Polícia procura pastor suspeito de sequestrar e torturar dependentes químicos em Abadia de Goiás
Em clínica clandestina, polícia encontrou 58 pessoas que declararam que eram mantidas em cárcere privado
Por: Yago Sales
Um caso de suposto desrespeito aos direitos humanos repercutiu nacionalmente após uma operação, chamada de ‘Falsos Profetas’, da Polícia Civil de Goiás, contra uma clínica que seria destinada para o acolhimento e tratamento de dependentes de tóxicos e álcool.
O caso ocorreu em uma chácara em Abadia de Goiás, que fica a 22km da capital. A Polícia prendeu cinco pessoas entre pessoas que eram responsáveis pelo local e três funcionários dessa clínica. Uma pistola também foi apreendida.
Além de não ter alvará de funcionamento para tal atividade, o proprietário do local, que também afirmava ser pastor, é apontado por denunciantes ouvidos pelos policiais e investigadores como responsável por submeter os internos a sessões de tortura. Ele é suspeito de manter os dependentes químicos em cárcere privado.
Antes, porém, segundo a investigação, essas pessoas seriam vítimas do chamado “resgate”, que é interpretado como sequestro. O modus operandi teria se repetido em várias unidades “ditas clínicas” ou casas de recuperação.
Familiares desesperados ligam ou vão pessoalmente a esses lugares e indicam o lugar onde o dependente está. Então, um grupo designado pela clínica ficaria responsável por ir ao local, supostamente amarrar e levar o dependente à força para a chácara, o que seria entendido como internação compulsória. Tudo isso sem receituário médico ou alguma decisão judicial, como prevê a legislação.
Nesta unidade em específico, a polícia investiga uma morte, o que desencadeou a operação que fechou a clínica. É que uma pessoa, que supostamente não aceitava a internação, teria reagido e sido morta pelos funcionários da instituição, agora, fechada. Segundo a Polícia Civil, o paciente teria sofrido um mata-leão.
Com a operação, desencadeada pelo delegado de Posse, Humberto Soares, foram identificados na clínica clandestina 38 pacientes. O pastor que seria responsável pelo local, Alécio Gomes Vieira Júnior, e está foragido, é apontado como o brutamonte que seria o responsável por aplicar penalidades aos internos submetidos à proibição de ter contato com qualquer coisa que fosse alheia à clínica.
O grupo foi levado à delegacia para dar detalhes da rotina no estabelecimento. Aproveitaram para corroborar a tese de que eram mantidos em cárcere privado e, ainda, seriam submetidos a violência psicológica e verbal. E afirmaram que eram dopados.
Segundo a Polícia Civil, entre os 38 anos pacientes encontrados na clínica, havia gente, além de Goiás, de Minas Gerais, Tocantins e até da Bolívia.
Os cinco presos podem responder a uma lista de crimes. Pela morte do interno que resistiu à internação à força, eles podem ser indiciados por homicídio qualificado, sequestro, cárcere privado e associação criminosa.
Casos
Em 2017, um pastor chamado Daniel Batista foi preso após a imprensa divulgar que ele mantinha, em Aparecida de Goiânia, além de internos sob tortura, um esquema de venda de balas em linhas de ônibus do transporte coletivo. Ou seja, usava a mão de obra barata para lucrar às custas dos dependentes químicos. O pastor foi preso, mas depois, ao deixar a cadeia em uma dessas saidinhas, não voltou à prisão.
Além dos casos de tortura, são comuns registros de acidentes por falta de estrutura nesses locais. É o que ocorreu em 2018 em uma dessas clínicas quando dois pacientes morreram – um de 32 e outro de 17. Outra pessoa ficou ferida. À época, a Comunidade Terapêutica Beth Shalom, localizada no Sítio Recreio Pindorama, foi fechada.