“Meu filho morreu de câncer e decidi alertar mães”

Mãe viu nas palestras uma forma de sobrevivência e um meio de alertar os pais sobre a importância do diagnóstico precoce

Postado em: 05-10-2023 às 08h00
Por: Ronilma Pinheiro
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Paulo Sérgio tinha apenas dois anos e oito meses quando recebeu o diagnóstico do câncer meduloblastoma, tumor de sistema nervoso central | Foto: Arquivo Pessoal

Dia 20 de abril de 2019. Aquele sábado se tornou o pior da vida da funcionária pública Grazielly Manzi Cavalcante, então com 42 anos. Era o fim do ciclo de sofrimento do filho de apenas 3 anos e dois meses. Paulo Sérgio Moreti Barbosa Júnior, conhecido como “grande guerreiro”, tinha morrido com câncer depois de uma saga em busca do diagnóstico enquanto era consumido, aos poucos, por uma doença que se manteve sob segredo. 

Grazielly Manzi lembrou ao jornal O Hoje que teve uma gravidez tranquila e que a criança nasceu saudável. A partir de 1 ano e meio de idade, Paulo Sérgio começou a frequentar a escolinha. “Eu acho importante relatar isso porque a maioria das mães trabalham fora, e as crianças ficam em creches, escolas ou com babá. E aí é necessário essa rede de apoio, uma escuta atenciosa desses profissionais, principalmente da educação, para conseguir ter um diagnóstico”, relembra a mãe.

Quando já estava com mais de dois anos de idade, a criança começou a apresentar os primeiros sintomas. Paulo passou a ficar irritado com frequência, começou a ter falta de apetite, febre e surgiu um pequeno nódulo abaixo do seu maxilar, “como se fosse uma íngua”, ela diz. A partir dos sintomas, a mãe passou a levar o filho ao médico. No entanto, todos os especialistas descartavam algo grave. “Ele está nascendo o dentinho, eles diziam”.

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Grazielly Manzi relata que só foi possível descobrir a doença após a família ter feito uma viagem à praia, em 2018. A mãe percebeu que Paulo estava se desequilibrando na areia, o que julgou não ser uma situação normal, já que o filho estava acostumado com o ambiente. Ainda na viagem, o menino começou a ter vômito à jato. Era o alerta.

Ao consultar o médico, ele receitou remédios para a virose, que o menino tomou durante cinco dias, até retornar para Goiânia. Outros sintomas começaram a aparecer. Segundo a mãe, na época esses sintomas não foram reconhecidos como sendo de câncer, por serem comuns, o que dificultou e contribuiu para a demora do diagnóstico.

Foram várias consultas com inúmeros especialistas, internações e suspeita dos médicos. Durante esse período, Paulo Sérgio que já lutava contra o câncer mesmo sem saber, sofria. “Mamãe, eu estou com muito medo, eu quero voltar para dentro da sua barriga, por favor, me salva”, disse o menino certa vez para a mãe. 

O diagnóstico de que a criança tinha câncer veio depois de uma tomografia da cabeça, o que para a mãe era estranho, já que o problema estaria nos vômitos. No entanto, a especialista que ela havia consultado, explicou que quando o problema do vômito não se origina no estômago, a causa pode estar na cabeça.

O nome do sofrimento da criança era meduloblastoma, um dos tumores no cérebro mais comuns e malignos em crianças. Paulo Sérgio, que tinha dois anos e oito meses quando recebeu o diagnóstico, lutou bravamente contra a doença por seis meses até chegar àquele sábado de abril e não resistir mais às dores que o fez perder tanto tempo em seus três anos e dois meses de vida. 

Ao invés de se trancar para sempre no luto, a mãe do menino criou o projeto “família PS Júnior”, que surgiu enquanto ela se debatia, por dentro, em sessões de terapia. “Eu vejo a beleza de tudo, mas eu não posso falar que não é sofrido, que não doa em mim. Com certeza dói”, afirma, ao lembrar do quanto Paulo sofreu sem ter respostas às dores que o afastaram de uma vida de menino, de criança, de bebê. E ela, que guarda fotos e vídeos da criança, passou a viajar pelo Brasil. 

Grazielly Manzi, que já se dedicava a trabalhos voluntários, onde focava em levar o lúdico como ferramenta terapêutica de cura para as crianças em hospitais, atualmente é convidada para dar palestras sobre a importância do diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil para o salvamento de vidas. “Quando se consegue um diagnóstico precoce, aumenta em até 80% as chances de cura, porque como o metabolismo da criança é muito acelerado e essa mutação é muito rápida”, afirma.

Ela acredita que nem sempre o diagnóstico precoce vai salvar a vida, mas a partir da sua experiência, pode afirmar que quanto mais cedo é  descoberto o câncer, o sofrimento da família pode ser amenizado e há uma melhor compreensão da doença. “A partir do momento que você sabe com o que está lidando, você tem mais paciência com a criança, mais sabedoria, um remédio adequado para aquele tipo de dor e  tratamento adequado”, diz a mãe.

“Quanto mais precoce, maior chance de cura”

O Câncer pediátrico representa apenas um pequeno percentual de aproximadamente 3% em relação ao câncer de adultos, segundo o Instituto Nacional de Câncer. Diferentemente do câncer do adulto, o câncer infantojuvenil geralmente afeta as células do sistema sanguíneo e os tecidos de sustentação. Ainda de acordo com o Inca, apesar das causas de câncer pediátrico serem desconhecidas, um pequeno número de casos de câncer em crianças e adolescentes, que representa cerca de 10%, se deve às anormalidades genéticas ou hereditárias.

Os principais cânceres que acometem esse público são as leucemias, linfomas e o tumor de sistema nervoso central, afirma a oncologista Leandra Queiroz, Hematologista pediátrica do Cebrom Oncoclínicas. Além desses, outros tipos podem surgir como o câncer de rim, de fígado, neuroblastoma, retinoblastoma, sarcomas, dentre outros, segundo a especialista.

Ao jornal O Hoje, Leandra Queiroz destaca a importância do diagnóstico precoce para salvar as vidas desses pequenos. “Quanto mais precoce, menos doença e maior chance de cura”, enfatiza a especialista.

No caso do diagnóstico de leucemia, ele é “suspeitado” pelo hemograma, mas a confirmação é feita na medula óssea, onde a medula está dentro do osso. “Então é feito um exame chamado mielograma e imunofenotipagem para confirmar o tipo e subtipo da leucemia”, explica

Diferentemente dos cânceres de adultos, que estão relacionados na maioria das vezes com os hábitos comportamentais, como o consumo de alguns tipos de alimentos, o hábito de fumar cigarro e o uso de álcool, o câncer infantojuvenil está relacionado com uma condição genética, quando a criança já nasce com o gene alterado, segundo a especialista.A oncologista destaca dois agravantes do câncer infantojuvenil: não resposta à quimioterapia e infecção grave devido às quimioterapias. Esses agravamentos, se não detectados, precocemente e tratados da maneira adequada, podem levar o paciente à morte. Além disso, existem os casos em que os cânceres não respondem à quimioterapia, esses casos são extremamente raros, segundo Leandra Queiroz.

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