Moradores contemplados por programa social habitacional sofre com estrutura precária

Um dos principais desafios de quem tem uma casa pelo Programa Minha Casa Minha Vida é a distância das casas em relação à região central da cidade.

Postado em: 28-01-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Um dos principais desafios de quem tem uma casa pelo Programa Minha Casa Minha Vida é a distância das casas em relação à região central da cidade.

Thiago Costa 

Uma década após o lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida, problemas sociais ainda afetam diretamente a vida dos contemplados. Um dos principais desafios de quem tem uma casa pelo Programa é a distância das casas em relação à região central da cidade. Isso faz com que esse grupo social mais pobre não consiga ter acesso aos direitos básicos para a vida em sociedade, como saúde, educação e transporte. 

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Dilmineide Souza morava em uma casa próxima à Avenida Anhanguera, mas que ficava em uma área de situação de risco, o que a fez ter que abandonar o lar. Segundo a dona de casa, por precisar sair do local, que era de fácil acesso, porém com riscos à vida da família, ela e os membros da casa ganharam do governo o imóvel no Residencial Buena Vista ll, que fica a 19 quilômetros da região central. 

Como explica a dona de casa, tudo para ela ficou mais longe desde que foi para onde hoje é a sua residência. Dilmineide conta que sua casa é distante de toda infraestrutura de uma cidade, mas o que mais a atrapalha é a falta de mercados e colégios na região. 

A dona de casa conta que seu filho estuda no Setor Campinas e precisa recorrer ao transporte público para chegar na unidade de ensino. Segundo ela, a média para se locomover para a região central, partindo de casa, é de aproximadamente duas horas e meia. A dona de casa afirma que se precisa ir ao banco, por exemplo, tem que sair de casa pela manhã e só consegue voltar para o lar no final do dia. 

“A gente se sente abandonada pelo Governo. Já que ele desapropriou a gente de lá, deveriam, pelo menos disponibilizar ônibus que passasse por aqui de trinta e trinta minutos, porque o ônibus que passa aqui perto de casa, passa em vários outros setores também. Quando entro no transporte público, fico em pé, porque ele já está cheio”, reclama a moradora. 

Catiene Santos é outro exemplo que a falta de infraestrutura pode atrapalhar diretamente a vida de pessoas que foram realocadas em regiões que carecem da atenção do poder público. A dona de casa tem um filho que conseguiu uma vaga na escola do bairro, mas sofre porque o transporte de vans para os alunos que moram mais longe não atende seu filho. Catiente explica que entrou em contato com a prefeitura, mas que, por a distância não ser considerada grande, é a mãe que tem que levar seu filho todos os dias de bicicleta para a unidade escolar. 

De acordo com Catiene, quem escolhe o local para a construção das casas que serão doadas para a população faz isso com o intuito de dificultar a vida desse grupo de moradores. Ela explica que quando sua família chegou ao bairro, não havia nada, só as casas. “Não tinha sequer transporte. Tinha apenas um mercado, mas que fica muito longe e é de difícil acesso. Antigamente, tínhamos que ir para a BR para pegar o ônibus para o Guapó. Depois que os governantes foram mandar ônibus para a gente, mas que, por não ter asfalto, o ônibus atolava em época de chuva”, conta. 

Muito longe

O sociólogo Robson Nunes não concorda com as famílias serem realocadas em localidades longes das regiões centrais do município. Segundo ele, essa atitude de afastar famílias de regiões de fácil acesso e colocá-las em um espaço sem infraestrutura é uma forma de marginalizar o grupo social, que, por não desfrutar de grandes salários, não se enquadra nos perfis de classe média e classe média alta. 

“Eu não concordo com esse afastamento do centro urbano. Não concordo, mas é um caso delicado. No meio desse processo, alguém poderia levantar a questão que no ambiente mais próximo do centro urbano, onde as pessoas poderiam ter acesso a vários recursos oferecidos pela prefeitura e pelo Estado, não há espaço físico suficiente para desenvolver esse programa de moradias para pessoas”, comenta o sociólogo. 

