Perda auditiva pode ter causa genética ou na gravidez

Cerca de 91% das pessoas com deficiência auditiva adquiriram ao longo da vida, sendo que metade foi antes dos 50 anos

Postado em: 13-11-2023 às 09h00
Por: Ronilma Pinheiro
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Cerca de 91% das pessoas com deficiência auditiva adquiriram ao longo da vida, sendo que metade foi antes dos 50 anos | Foto: Reprodução

“Sabe aquela brincadeira de ‘dica’? Falar uma palavra pra acertar outra? A pessoa me falava no ouvido e eu não entendia…”. O gestor de Recursos Humanos Thiago Perné Santos, 38 anos, começou a apresentar perda auditiva ainda na pré-adolescência, quando tinha cerca de 10 a 12 anos. Para ele, foi um longo caminho do diagnóstico à aceitação de que não possuía mais um dos cinco sentidos tradicionalmente conhecidos, a audição. “Eu acho que o primeiro foi o susto. Mas o pior foi a vergonha, sabe?”, diz.

A perda auditiva transformou a vida de Thiago. Era tudo muito novo para o garoto, que agora, mudaria totalmente o estilo de vida. “Era difícil até mesmo contar para amigos mais próximos. Mostrar que não tinha mais o SitPass escolar e sim de deficiência, embora seja um benefício”, conta.

As gincanas e brincadeiras no ambiente escolar fazem parte das memórias da maioria daqueles que um dia passaram por estas instituições de ensino, seja na rede pública ou privada. No entanto, para Thiago, essas, se tornaram as piores lembranças. “Eu não sabia explicar para os colegas, mas já não entendia bem o que era falado e não conseguia participar das brincadeiras”, relembra.

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Era só um menino, que teve de lidar com o preconceito e a indiferença, enquanto tentava entender e se adaptar a uma nova realidade que chegou sem avisar e a cada dia lhe tirava um pouco mais a capacidade de ouvir. “Eu precisava pedir para trocar de carteira para ouvir melhor os professores e isso era constrangedor. Os colegas não gostavam”, lembra.

Depois da família perceber que o menino não ouvia mais como antes, procuraram ajuda médica, foi quando Thiago fez a primeira audiometria –  exame que tem como objetivo avaliar a capacidade do paciente para ouvir e interpretar sons – aos 13 anos de idade. O diagnóstico apontou que o canal da condução auditiva havia “secado ou atrofiado”, segundo o especialista que atendeu Thiago. No entanto, à época, não havia uma explicação médica. “Temos uma história, mas não uma explicação”, diz o gestor que possui uma série de pessoas surdas na família.

O otorrinolaringologista Guilherme Horbilon afirma que existem casos em que a surdez pode ser genética. “Existem casos em que a criança nasce com falta de audição devido a alterações genéticas de cromossomos, sindrômicas e não-sindrômicas, ou seja, ela pode vir acompanhada de outros sintomas além da surdez”, destaca o especialista. Além disso, tem criança que nasce com audição e vai perdendo a capacidade de ouvir ao longo dos primeiros anos de vida. “Até à juventude ela perde a audição completamente”, pontua. Esse foi o caso de Thiago, que a partir dos 10 anos começou perder a audição e à medida que ia crescendo ia perdendo um pouco mais.

Horbilon destaca ainda que as infecções durante a gestação podem causar a surdez nas crianças. E nesse caso, elas já nascem com problemas auditivos. Esse foi o caso da Joyce Maia, bacharel em direito,  que nasceu com perda profunda do lado direito do ouvido e atualmente tem perda severa do lado esquerdo. “Minha mãe tomou remédio para os rins na gravidez”, relata a mulher ao afirmar que segundo os especialistas esta foi a causa da sua perda auditiva.

Somente aos dois anos de idade que os familiares perceberam que a menina não conseguia ouvir.  Joyce, que é oralizada, passou a usar aparelhos auditivos – dispositivo eletrônico com um pequeno microfone que amplifica os sons – na adolescência e faz uso deles até hoje.

Para além desses casos mencionados acima, é importante salientar que a surdez precoce, ou seja, quando não é decorrente de questões genéticas ou de infecções na gestação, pode ser evitada, segundo o otorrinolaringologista. Desse modo, fazer exames de rotina para verificar o funcionamento da audição é uma importante forma de detectar problemas precoces e evitar complicações mais severas.

Além disso, Guilherme Horbilon lista uma série de outras metodologias que podem evitar a surdez precoce, bem como: evitar introduzir objetos ou corpos estranhos no ouvido, já pensando na precocidade da surdez na vida adulta; Cuidar da saúde em geral, evitando tudo que possa aumentar a pressão arterial, doenças cardiovasculares, metabólicas, como aumento de colesterol ou diabetes; evitar a exposição a sons de intensidade elevada por períodos prolongados.

O uso do fone de ouvido, principalmente aqueles que são intra auriculares, ou seja, que são inseridos no ouvido, são altamente prejudiciais à audição, por isso devem ser evitados. “Temos muitas pessoas hoje em dia, no mundo inteiro, com muito risco de perder a audição a longo prazo, por causa do uso excessivo de fones de ouvido, até mesmo em crianças”, afirma o especialista.

Projeto visa evitar perda auditiva no ambiente de trabalho

Mais de 1 bilhão de pessoas com idade entre 12 e 35 anos correm o risco de perder a audição devido à exposição prolongada e excessiva a música alta e outros sons recreativos, que podem impactar nas perspectivas de emprego dessa população, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Além disso, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 5% da população brasileira é composta por pessoas que apresentam alguma deficiência auditiva.

Um estudo feito pelo Instituto Locomotiva e pela Semana da Acessibilidade Surda mostra que 9% das pessoas com deficiência auditiva nasceram com essa condição e 91% adquiriram ao longo da vida, sendo que metade foi antes dos 50 anos.

Somente em Goiás, existem mais de 60 mil pessoas, entre as que nascem ou desenvolvem graus de perda auditiva ao longo da vida. Apesar disso ser um processo comum à medida que se envelhece, pode ser evitado principalmente no ambiente de trabalho, uma vez que a exposição excessiva a ruídos também é uma das causas de surdez para a população.

O fonoaudiólogo e especialista em Fonoaudiologia do Trabalho, Caio Paoli, desenvolveu o “Programa de Conservação Auditiva”, que tem o objetivo de reduzir ou evitar  a perda auditiva nos ambientes de trabalho. Inicialmente são feitas análises de forma individualizada de cada exame do funcionário de uma determinada instituição. “Por exemplo, há um funcionário que trabalha há 20 anos naquela empresa. Então a gente vai lá e analisa aquele histórico auditivo daquele funcionário”, explica.

Além do fonoaudiólogo, a equipe é composta por outros especialistas, como otorrinolaringologista, técnico de segurança, engenheiros, dentre outros. O especialista chama atenção ainda para o uso adequado dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI), nesse caso, os EPIs auriculares. “É muito importante a conscientização em como usar esse protetor. Saber colocar e tirar o protetor, bem como higienizá-lo”, pontua. Além disso, é preciso ficar atento para o prazo de troca do equipamento, segundo Paoli.

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