Goiás lidera ranking nacional de empresas em recuperação judicial

Monitor RGF de Recuperação Judicial aponta que 306 companhias estão no processo

Postado em: 04-10-2023 às 08h00
Por: Gabriel Neves Matos
Imagem Ilustrando a Notícia: Goiás lidera ranking nacional de empresas em recuperação judicial
Lojas Americanas, por exemplo, protocolaram pedido de recuperação após rombo | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Goiás liderou o ranking nacional de empresas em recuperação judicial no encerramento do primeiro semestre deste ano. Ao todo, o estado conta com 57.262 empresas, e dessas, pelo menos 306 estão em recuperação. As holdings de instituições não-financeiras lideram a lista que traz, em segundo lugar, o setor de construção de edifícios.

Os dados são do Monitor RGF de Recuperação Judicial, que foi desenvolvido pela consultoria RGF & Associados. Segundo o monitor, a cada mil empresas, 5,34 estão nesse tipo de processo em Goiás. No Brasil, os demais estados com maior número de companhias em recuperação se concentram em Alagoas, Pernambuco e Sergipe. No país, são 2,1 milhões de empresas no total. E dessas, 3.823 estão em recuperação judicial. O setor de cana-de-açúcar, por exemplo, lidera em quantidade de processos.

A consultoria, que trabalha com implementação e acompanha de perto a vida das empresas, tinha dificuldades para saber dados mais específicos sobre se empresas para as quais prestavam serviço estavam indo bem ou não. Foi dessa necessidade, conforme explica Rodrigo Gallegos, sócio da RGF & Associados e especialista em reestruturação, que veio a ideia de trabalhar com a divulgação aberta dos dados das companhias cadastradas nos órgãos federais.

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Para chegar a esses números, a plataforma utiliza dados do Ministério da Fazenda através da base de informações disponibilizada pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), que armazena informações cadastrais das pessoas jurídicas e outras entidades de interesse das administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Assim, o monitor detalha cada setor por Estado, região e posição nacional.

“Nós trabalhamos com filtros com a base de dados. Nós excluímos primeiro as filiais — como é o caso das Americanas, que tem várias lojas e cada uma tem um CNPJ — e deixamos apenas a matriz. Excluímos também as empresas governamentais e as ONG’s”, explica Gallegos. Também no levantamento foram excluídos os microempreendedores individuais (MEI’s). O monitor apresenta o Índice de Recuperação Judicial (IRJ-RGF), que indica a quantidade de empresas em recuperação judicial a cada mil.

Realidade em Goiás

“Goiás é um estado que parece não ter preconceito em relação a utilização da ferramenta da recuperação judicial. A quantidade de 5,34 a cada mil chama a atenção. O pessoal parece conhecer bem a ferramenta e a utiliza”, observa Gallegos.

Em uma referência às ferramentas empresariais de cunho societário que aparecem no topo da lista do monitor em Goiás, com pelo menos 36 empresas no processo, o especialista afirma que “essas holdings de instituições não-financeiras são aquelas empresas que consolidam outras empresas. Obviamente quando essas empresas que estão embaixo começam a não performar, naturalmente a holding entra em recuperação judicial junto.”

Já o setor de construção de edifícios, conhecido pela instabilidade, é o que vigora no topo de quase todos os demais estados, na maioria das vezes. Em Goiás, é o que está em segundo lugar com 22 empresas em recuperação judicial. “A economia afeta diretamente esse setor, que vive de alavancagem. A partir do momento que você precisa construir um prédio, é preciso ir a uma instituição financeira para fazer um financiamento”, diz o especialista.

“E além do imóvel, também precisa haver capacidade financeira para fazer o pagamento. E o que a gente tem visto recentemente é a questão da alta taxa Selic. O endividamento está caro tanto para o consultor quanto para a pessoa que está financiando o imóvel.” Por causa disso, ele explica, ou as pessoas desistem daquele imóvel ou simplesmente não compram nada.

Ficou mantida em 11,75% ao ano,  pela oitava semana consecutiva, a expectativa para a taxa básica de juros (Selic) no fim de 2023, segundo o Boletim Focus, do Banco Central, divulgado nesta segunda-feira (2). O Comitê de Política Monetária (Copom) tem sinalizado redução. Após duas quedas consecutivas, o juro básico da economia brasileira está em 12,75%.

“Ainda que o aceno seja positivo para o mercado, com os 12,75%, as taxas continuam muito elevadas. É bom lembrar que os endividamentos e financiamentos geralmente são desse número para cima. É o valor da taxa mais alguma coisa”, salienta o especialista.

Pandemia é fator determinante para pedido de recuperação judicial 

Gallegos também observa que a pandemia da covid-19 foi um dos motivos que mais contribuíram para o crescimento do número de empresas que buscaram a recuperação judicial. “O receio provocado [na economia] por aquele momento de incerteza, fez com que o governo fizesse uma série de ações de retenção para segurar a economia, e os bancos liberaram mais créditos para segurar os empresários”, diz. “As empresas que fizeram as negociações de dívidas naquele momento, em 2019, por exemplo, no médio e longo prazo tiveram que lidar com as parcelas mais altas — o que está acontecendo agora em 2023.”

A realidade de muitas empresas que encontraram na recuperação judicial uma saída para renegociação com suporte judiciário para os problemas financeiros, advém da incapacidade que elas tiveram em algum momento de realizar os pagamentos das dívidas. “E se elas não fizerem isso, logo terão que deixar de pagar os bancos, os bancos terão de executar as garantias, e com isso as operações param e a empresa morre [falência]”, aponta Gallegos, que também relembra o recente rombo das Lojas Americanas e afirma que o caso despertou incerteza no mercado financeiro. 

A expectativa da consultoria, todavia, é que cresça o número de empresas que irão utilizar a ferramenta da recuperação judicial nos próximos meses, ainda que consideradas as previsões para a economia. “As empresas precisam trabalhar com planejamento. É preciso esperar o melhor, mas também planejar o pior”.

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