Segunda-feira, 22 de julho de 2024

Mercado editorial brasileiro vive crises, aponta CBL

Recessão, má gestão e comércio eletrônico afetam a venda de livros

Postado em: 16-04-2019 às 10h20
Por: Suzana Ferreira Meira
Imagem Ilustrando a Notícia: Mercado editorial brasileiro vive crises, aponta CBL
Recessão, má gestão e comércio eletrônico afetam a venda de livros

As vendas de livros no Brasil caíram 18% em volume e 19%
(valor) na comparação entre o primeiro bimestre de 2018 e de 2019. No período,
a queda de venda dos livros escolares foi pior: diminuição de 43% em volume e
38% em valor. Os dados são do 1º Painel das Vendas de Livros no Brasil deste
ano, feito pela consultora Nielsen Bookscan e pelo Sindicato Nacional dos
Editores de Livros (SNEL).

Conforme
o painel, em 2018, o crescimento do volume de vendas foi de 1,32% (44,3 milhões
de exemplares) e no valor 4,59% (faturamento total de R$ 1,86 bilhão). O ano
passado foi marcado pelo pedido de recuperação judicial de duas grandes redes
varejistas, além do encerramento de atividades no Brasil de uma cadeia de
megastore francesa para venda de livros, CDs, jogos eletrônicos e aparelhos
eletrônicos.

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O presidente da Câmara Brasileira de Livros
(CBL), Vitor Tavares, disse à
 Agência Brasil que o
setor livreiro “vive crises”, no plural. Segundo ele, a recessão e o baixo
crescimento econômico visto em 2017 e 2018 afetaram o comportamento dos
consumidores. “Os orçamentos pessoal e familiar diminuíram. As pessoas vão
cortando consumo. O livro passa a ser considerado algo que pode esperar”.

Além da economia, Tavares assinala as mudanças
no negócio, impactado com a venda na internet e pelos custos de manutenção de
grandes lojas em shoppings. Ele
também considera que a venda de livros no Brasil é limitada pela falta do
hábito de leitura. “Somos um país de não-leitores”, lamenta.

Hábito de leitura

A visão do presidente da CBL é compartilhada
por especialistas e já foi verificada em mais de uma edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. De acordo
com Zoara Falia, coordenadora do levantamento, 70% dos brasileiros admitiram
não ter lido um livro
inteiro por vontade própria nos três meses antes da pesquisa (edição de 2016).
Trinta por cento dos entrevistados declararam nunca ter comprado
um livro em qualquer momento da vida.

Conforme
Vitor Tavares, o impedimento da compra de livros não está no preço dos títulos.
“A desculpa do preço é inerente à falta de hábito de leitura”. Em meados
de 2018, a Nielsen Bookscan calculava que o preço médio do livro era de R$ 34.

De acordo com última edição da Pesquisa
de Orçamento Familiar (POF) do IBGE (2008), o gasto com livros é baixo em
todas as faixas de renda familiar. Entre aqueles com rendimento de até dois
salários mínimos, a despesa com “livros didáticos e revistas técnicas” foi de
0,1%, o mesmo percentual de gastos com “periódicos, livros e revistas não
didáticas”.

No
outro extremo, quem recebia mais de 25 salários mínimos, o dispêndio com livros
didáticos e revistas técnicas também era de 0,1%. Enquanto que o gasto com
periódicos, livros e revistas não didáticas chegou a 0,4%. “O preço é empecilho
se tem valor absurdo. E se não tem dinheiro, a pessoa pode pegar o livro na
biblioteca”, argumenta Vitor Tavares.

Conforme o site do
Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, há 6.057 bibliotecas em todo o país,
faltando ainda instalar em 112 cidades (dado de 2016). Apesar da quase universalização
nos municípios, as bibliotecas não são utilizadas por grande parte da
população, aponta Zoara Falia.

“As pessoas percebem a biblioteca para
estudantes e para pesquisa, não um espaço cultural aberto à toda a população.
Não percebem que ali encontram literatura que possa interessar”, analisa a
especialista. Ela lamenta: “Às vezes, é único equipamento cultural que o
município tem e deveria ser explorado, não só para acesso aos livros mas para
eventos culturais”. Dado da pesquisa Retratos
da Leitura no Brasil
 indicam que menos de um terço
da população (com mais de cinco anos de idade) vai às bibliotecas.

Obrigação de ler

A
coordenadora da pesquisa ainda avalia que há razões dentro de casa e em sala de
aula para o livro ser pouco consumido.
“A escola não desperta o gosto pela leitura. A leitura acontece por forma
obrigatória, isso não consegue atrair”, ressalta ao também descrever que nas
famílias também “está faltando mediação, alguém que faça o contato do livro com
as crianças e os jovens”.

“O hábito
de leitura vem de casa ou vem da escola”, concorda Mansur Bassit, ex-secretário
de Economia da Cultura, atualmente no Projeto Livro Conectado. Ele lembra que,
em tempos de smartphone e internet, a atenção das pessoas está
sempre em disputa. No caso dos estudantes, é preciso reforçar a preparação de
docentes para essa realidade.

“É falha a formação dos nossos professores e isso reflete
no mercado que não cresce. Capacitação dos professores é um dos grandes
segredos para a gente melhorar a leitura, mas isso leva décadas”, pondera. Em
geral, os docentes do ensino fundamental pertencem às redes municipais e os
professores do ensino médio são de escolas estaduais.

A secretária executiva do Plano Nacional do Livro e
Leitura (PNLL), Renata Costa, assinala que “o mercado editorial está mais
aberto e voltado para as políticas públicas”. Segundo ela, os programas de
aquisição de livros didáticos e paradidáticos do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE) “democratizam o acesso livro” e “aquecem o
mercado”.

Este ano, o FNDE deve gastar mais de R$ 1,1 bilhão com a
aquisição de 126 mil livros para atendimento aos professores da educação
infantil e a todos os estudantes e professores dos anos iniciais do ensino
fundamental, e para a reposição dos livros consumíveis para os estudantes e
professores dos anos finais do ensino fundamental e ensino médio.

Outro programa governamental que viabiliza o aumento do
consumo de livros é o programa Vale-Cultura, que entre 2013 e 2018, resultou no
gasto de meio bilhão de reais em cultura entre trabalhadores empregados com
carteira assinada. De acordo com base de dados do Ministério da Cidadania, 65%
do valor (R$ 336 mil) foram gastos com aquisição de livros, jornais e revistas.

Conforme Lei
nº 13.696/2018, o Ministério da Cidadania e o Ministério da Educação deverão
implantar até final deste semestre a Política Nacional de Leitura e Escrita
(PNLE), baseada em diretrizes do Plano Nacional de Cultura (2010-2020); no
Plano Nacional de Educação (2014-2024) e no Plano Plurianual (2020-2024). (Agência Brasil)

 

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