Empresários reclamam que a falta de energia atrasa o comércio

A pouca oferta de energia para grandes consumidores, como indústrias, tem causado prejuízos e desacelerado a geração de emprego no Estado

Postado em: 23-10-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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A pouca oferta de energia para grandes consumidores, como indústrias, tem causado prejuízos e desacelerado a geração de emprego no Estado

O empresário Marcelo Augusto não teve condições de iniciar os trabalhos na fábrica de sacolas pois a Enel não fornece energia

Felipe André* 

Empresários reclamam que a falta de oferta de energia elétrica em Goiás tem atrasado a abertura de novas unidades ou impedido a ampliação de fábricas no Estado. O empresário Marcelo Augusto passa por um momento delicado com a fornecedora de energia de Goiás, a Enel. Com uma empresa pronta, ele espera desde o começo do ano o fornecimento de mais energia para começar a trabalhar. 

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Marcelo é dono de uma indústria de sacolas plásticas personalizadas que atende supermercados em Goiânia – entre outros clientes – decidiu ampliar o negócio que já contava com cinco sedes em todo o país. Um galpão foi alugado no valor de R$ 10 mil no conjunto Vera Cruz e 40 funcionários de maneira direta, além de outros 30 de maneira indireta para começar a trabalharem em agosto, só que não ocorreu como o esperado.

“A clientela daqui a gente atendia com a nossa matriz de Campinas, em São Paulo, aqui tínhamos o centro de distribuição. O negócio foi crescendo e decidimos abrir uma indústria em Goiás. Estou trazendo meu produto de São Paulo, mas não consigo energia”, apontou Marcelo.

Porém a disputa de Marcelo começou ainda em fevereiro, quando alugou o local e pediu um reforço de energia, pois segundo ele, o que seria disponível normalmente não atenderia para a funcionalidade da indústria.

“Preciso de um aumento de carga, a máquina não funciona na energia comum. 400 kva, é a capacidade quase que triplicada, mas eu tenho um documento que aceita a liberação”, revelou o empresário. Esse documento foi prontamente atendido pela Enel que caminhava para um final feliz, o problema é a falta de energia em Goiás. 

Caso essa situação não mude ainda neste ano foi decidido que a indústria vai mudar para outro estado. “Se não conseguir essa energia até dezembro, vou para Minas Gerais ou outro local, já tive que dispensar 40 pessoas que tínhamos selecionado para o início da fábrica. A matriz está custeando todo a nossa despeza até hoje, mas eu já tenho uma previsão do presidente do grupo que se não ligar até dezembro a gente vai mudar”, anunciou Marcelo.

Investimentos 

O engenheiro eletricista Nélio Fleury explicou o que tem acontecido com Marcelo e outros empresários que planejam investir no Estado. “Quando tem uma consulta para saber se tem energia a resposta deles [Enel] é que não tem. A Enel é a empresa de distribuição, mas está tendo uma indisponibilidade de energia elétrica não está chegando energia suficiente na subestação, para os consumidores. A culpada é a Eletrobrás, regulador do sistema. Ninguém vai colocar nova indústria em Goiás sem energia. A melhor opção para o investidor é continuar no Sul/Sudeste”, disse Nélio Fleury.

O engenheiro ainda ‘deu um recado’ para o próximo governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que assume em 2019. “Se o Caiado quiser atrair investidor para Goiás precisará resolver esse problema, do micro ao macro empreendedor. Entre água, telefonia, energia e impostos, a dependência da energia afeta o faturamento em até 75% (mensal). Um hospital, por exemplo, que funciona normalmente só de tirar da tomada o faturamento cai no mínimo em 75%”, completou Nélio Fleury.

Privatização

Em março do ano passado a Enel assumiu o controle da Celg, a transição havia sido confirmada em 2017, o que pode ter atrapalhado o empresário Marcelo Augusto. 

A venda da Celg para a Enel foi concluída em 14 de fevereiro de 2017, por R$ 2,187 bilhões. Com a locação do galpão ainda em fevereiro, Marcelo acredita que quando a distribuidora de energia era comandada pelo governo a oportunidade de criar empregos era atrativa.

“A gente sabia que era um pouco demorado [todo o processo], porém depois que decidimos abrir foi privatizado [a distribuidora], talvez quando era do governo era interessante pelo fato de gerar empregos, acredito que seria mais fácil. São pouquíssimas indústrias de sacolas em Goiás, a gente sabia que ia demorar, mas não tanto, estou há oito meses tentando ligar essa energia”, revelou o empresário Marcelo Augusto.

Durante a apresentação a empresa prometeu em reduzir 40% as quedas de energia na capital goiana até 2020. No Brasil, a Enel também no Rio de Janeiro, Ceará e Rio Grande do Sul.

