Trabalhadoras domésticas ainda estão contratadas na informalidade

No Brasil, as domésticas sem carteira assinada passaram de 4,2 milhões para 4,4 milhões. Após três anos da nova lei, 70% das profissionais ainda trabalham informalmente

Postado em: 21-08-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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No Brasil, as domésticas sem carteira assinada passaram de 4,2 milhões para 4,4 milhões. Após três anos da nova lei, 70% das profissionais ainda trabalham informalmente

A doméstica Ivoneide garante que, pelas vantagens, prefere trabalhar como terceirizada (Wesley Costa)

Raunner Vinícius Soares*

Após três anos da nova lei que intensificou a regulação que rege a trabalhadora doméstica, 70% delas ainda estão na informalidade. Em 2015 foi estabelecido a Lei Complementar 150, que assegurou direitos aos trabalhadores da categoria como FGTS, adicional noturno, seguro desemprego, salário família, entre outros. No entanto, as domésticas sem carteira assinada passaram de 4,2 milhões para 4,4 milhões, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ainda revelam que, há um ano, a parcela de domésticas informais no país ultrapassou a casa dos 70% pela primeira vez desde 2012 e, desde então, não deixou este patamar. Concomitantemente, o número de trabalhadoras com carteira assinada caiu. E com uma renda menor, os brasileiros também passaram a assumir mais as tarefas domésticas, a taxa subiu de 81% para 84,5% entre 2016 e 2017.

Ao mesmo tempo em que o número de domésticas na informalidade avança em meio à crise econômica o de empregadas registradas recua, um indicativo de que muitos estão fora dos direitos trabalhistas recém adquiridos. Desde 2014, quando a crise deu seus primeiros sinais, o total de trabalhadores sem carteira aumentou 8,2%, enquanto o de empregadas com carteira diminuiu 1,6%, ou seja, 330 mil domésticas perderam o registro. Ao todo, o efetivo de domésticas soma, hoje, 6,2 milhões de mulheres e representa quase 7%dos trabalhadores ocupados do país.

Terceirização

Uma alternativa surgiu para tentar sanar este problema crescente, em 2017, com a Lei 13.429, que legalizava a terceirização alterando a relação de trabalho entre empregado e empregador, possibilitando uma maior flexibilidade para os usuários do serviço domésticos. 

Segundo João Murilo, empresário da terceirização de serviço com a especialidade na atividade de limpeza, o que faz o cliente procurar o serviço é a segurança que uma empresa transpassa ao fornecê-lo. “Antes de começar neste ramo, uma dos principais problemas para mim ao procurar uma doméstica era a falta de segurança, porque a maioria deste tipo de serviço era recomendação e você não conhecia a pessoa que iria trabalhar na sua casa. E assim, causando um desconforto muito grande”, explica.

O empresário ainda diz que é quase unânime o número de pessoas que procura o serviço pela exacerbada regulação trabalhista, segundo ele, as famílias não tem mais condição de pagar por uma doméstica e a terceirização atende a urgência de acordo com a demanda não necessitando suportar tantos encargos. “A empresa e a família contratam por horário, por exemplo, você pode comprar 3hs ou 4hs de prestação de serviço e acaba que a flexibilidade é bem maior, a liberdade é maior, porque você pode contratar quando quiser. Além de representar mais empregos por ser um ramo que está expandindo em Goiás”, diz João Murilo.

Além disso, a reforma trabalhista de 13 de julho de 2017, que altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de acordo com o empresário, permitiu o contrato, onde o empregador e o empregado estabelecem seu próprio vinculo. “Na verdade o contrato é vantajoso para a profissional da limpeza, porque antes o dinheiro não ia para a profissional e sim para o governo e os encargos. Agora as minhas funcionárias recebem mais dinheiro, o que normalmente era só salário mínimo, elas recebem pela produtividade podendo chegar até R$ 1.300 por mês”, informa o empresário.

É o que a Maysa Melo e Santos, diretora de criação e sócia de uma empresa de marketing, relata sobre os encargos trabalhistas. Ela diz que não tem condições de contratar uma doméstica pela CLT. “Eu me casei há pouco tempo. Com isso, tive uma mudança geral de cenário. Na casa dos meus pais sempre teve uma funcionária fixa, mas hoje, além dessas profissionais estarem escassas no mercado, eu e meu marido, nesse início de vida, não temos condições de contratar uma funcionária em CLT”, explica.

A empresária fala que a rotina de trabalho não permite limpar a casa, então, contrata uma empresa terceirizada de limpeza para sua casa e agência. “Nós trabalhamos demais e não dá tempo de cuidar da casa como deveria, somente com muito esforço. A empresa de faxina, como a empresa terceirizada de limpeza que contrato, vem suprir essa necessidade de ter a casa limpa, pagando um preço justo que não pesa no bolso. Já na minha empresa não compensaria  ter uma funcionária fixa. O serviço empresarial é excelente para suprir a demanda de limpeza menor que temos”, diz Maysa.

A diretora de criação fala que seus pais possuem uma funcionaria fixa em casa, mas informa que é um luxo manter uma hoje. “Minha condição atual não me permite esse luxo. Antes da prestação de serviço terceirizado na minha vida, dividíamos as tarefas de casa, eu, meu marido e meus dois enteados. Moramos em casa, ela é grande e foi ficando pesado aliar trabalho/escola com a limpeza que tinha para fazer. Com o serviço de faxina uma vez por semana, conseguimos fazer uma manutenção básica da limpeza no dia-a-dia e isso tornou nossa rotina muito mais leve.” 

