Goiânia, 90 anos de juventude

Nove escritores convidados contam histórias que os ligam à nonagenária Goiânia

Postado em: 24-10-2023 às 13h00
Por: Redação
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Foto: Leandro Braz/O Hoje

Lêda Selma

Goiânia morena, de corpo esguio e ancas largas,
das manhãs soltas ao vento, das tardes acaloradas,
da prenhez de sol e flores em ventres ajardinados.

Terra-mulher, sedenta, de desejos tão flamantes,

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Goiânia goiana, amante, das noites tão luzidias,
das emoções sem destino, perdidas nalguma dança.

Musa de lascivas formas, cabelos de flamboiã,
morena de olhar dourado, de pele sempre suada,
dos beija-flores planando por sobre o Lago das Rosas.

Goiânia das madrugadas, dos sonhos azuis, viajores,
das praças, parques, jardins, do Bosque dos Buritis,
das parcerias com a lua, da irradiação só de amores.

Goiânia de Maria Eugênia, dos humores de poesia,
dos barzinhos, pit dogs, pamonhas e churrasquinhos,
dos filhos de outras terras, adotados pelo afeto.

Cheia de dengos e manhas, dos poetas o xodó,
balzaquiana-menina, dos goianos, bem-querer,
que ao esposar Goiás, se fez terra-mulher.

Hoje, homenageio Goiânia, dama de charmosa jovialidade nonagenária, destacando um de seus belos filhos: o Setor Oeste, dono de muitas peculiaridades, interessantes histórias e, também, senhor do Parque Zoológico e do Lago das Rosas, incrustados na Alameda das Rosas, a ‘menina dos olhos’ do Setor Oeste onde elegantes prédios, como se cordilheiras, cingem a bucólica e exuberante paisagem, reverenciada pela altivez das árvores, pelo cheiro verde de seus pulmões, pelo requinte da cabeleira cacheada dos ipês e arribadas de garças saudando manhãs e dando-lhes novos tons, sons, graça e movimento. Outro patrimônio de rara boniteza e inestimável valor, o Bosque dos Buritis.

Ah! e as praças, avenidas? Uma das mais importantes possui até patente: Praça Almirante Tamandaré, coração da Av. Assis Chateaubriand, esse, ilustre vanguardista da Comunicação. Mas outra, a Praça Paulo Brito, na Alameda das Rosas com a Rua R-12, homenagem ao jovem vice-prefeito da goiana Anicuns, assassinado covardemente, é uma ferida esculpida no bronze, em frente à casa de sua mãe. É o símbolo contra a impunidade. Um pedido silencioso, mas permanente, de justiça. E ela veio. O Setor Oeste tem voz. E grita, se preciso.

E as flores? Elas desenham formas, e as formas esculpem sonhos, e os sonhos versejam vida, e a vida respira verde, e o verde enche o bosque, que bebe água no lago, e aconchega rosas e cisnes! Um milagre diário. Outro espetáculo permanente, o acordar das manhãs embalado pelo coral dos pássaros, pelo alvoroço das araras e periquitos, em folia constante com a natureza. E, para meu deleite, a visita dos tucanos à varanda do apartamento.

Com o tempo, descobri que vários imortais da Academia Goiana de Letras moram no Setor Oeste, além de outros escritores, artistas plásticos, músicos, cantores, jornalistas… Ele também abarca escolas tradicionais, hotéis, butiques, hospitais, clínicas, laboratórios, espigões com modernos escritórios, barzinhos, restaurantes, pamonharias, pizzarias, cafés, as feiras da Lua e do Sol, igrejas e o Centro Livre de Artes a colorir, musicar e enlindecer cada canto, enfim, tudo isso é patrimônio do Setor Oeste. E, então, houve a previsível miscigenação de classes, culturas e crenças.

Um fato demais interessante: Goiânia ainda adolescia, feito moça com espinhas no rosto. A Av. C, atual Assis Chateaubriand, desvestida de asfalto, com fissuras e estrias a ferir-lhe o corpo moreno-terra, nas tardes de sábado, assim, meio desajeitada, oferecia-se para a realização de corridas de cavalos como se hipódromo fosse. Então, toda empoada, enchia-se de sol e de gente, todos amantes desse esporte que integra homem e animal (e instiga cobiças e apostas), para mais uma tarde de grandes emoções, de esperanças fincadas em velozes patas e engastadas em esperanças taquicárdicas.

Verdadeira competição, mas não apenas esportiva: de trejeitos e bocas, de grifes e saltos altos, de crinas e portes. Hum… e os chapéus?! Também, de ambos os sexos e de várias raças. Incluindo os de sedas e plumas (para as damas), o famoso Ramenzoni XXX (e outros nobres concorrentes) para os cavalheiros.

Assim, o velho Assis Chateaubriand, transformado em avenida e pista turfística, recebia jóqueis montados em promessas de sucesso, ou consolidando o favoritismo de já consagrados puros-sangues. E a elite goiana (do mais puro sangue socioeconômico) formava seletíssima plateia e solenes torcidas.

Sempre digo, com duplo orgulho, que sou baianiense: baiana de raiz (Urandi) e goianiense de frutos e floradas. Pousei em Goiânia, aos dois anos, e aqui fiquei. Cidadã Goianiense e Cidadã Goiana, títulos que confirmam minha goianidade.

Parabéns, mãe do coração! Parabéns, minha Goiânia amada, por seus 90 anos bem vividos! 

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