Enel

Contatada pela equipe de reportagem do O Hoje, a Enel informou que os pedidos de novas ligações são analisados dentro de 30 dias. Porém ressaltou que algumas solicitações pendem de obras estruturais, como construção de linhas e de subestações. A empresa aproveitou para informar que investiu cerca de R$ 800 milhões apenas em 2017 e que está investindo mais R$ 800 milhões neste ano.

Segundo a assessoria da empresa, a Enel busca melhorar e ampliar a capacidade da rede de distribuição no Estado com os grandes investimentos. Entretanto dissera que o reflexo na qualidade do serviço será percebido gradativamente pelos consumidores no médio prazo. 

Time goiano compra gerador para não depender da Enel 

O Atlético Clube Goianiense que recentemente reinaugurou o Estádio Antônio Accioly, localizado em Campinas, decidiu comprar um gerador para não correr riscos com quedas de energia com os refletores. O clube goiano que disputa o Campeonato Brasileiro Série B utiliza a energia do governo apenas para outros setores, como por exemplo o bar e o sistema de locução e de som.

O engenheiro Nicolas Brandão que trabalha há mais de dois anos no Dragão Campineiro explicou a tática utilizada no Estádio Antônio Accioly e os problemas de queda de energia, um risco que não pode correr nos jogos noturnos da Série B. Queda de energia é um problema recorrente em diversos estádios no país, que acarreta em um grande atraso na partida, pois o refletor precisa aquecer para voltar a funcionar, o que geralmente demora cerca de 30 minutos.

“É fato que sempre tem muita queda de energia em Goiânia, por isso optamos por ligar os refletores ligados direto no gerador, ainda mais nessa época de chuva que a energia cai mais. Às vezes tem queda na rede, porém não podemos correr esse risco durante o jogo, podemos correr o risco de menor impacto – como o bar – mas não no refletor”, ressaltou o engenheiro do clube Nicolas Brandão.

Apesar de não revelar o valor gasto pelo clube na compra do gerador, Nicolas Brandão admitiu que além da falta de energia o valor cobrado pela Enel foi essencial para a escolha do gerador. 

“O nosso gerador é comprado, é do Atlético Goianiense. No jogo contra o Sampaio Corrêa (12 de outubro) no Estádio Antônio Accioly, ele [gerador] ficou 4 horas ligado, geralmente o gasto é cerca de 240 a 260 litros de diesel, mais ou menos 65 litros por hora. Precisa ser o diesel comum, compramos por R$ 3,88. Além do problema de queda, a energia é cara, fica mais barato com o gerador. Em longo prazo o gerador compensa, o custo inicial que é maior se paga com o tempo”, explicou o engenheiro. 

Aumento da tarifa de energia pode parar na Justiça  

Na última terça-feira (16) foi aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) um reajuste médio de 18,54% para os consumidores. O reajuste dos consumidores de baixa tensão, prioritariamente clientes residenciais, foi de 15,31%. Já para os clientes de média e alta tensão, em geral indústrias e grandes comércios, o índice aprovado foi de 26,52%. Porém esse aumento pode acabar na Justiça.

“Nós tentamos administrativamente evitar que a Aneel desse o aumento, mas eles aprovaram, nos restou buscar o caminho da Justiça. O Fórum das Entidades que vai entrar na Justiça, não apenas a Federação. Como temos uma inflação de 3%, a população sem renda acontece um aumento desse valor. Pode ser legal, mas é imoral”, revelou o Presidente da Federação das Indústrias (Fieg), Pedro Alves de Oliveira.

Pedro ainda confirmou que os advogados já estão trabalhando no caso para entrar com uma representação legal. Assim como as demais reclamações, ele concordou com as acusações que a energia não está sendo de qualidade. Segundo ele, o fornecimento está deficiente o que acarreta nas dificuldades para as empresas.

“A questão é o seguinte, o fornecimento de energia está deficiente. Além das dificuldades das empresas de conseguirem energia tem problemas de interrupções, ou seja, quedas de energia. Com a privatização a expectativa era de que a energia pudesse ser melhorada, mas ainda tem falhas que precisam ser corrigidas”, ressaltou o presidente da Fieg.

Entenda

As tarifas de energia são de responsabilidade e definidas pela Aneel baseado nas leis e regulamentos federais, porém não é de responsabilidade da Enel: impostos, encargos setoriais, custos de geração e transmissão de energia. Os valores são arrecadados pela distribuidora, pela tarifa de energia, e repassados às empresas de geração, transmissão e para o Governo Federal. De acordo com a Aneel, a revisão tarifária está prevista nos contratos de concessão e busca obter o equilíbrio das tarifas. (Felipe André é estagiário do jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian) 

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