Denúncias de crimes contra idosos crescem mais de 15% no estado 

Nos primeiros três meses de 2024 houve mais de 42 casos de violação dos direitos dos idosos a nível nacional

Postado em: 29-04-2024 às 09h53
Por: João Victor Reynol de Andrade
Imagem Ilustrando a Notícia: Denúncias de crimes contra idosos crescem mais de 15% no estado 
Imagem registrada depois de uma ocorrência de agressão física em pessoas idosas em Anápolis | Foto: Divulgação

Neste meio do mês de abril, as redes sociais do País, assim como algumas mídias internacionais, viralizaram com a inusitada história do idoso Paulo Roberto Braga de 68 anos e a sua sobrinha cuidadora, Erika Souza Vieira de 42 anos no Rio de Janeiro. O vídeo que mostra Erika com o defunto de Paulo para pegar um empréstimo de R$ 17 mil era algo absurdo demais para ser verdade para alguns telespectadores. 

Por causa disso, ainda não é possível afirmar se Paulo já foi levado morto ao instituto bancário, ou se morreu no caminho e passou despercebido pela sobrinha. De acordo com apurações jornalísticas locais do estado, foram dados diferentes relatos sobre o estado de vida do idoso. Também ainda não é possível afirmar as reais intenções de Erika quanto ao ocorrido que ainda se julga como inocente por não saber que o familiar estava morto enquanto pretendia pegar o dinheiro no banco.

Independente do caso e do ocorrido, uma coisa é certa que a história do “Tio Paulo” reacendeu as chamas da luta das garantias dos direitos dos idosos por todo Brasil por ainda se tratar de um crime comum. Para se ter uma noção, de acordo com a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH) em audiência sobre a garantia dos direitos de pessoas idosas, foram registrados nos primeiros três meses de 2024 42.995 denúncias de violações de direitos por toda nação. Este número é superior ao encontrado no mesmo período de 2023 com 33.546 registros, e no de 2022 com 19.764 ocorrências. 

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Este cenário de aumento de denúncias também é espalhado a nível estadual, como apurado pelo jornal O HOJE com dados da Polícia Civil de Goiás (PC-GO) da Delegacia Especializada no Atendimento ao Idoso (Deai). De acordo com o delegado titular da Deai, Alexandre Bruno, a equipe de reportagem, nos primeiros três meses de 2024 houve um aumento de 15% de denúncias se comparado com o mesmo período de 2023, que também aumentou em 30% se comparado a 2022. 

Para o titular, grande parte do motivo do aumento destes casos em Goiás é por conta do recesso econômico da pandemia de Covid-19 em 2020 e seus efeitos financeiros nas vidas dos brasileiros. De acordo com, muitas pessoas perderam o emprego durante o lockdown e tiveram de voltar para a casa dos pais ou parentes, que hoje muitos são pessoas idosas. Este convívio mais próximo acumulado com as dificuldades financeiras pode ter estimulado um ambiente mais hostil e tóxico para certas famílias. Este convívio pode também ter estimulado casos tortura psicológica, agressão física, sexual e exploração financeira.

Mas também vê o aumento de denúncias como uma forma de que a população e a sociedade estejam mais conscientes destes crimes. Além disso, as novas tecnologias ajudam os agentes de segurança na criação de uma rede de denúncias que dá suporte nas investigações e nas autuações. “Quanto mais se divulga sobre casos como este, mais a população se interessa em querer ajudar”, diz o delegado. 

Alexandre conta que grande parte das ocorrências envolvem injúrias e agressões verbais contra familiares idosos. Como ele diz, neste primeiro trimestre de 2024 foram 30 casos em flagrantes pela Deai, deste número, 28 ocorrências eram de maus tratos, enquanto os outros dois eram de exploração financeira. 

Também, vê o aumento das atuações como parte do resultado de ações de reestruturação da delegacia a forma de lidar com denúncias e ocorrências. Há um ano, operam com uma maior agilidade no andamento dos casos como o destacamento de uma equipe de campo no momento em que uma denúncia é registrada. Também começaram a fazer o acompanhamento dos casos investigados para constatar a segurança da vítima após as autuações. 

Por causa disso, o delegado fala que é preciso manter vigilante com este grande aumento de casos de injúrias. Segundo eles, essas agressões são o começo da evolução de crimes mais sérios. “Vemos que existe uma evolução de casos mais leves para mais sérios dentro das casas. Já atendi uma ocorrência de um filho que abandonou os pais sem dar comida por uns cinco dias. Se não fosse uma denúncia anônima poderiam ter morrido”, afirma Alexandre.

Outra faceta da luta dos crimes contra as pessoas idosas são as operações da Deai, como diz Alexandre, que fala como essas ações surtiram efeito em certas configurações criminais como o desmantelamento das clínicas clandestinas de asilo e reabilitação. “Estamos com uma operação que visa um combate mais ativo dos casos, como a operação Desumanos. Já temos outra chamada Visita Inesperada em que monitoramos as clínicas de asilos de pessoas idosas sem um horário específico”.

Um grande paradigma que necessita de mudança

Apesar disso, Maria Madalena Martins atesta as dificuldades financeiras por conta da Pandemia de 2020. Mas ela, Presidente da Comissão da Pessoa Idosa de Goiás da Ordem de Advogados do Brasil, acredita que ainda persiste um elemento cultural por trás das violações em entrevista para o jornal O HOJE. De acordo com ela, é necessário uma reestruturação cultural quanto a percepção do idoso como membro da sociedade. 

Segundo ela, esses elementos culturais começam na juventude e persistem até o crescimento. Para isso, fala da necessidade de políticas públicas como na educação para a desconstrução e desmistificação da pessoa idosa. “Quando somos jovens a gente é ensinado coisas que formam a nossa percepção do mundo. Por exemplo, é ensinado que as bruxas são sempre velhas, que o ‘homem do saco’ é um velho, que o idoso cheira mal. Essas coisas ficam alojadas nas mentes das crianças e dos jovens”, diz Maria.

Além disso, comenta que o Governo de Goiás precisa de força para assegurar as leis previstas no Estatuto da Pessoa Idosa, que data de 1º de outubro de 2003. Este compêndio prevê leis que garantem o envelhecimento saudável como direito do estado. De acordo com dados de denúncias enviadas ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, as principais violações de direito são: 17% dos idosos são abandonados, 14% são descuidados da saúde, 12% são vítimas de abuso financeiro. 

“O direito do envelhecimento precisa ser mais efetivo e a responsabilidade é de todo mundo para denunciar os crimes contra a pessoa idosa. A OAB dispõe de uma rede de proteção, temos também a Defensoria Pública, e o Ministério Público de Goiás que pode dar suporte às vítimas”, diz a presidente da comissão.

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