Em meio a PL do aborto, ambulatório do Hemu atendeu um terço das vítimas de violência sexual

Em 2024, o Hemu atendeu 1324 pessoas no Ambulatório de Apoio às Vítimas de Violência Sexual

Postado em: 18-06-2024 às 04h00
Por: João Victor Reynol de Andrade
Imagem Ilustrando a Notícia: Em meio a PL do aborto, ambulatório do Hemu atendeu um terço das vítimas de violência sexual
Hospital Estadual da Mulher é referência em saúde e apoio médico do aborto legal | Foto: Divulgação/IGH

Na semana seguinte à votação do caráter de urgência do Projeto de Lei N°1094/24 no plenário da Câmara dos Deputados, grande parte da população se manifestou contra a liminar que equiparia o aborto após a 22º semana a um homicidio. O projeto, que é contra a Constituição Federal de 1988, foi amplamente criticada por populares e recebeu o nome de “PL do Aborto” e de “PL do Estuprador”. Segundo os ativistas, o projeto também seria uma regressão social uma vez que os agressores de estupro são passíveis de 8 a 15 anos de prisão. Porém a mulher que fez o aborto após 22 semanas pode pegar reclusão de 10 a 20 anos. 

De acordo com a enquete virtual do site oficial da Câmara dos Deputados Federais, mais de 1 milhão de pessoas votaram no PL com cerca de 88% contra a medida. Além disso, este terceiro fim de semana de junho de 2024 foi marcado por extensas manifestações em pelo menos oito grandes cidades brasileiras. Em São Paulo, por exemplo, cerca de 60 grupos da sociedade civil organizaram um protesto na Avenida Paulista neste último sábado (15). Enquanto isso, em Goiânia, cerca de 1000 pessoas se concentraram na Praça Universitária no mesmo dia para protestar contra a ação.

Tal medida poderia colocar em risco milhares de mulheres que são vítimas de violência sexual e que podem necessitar do recurso. Como exemplo, o Hospital Estadual da Mulher Dr. Jurandir do Nascimento (Hemu) é a única instituição de saúde pública que faz a operação em Goiás. Sobre isso, o Ambulatório de Apoio às Vítimas de Violência Sexual do Hemu é a área responsável pelo suporte, orientação e acompanhamento de pessoas que foram vitimas desta violência ou que necessitam o aborto dentro da Lei. 

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De acordo com a coordenadora da área, Thais Sales, ao jornal O HOJE, o ambulatório é responsável por atender toda a comunidade de todos os sexos e gêneros com idade mínima de 14 anos. Além de casos em que houveram a violência em si, também atendem pessoas gestantes que por algum motivo não podem dar o encaminhamento da gravidez como em casos de risco à pessoa gestora, má formação fetal ou anencefalia. 

De acordo com ela, entre os meses de janeiro a maio de 2024 houve 1.324 atendimentos totais pelas equipes multiprofissionais compostas por médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais. Deste número, 23 pessoas foram submetidas aos procedimentos de Interrupção Legal da Gravidez (ILG). Este número nos primeiros cinco meses de 2024 já representa quase a metade dos atendimentos do ano inteiro de 2023, com 3.857 casos no ambulatório. Contudo, diz como o aborto legal é apenas uma das opções orientadas pela equipe. “Grande parte dos nossos serviços às vítimas de violência são as medidas contraceptivas nas primeiras 72 horas da concepção”, relata.

Ainda segundo ela, grande parte destas pessoas que são atendidas são oriundas das cidades na Região Metropolitana de Goiânia, mas que pelo motivo do Hemu ser um hospital de referência da saúde da mulher recebe pessoas de todo o Estado e de outras localidades. Além disso, comenta que também recebem indivíduos menores de idade que foram vítimas de violência sexual. Nestes casos ela comenta que a instituição segue o Estatuto da Criança e do Adolecente do governo federal para proteger os direitos dos jovens.

Sobre isso, diz que os jovens devem estar acompanhados de um responsável legal para que sejam orientados sobre o ocorrido, incluindo atendimento integrado com a família. Entretanto, ela conta que a unidade possui uma linha direta com o Conselho Tutelar para que possam dar assistência social e jurídica ao jovem em casos onde não haja um responsável legal ou que isso não seja possível. “Infelizmente grande parte dos casos de violência sexual que envolvem crianças são cometidos por pessoas próximas ou dentro do circulo familiar”, explica.

Além da ILG e das medidas contraceptivas, é dada a opção da entrega da criança para a adoção. Sobre isso, Thais fala como todo o procedimento é acompanhado até a entrega para garantir que a criança seja encaminhada para as casas de adoção com segurança e saúde.  

Garantindo o direito da Lei

Apesar do aborto por si ser um crime e que não é previsto pela constiução, o artigo 128 do Código Penal estipula as três ocasiões em que o precedimento pode ser feito legalmente, por isso o nome “aborto legal”, são eles: gravidez resultante de estupro, risco à vida da mulher e feto anencefálico. Devido a isso, é necessário medidas para garantir a prática dentro da lei. 

De acordo com o advogado do direito médico Henrique Rodrigues, ao jornal O HOJE, mulheres e homens-trans que querem fazer a operação e foram vítima de estupro devem se encaminhar a uma delegacia para fazer o boletim de ocorrência da violência sexual. Com isso em mãos a mulher pode ir em uma instituição de saúde apropriada e fazer a operação sem ser necessário a abertura do processo. 

Vale lembrar que o ambulatório do Hemu também pode atender pacientes de forma espontânea sem a necessidade do boletim de ocorrências. Na instituição ela será submetida aos exames clínicos, imagem e de profilaxia para doenças sexualmente transmissíveis para assim ser feito o acompanhamento do caso. Caso o paciente queria ser submetido ao ambulatório pode pedir isso no pronto socorro do hospital que funciona sete dias da semana e por 24 horas por dia. Sendo feito os exames o paciente será encaminhado para o ambulatório de apoio que funciona de segunda a sexta das 07 às 13 horas. Também é possível entrar em contato direto com a área pelo número 3956-2954.

Para as mulheres que moram no interior ou que não têm acesso a uma clínica que faça o procedimento, Henrique fala que elas podem acionar a Secretaria Municipal da cidade para um pedido de transferência a uma unidade de saúde capaz de fazer o procedimento. Além disso, pode solicitar que esse direito seja estendido para uma clínica particular e custeado pelo Sistema Único de Saúde caso não haja uma unidade pública disponível.

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