Segunda-feira, 01 de julho de 2024

Uma obra que nunca acaba

De acordo com a Polícia Federal os desvios comprovados por superfaturamento nas obras da Ferrovia Norte-Sul já chegam a R$ 500 milhões

Postado em: 27-09-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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De acordo com a Polícia Federal os desvios comprovados por superfaturamento nas obras da Ferrovia Norte-Sul já chegam a R$ 500 milhões

A ferrovia está em construção desde o final da década de 1980, as investigações começaram em 2012 (Wesley Costa)

Rafael Melo

Considerado um dos principais projetos para o escoamento da produção agrícola no país, as obras da Ferrovia Norte-Sul seguem sem data prevista para conclusão final. Na última semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) autorizou o governo a publicar o edital de concessão para o leilão do trecho de 1.537 km, que vai de Porto Nacional, no Tocantins, a Estrela d’Oeste, em São Paulo, e o governo decidiu deixar com a futura concessionária a conclusão do empreendimento. O projeto nacional está em construção desde o final da década de 1980 e, desde 2012, investigações vêm apontando suspeita de superfaturamento e desvio de recursos da obra. Mas escândalos travam a obra e Polícia Federal (PF) estima, até o momento, prejuízo de 500 milhões aos cofres públicos.

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Na manhã de ontem (26), a PF deflagrou outra fase da operação de combate a crimes de pagamento de propina e desvios de recursos públicos nas obras da Ferrovia. Dessa vez, a ação batizada de ‘Trilho – 5x’ investiga o destino dado a aproximadamente R$ 7,5 milhões, repassados por um escritório de advocacia e que não foram declarados à Receita Federal.  Cerca de 150 policiais cumpriram 34 mandados judiciais, sendo 33 de busca e apreensão e um de sequestro de bens. As ordens foram executadas em Goiânia, Formosa, Mineiros e Brasília.

Apesar disso, o governo afirma que cerca de 90% da obra da ferrovia já tenha sido concluída pela VALEC Engenharia, Construções e Ferrovias S.A. Para o coordenador do MBA em infraestrutura de Transportes e Rodovias do Instituto de pós-graduação e graduação de Goiás (IPOG), Edésio Lopes, a conclusão definitiva da obra é um investimento que pode reduzir consideravelmente os atuais custos logísticos elevados. “A Ferrovia Norte-Sul é considerada o principal projeto ferroviário nacional e a sétima maior obra de infraestrutura de transporte que está sendo executada no mundo. Como boa parte do transporte do país é rodoviário, há um desequilíbrio na matriz de transporte que pode ser reajustado com a conclusão dessa obra”, avalia o especialista. “Além disso, o Centro-Oeste é uma das regiões que mais produz grãos, principalmente soja, e com a finalização da rodovia todo o processo econômico tende a fluir, tanto no sentido logístico quanto da produção”, complementa Edésio Lopes.

De acordo com o boletim do Conjuntura do Transporte – Investimentos em Transporte Terrestre, divulgado no último mês de julho pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), os investimentos privados em ferrovias foram 11,9% menores, em 2017 (R$ 5,25 bilhões), na comparação com 2016 (R$ 5,95 bilhões). Já os aportes nas ferrovias públicas administradas pela Valec caíram 46,7% entre um ano e outro. 

Os principais investimentos no ano passado foram destinados à construção de trechos da Fiol, Ferrovia de Integração Oeste-Leste que liga Ilhéus (BA) a Figueirópolis (TO), de 50,8%, e da Ferrovia Norte-Sul, estimado em 35,2%. Ainda segundo a avaliação do CNT, a prorrogação antecipada das concessões ferroviárias seria a melhor saída para o governo estimular investimentos no setor. A título de exemplo, segundo o estudo, a cada R$ 1 milhão aplicado no setor, o retorno para a economia seria de R$ 3,1 milhões. 

Investigações

Os desvios de recursos da construção da ferrovia começaram a ser investigados em julho de 2012 na operação “Trem pagador”, que resultou na prisão de José Francisco das Neves, conhecido como Juquinha das Neves, ex-presidente da Valec Engenharia, empresa pública responsável pela construção de ferrovias no Brasil. Adiante, em fevereiro de 2016, foi deflagrada a operação “O Recebedor”, em Goiás, Paraná, Maranhão, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Distrito Federal, para recolher provas sobre o pagamento de propina, bem como prática de cartel, lavagem de dinheiro e superfaturamento.

Já a operação “Tabela Periódica” veio quatro meses depois, com mandados cumpridos em Goiás e mais oito unidades da federação. Em maio de 2017, o filho de Juquinha das Neves, empresário Jader Ferreira das Neves e o advogado Leandro de Melo Ribeiro foram presos na operação “De Volta aos Trilhos”. Por fim, a “Trilho – 5x”, deflagrada ontem (26), é um desdobramento de todas as anteriores, realizada com base em acordos de delação premiada e de leniência, celebrados com o Ministério Público Federal (MPF) no âmbito da Operação Lava Jato. 

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