Maysa explica que uma funcionária fixa é caro e precisa existir uma relação de confiança muito séria e a grande vantagem que vê na contratação de uma empresa de limpeza é que a funcionária vai com o objetivo de fazer o trabalho dela bem feito, no tempo estipulado e ir embora. “Dificilmente tem atrasos, faltas e podemos contar com isso. E se tenho algum problema com o serviço, falo diretamente com a empresa de limpeza, pois é ela que tem que me dar a garantia do serviço. A empresa precisa treinar os funcionários para que independente de quem venha, o resultado seja o mais semelhante possível.” 

A desvantagem que a diretora de criação vê é que sempre vem uma pessoa diferente, “tenho que explicar todo o roteiro de limpeza e esquema da casa ou agência novamente. Por isso hoje eu deixo por escrito, assim qualquer uma que vier, pode ler e estar orientada. Na minha empresa, no início, limpávamos nós mesmas, mas vimos que estávamos gastando uma energia que poderia ser melhor aproveitada com pensamentos estratégicos para a empresa e nossos clientes”.

Para Ivoneide de Jesus da Silva, que trabalha na empresa do João Murilo como prestadora de serviço de limpeza, é tranquilo o trabalho e prefere prestar o serviço dessa forma, porque não  precisa trabalhar sábado e domingo, “e nem feriado.” E informa que a rotina é das 8h às 12h, na parte da manhã, e das 14h às 17h, de tarde. A parte mais difícil, segunda ela, é que ela mora no Setor Nova Era, Aparecida de Goiânia, e tem que pegar três ônibus para ir, três ônibus para voltar para casa. “O trabalho fica um pouco distante de onde eu moro, é a única coisa que é ruim”, diz Ivoneide de Jesus.

Lei da terceirização 

A lei estabelece critérios de terceirização de mão de obra pelas empresas. Atualmente, há várias empresas que oferecem uma ponte entre patrões e profissionais como cuidadores de idosos, babás e diaristas. Neste caso, estes empregados serão registrados pelas empresas, ou seja, são celetistas e não domésticos, visto que são contratados por uma pessoa jurídica. O empregador doméstico deve ficar atento, pois, se a empresa não cumprir suas obrigações, o contratante passa a ser corresponsável pelos direitos devidos. 

Para evitar este risco, o empregador deve só pagar os serviços contratados com a apresentação dos comprovantes do recolhimento do INSS e FGTS do mês anterior e não fazer o registro do empregado. De acordo com o Instituto Doméstica Legal, este é um golpe de más empresas que terceirizam o empregado, mas se aproveitam da falta de conhecimento do empregador doméstico e alegam que, quem assina a Carteira de Trabalho deve ser a pessoa física. (Raunner Vinícius Soares é estagiário do jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian) 

Confira as principais mudanças para o empregado doméstico após a reforma trabalhista 

Multa por não assinar a carteira

Patrões que não assinarem carteira de trabalhadores domésticos terão, em uma fiscalização ou ação trabalhista, além dos custos com advogados, mais o custo desta multa de R$ 800 ou R$ 3 mil de acordo com o entendimento do juiz.

Contrato de Trabalho Intermitente

As empresas poderão contratar um funcionário para trabalhar esporadicamente e pagá-lo apenas pelo período em que prestou seus serviços. Isso abre a possibilidade, no emprego doméstico, de patrões assinarem a carteira de alguns profissionais, como os cuidadores de idosos folguistas, que trabalham apenas nos fins de semana ou feriados. 

Horas extras além do limite legal

A nova lei diz que, em casos de “força maior”, o trabalhador pode precisar fazer mais horas extras do que o limite previsto em lei, que são de no máximo duas por dia. Este item torna possível que o empregado doméstico também trabalhe mais do que duas horas adicionais em um determinado dia, caso o empregador, por motivo de força maior, necessite dos serviços.

Amamentação

A Reforma Trabalhista diz que, para amamentar o próprio filho, até os seis meses de idade, a mulher terá direito a dois descansos de meia hora cada. No caso da empregada doméstica com filho de até seis meses, o patrão deve liberá-la para entrar uma hora mais tarde ou sair uma hora mais cedo.

Uso do uniforme

A nova lei tem regras sobre o assunto, portanto, fica claro que o empregador pode estabelecer o uso do uniforme e que a responsabilidade pela higiene do uniforme é do trabalhador. No emprego doméstico, normalmente o uniforme é lavado no local de trabalho, que é onde o empregado doméstico trabalha.

Novo motivo de Demissão por Justa Causa

A reforma determina que o empregado pode ser demitido por justa causa em caso de perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão. Isso significa que, no emprego doméstico.

Demissão acordada entre empregador e empregado doméstico

O artigo oficializa a demissão por comum acordo, o que reduz o custo do patrão caso os dois estejam de acordo sobre o fim do contrato de trabalho. Esse tipo de demissão é muito comum, inclusive, quando a empregada encontra um emprego melhor e pede para ser demitira, porém, só agora será oficial.  

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