo da média. O Governo afirmou que a medida visa evitar uma nova crise de abastecimento de água, como a que ocorreu na Região Metropolitana de Goiânia enfrentou nos meses de setembro a outubro de 2017, quando ocorreram limitações no fornecimento de água em alguns setores da capital.

Cerrado

No Brasil, a principal preocupação no momento está na capacidade de geração de água do bioma Cerrado, que vem diminuindo nas últimas décadas devido ao crescimento do agronegócio e as alterações do solo.

Pesquisa recente da Universidade Federal de Goiás (UFG) afirmou que os principais rios e o lençol freático estão chegando a um ponto crítico de desgaste, o que eleva o risco de colapso no abastecimento hídrico. 

Especialistas afirmam que o Cerrado é um dos mais importantes biomas quando se pensa em abastecimento. É nele que nascem rios como o São Francisco, Paraná e até afluentes que chegam ao Amazonas e, portanto, com a queda dos níveis da água, todo o país é afetado.

O bioma, que já chegou a estar em 22% de todo o território nacional, enfrenta o que especialistas afirmam ser o começo da extinção. Segundo a WWF (World Wide Foundation), cerca de 80% do Cerrado goiano foram retirados, 20% deram lugar a pastagens, 6% à agricultura e 14% à ocupação urbana e construção de estradas. (Gabriel Araújo é estagiário do jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian). 

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