Mães de autistas lutam por respeito e contra preconceito com filhos

Para muitos, atos de preconceito podem parecer pequenos e irrelevantes, mas para a Núbia Aparecida de Sousa, 42, mãe do pequeno Miguel, 5, que está no Transtorno do Espectro Autista (TEA), essas atitudes atingem mãe e filho de forma que chega a ser dolorosa.

Postado em: 06-04-2024 às 09h30
Por: Ronilma Pinheiro
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Miguel de Sousa, 5, que está no Transtorno do Espectro Autista (TEA), durante intervenção | Foto: Leandro Braz/O HOJE

Para uma festinha infantil, não são convidados. No restaurante, não podem comer na marmita mesmo que o prato seja muito raso, o que torna o ato difícil já que a coordenação motora não ajuda em muitos casos. Na igreja, as pessoas olham com a cara ‘feia’ pois não conseguem ficar quietos. Até mesmo nas filas preferenciais, há olhares com estranheza por acharem que não há necessidade de estar ali. Essas são algumas das situações que mães de autistas passam no dia a dia com os filhos.

Para muitos, esses atos podem parecer pequenos e irrelevantes, mas para a Núbia Aparecida de Sousa, 42, mãe do pequeno Miguel, 5, que está no Transtorno do Espectro Autista (TEA), essas atitudes atingem mãe e filho de forma que chega a ser dolorosa. Núbia diz à reportagem do jornal O Hoje, que por causa desse tipo de situação, se  afastou pouco a pouco da sociedade. “Me afastei para não ter que passar por esse tipo de preconceito”, lamenta.

Carla Lacerda do Nascimento, jornalista de 43 anos, é mãe do João Lucas, 11 anos, que também está no TEA. Ela conta que desde que o filho foi diagnosticado com a condição aos dois anos de idade, a família já enfrentou diversas situações de preconceito e intolerância. O caso mais impactante ocorreu recentemente, quando a família precisou se mudar do condomínio onde moravam e no novo local, os moradores passaram a fazer reclamações em decorrência do barulho da criança. “João atualmente tem passado por uma crise de ansiedade e como ele é um autista não verbal, ele é nível 3. Às vezes essa dificuldade de conversar, de se expressar o faz gritar”, explica Carla Lacerda.

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A mãe conta que uma colaboradora da família tentava explicar a situação para os moradores, que interfonaram reclamando do filho, mas no geral, eram ríspidos. Após conversar com o síndico e explicar a situação em reuniões com os vizinhos, as reclamações diminuíram, mas as consequências emocionais ficaram.

A jornalista aprendeu a ignorar os olhares e focar no bem-estar do filho, quando sai para passear ou precisa interagir com o meio social de alguma forma. E nessa caminhada, sempre que pode passar informação e conscientização, o faz.

Para a mulher, o dia a dia é comparado a uma montanha russa. “ A gente nunca sabe como vai ser, de manhã pode ser de um jeito, à tarde de outro, por isso que eu acho que a conscientização, a divulgação de informações corretas sobre o autismo são essenciais”, comenta.

O TEA é um distúrbio do neurodesenvolvimento que causa comportamentos diferenciados para o indivíduo, como o atraso na fala, dificuldade de interação social, dificuldades cognitivas algumas vezes, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades. A explicação é da Especialista ABA e Neuropsicóloga, Nise Portela.

A médica esclarece que a pessoa nasce autista, ela não se torna ao longo do tempo. “É uma neurobiologia de base genética que determina se esse indivíduo será ou não autista no seu nascimento”, detalha. No entanto, existem fatores hereditários que influenciam na possibilidade de uma criança nascer autista. “Se existem parentes ou os pais são autistas, essa probabilidade de uma criança nascer com a deficiência aumenta exponencialmente”, explica a médica.

Mas, além da hereditariedade, outros fatores podem contribuir para que a criança nasça com o TEA, como é o caso da prematuridade e da idade parental, seja da mãe ou do pai. “Mas o que se sabe hoje é que o autismo tem uma base quase prevalente genética”, reitera a especialista.

O diagnóstico do autismo é feito por um médico especializado, que geralmente é um neuropediatra ou um psiquiatra infantil. Esses profissionais conseguem identificar essas lacunas no desenvolvimento, ou seja, as características que surgem na primeira infância. Portela chama atenção para o diagnóstico precoce, uma vez que, quanto mais cedo ocorrer a intervenção, melhor o prognóstico deste paciente. 

No caso do pequeno Miguel, o seu desenvolvimento foi de uma criança normal durante os primeiros meses de vida. Segundo a mãe, o filho teve um bom desenvolvimento, falou suas primeiras palavras e andou no tempo esperado. No entanto, os primeiros sinais de alerta surgiram quando Miguel completou o primeiro ano de vida. “Com 1 ano e meio ele começou a diminuir o vocabulário e com 2 anos completos não falava mais”, relembra Núbia, ao afirmar que foi nessa época em que começou a perceber que algo não estava certo.

Ao consultar um pediatra, surgiram as primeiras desconfianças de que poderia ser autismo. O diagnóstico final foi de um especialista em neuropsicologia. O laudo constatou os seguintes sintomas: falou e parou de falar; andar na ponta dos pés; estereotipias flapping com as mãos;  não respondia quando chamado pelo nome; só assistia 1 desenho e não aceitava ver outra coisa; não olhava nos olhos; sono leve acordava no meio da noite e não dormia mais; gostava de ficar sozinho; se escondia quando alguém chegava em casa; não brincava com brinquedos; não interagia com outras crianças.

Desde que recebeu o diagnóstico, o menino faz as intervenções com uma psicóloga e o neuropsicólogo, que deu o laudo. Atualmente, Miguel é acompanhado por uma série de especialistas, dentre psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeuta e psicomotricidade.

O pequeno Miguel ainda precisa de muito apoio para se vestir, ir ao banheiro pois ainda não tem desfralde, tomar banho e fazer as demais atividades diárias. Ele também não aceita cortar o cabelo e nem as unhas devido à auto sensibilidade.  Mas a mãe já comemora as conquistas que têm alcançado com muito esforço. “Já tivemos vários ganhos e apesar dele ainda não falar, se comunica de outras maneiras apontando pegando objetos. Frequenta o CMEI”, comemora.

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