Segundo Robson, é complicado não ter espaço suficiente para a expansão desses bairros, mas existe a possibilidade de a população com menor poder aquisitivo ser afastada de regiões mais próximas da cidade de propósito. Ele explica que a região central da Capital é uma localidade cara e esses lugares afastados são mais em conta. O sociólogo garante que, quando se afasta alguém da cidade, afasta-se também essas pessoas dos direitos de aspectos sociais, econômicos, políticos e educação, já que existe a distância ao acesso a esses direitos que o ser humano tem para ter infraestrutura que o garanta uma qualidade de vida digna. 

O sociólogo diz que a literatura é clara quando determina alguns fatores como primordiais para que a população mais pobre vá para ás margens da sociedade. Ele acredita que situações de afastamento podem reforçar preconceitos e negação por parte dos que estão nas regiões centrais. 

“Imagine um trabalhador que precisa sair de casa às 5h para chegar às 8h no seu serviço, porque no ponto de vista espacial ele está afastado do centro urbano, está afastado do ambiente do trabalho. Esse trabalhador, além dele ter o desgaste de várias horas de ida e vinda desse ambiente de trabalho, ele é um trabalhador que corre o risco de assaltos pela madrugada, em ponto de ônibus e isso causa um desgaste na vida do trabalhador” pondera Robson. 

De acordo com o sociólogo, nem sempre há boas unidades de ensino para receber essa população que mora afastada do centro. Como ele explica, o aluno que quer uma melhor educação precisa se deslocar por longas distâncias para ter acesso o direito da educação, mas que a política de marginalização dessas comunidades pobres afetam a garantia desses direitos.  

Moradores de regiões afastadas têm menos oportunidades 

Vários fatores influenciam na qualidade de vida do ser humano. Moradia é um dos requisitos básicos que determinará como poderá ser as possibilidades de cada indivíduo. Em Goiânia, o Programa Minha Casa Minha vida afastou um grupo de pessoas da região Central da Capital. Na região, pessoas precisam aguardar horas para conseguir entrar no ônibus e percorrem trajetos por mais de duas horas para fazer tarefas simples, como ir a alguma agência bancária, por exemplo.

A dona de casa Dilmineide Souza gasta em média duas horas e meia para ir ao Centro de Goiânia. Dilmineide afirma que se ela precisa ir ao banco, por exemplo, tem que sair de casa pela manhã e só consegue voltar para o lar no final do dia, o que a atrapalha muito. Ela acredita que se houvesse mais linhas de ônibus na região, sua vida seria bem mais fácil. Ela reclama que o ônibus que passa próximo à sua residência só passa de uma em uma hora, o que a atrapalha diretamente as tarefas da moradora do Residencial Buena Vista ll. 

De acordo com a economista, doutora em geografia e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Débora Ferreira da Cunha, a realidade de quem mora em uma região centralizada aos que não moram são distintas. Ela explica que uma pessoa que mora no Centro tem maior acesso às oportunidades que a cidade proporciona, local que estão concentradas maiores números de oferta de emprego e infraestrutura urbana. Ela ainda compara que viver em uma cidade não significa que a pessoa está vivendo a cidade.

Débora Ferreira afirma que uma pessoa que mora distante ao acesso à região central tem oportunidades inferiores, e essas oportunidades dependem do lugar que essa pessoa reside, implicando em maior gasto de tempo, maiores custos de locomoção e maiores dificuldades, em especial para os que usam do transporte coletivo. “A expansão urbana resulta em aumento do tempo e dos custos de deslocamento da população ate o trabalho, escola, outras atividades, com implicações na qualidade de vida e restrições/dificuldades de acesso à cidade”, explicou. 

De acordo com o sociólogo Robson Nunes, o afastamento de certas comunidades dos centros urbanos do município dificulta que políticas públicas cheguem a esse grupo. Robson explica que o impacto para essas pessoas é grande, socioeconomicamente dizendo, principalmente sobre aqueles que mais necessitam da atenção social. 

“O grupo que é afastado tem dificuldades ao acesso à cultura, ao esporte, saúde, educação e segurança”, explica Robson. Ainda de acordo com o sociólogo, ao observar um parque de Goiânia, observa-se que nesses ambientes que as pessoas costumam fazer caminhada ou levar seus animais para passear há policiamento e estruturas básicas para os usuários, o que não acontece nessas regiões mais afastadas da região central da Capital, onde não há políticas públicas que geram qualidade de vida, ou até mesmo até o básico para a vida em sociedade de um grupo em específico.  

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