Jovens estão desinteressados em dirigir, aponta dados

Símbolo de maturidade, status e autonomia, o automóvel vem perdendo espaço entre os mais jovens

Postado em: 04-05-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Símbolo de maturidade, status e autonomia, o automóvel vem perdendo espaço entre os mais jovens

Higor Santana*

De acordo com dados do Governo Federal, do setor automotivo e da Federação Nacional das Autoescolas e Centro de Formação de Condutores (Feneauto), o automóvel vem perdendo espaço entre os mais jovens. De acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), de 2014 a 2018, a emissão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), para jovens de 18 a 21 anos, caiu 20,61%. Foram 939 mil documentos em 2018, sendo 1,2 milhão em 2014.

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Para a Feneauto, entre os principais motivos estão a crise econômica, os inconvenientes do trânsito, os custos para manter um veículo próprio e a popularização de aplicativos móveis. O publicitário Marcus Orrico é um exemplo desse novo perfil de usuário. O rapaz de 26 anos afirma que, por ser mais vantajoso, prefere utilizar um aplicativo de mobilidade. “Não vejo necessidade de ter um carro próprio. Eu acho que a gente consegue se virar bem sem um. Ainda mais para pessoas  solteiras assim como eu, que não tem família, que não tem a obrigação de utilizar o carro para resolver as coisas. Eu acho que os aplicativos ajudam muito”, considera.

De acordo com o presidente da Feneauto, Wagner Prado, muitos jovens não consideram mais a CNH uma prioridade. Prado explica que esse fenômeno se intensificou a partir de 2015, com o agravamento da crise econômica e o acesso aos serviços de aplicativos de transporte pago ou compartilhado. “Muitos jovens estão adiando o momento de tirar a habilitação. As famílias têm optado por investir em outras coisas, como em cursos universitários para estes jovens. Com isso, muitos acabam desistindo de tirar suas carteiras”, explica. 

Uma pesquisa realizada pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), mostrou que até o início de 2019 penas 39% dos jovens de 26 a 35 anos possuíam carro. O percentual entre os jovens de até 25 anos era ainda menor, 23%. Entre os do primeiro grupo, 31% responderam não desejar comprar um carro nos próximos cinco anos. Percentual idêntico ao dos entrevistados com 36 a 55 anos de idade. Já entre os mais jovens (até 25 anos), 30% não tinham interesse em adquirir um veículo automotivo.

Ainda segundo a Anfavea, somente 35% da geração mais nova têm habilitação para dirigir, e 8% dos que não têm CNH disseram que não pretendiam tirar o documento. O que pode ser explicado pelo fato de que saber dirigir sempre foi visto como uma habilidade capaz de ampliar as chances de conseguir um emprego.

Tradição invertida

De acordo com o presidente da Feneauto, os custos de manter um carro estão causando um certo desânimo na hora de comprar um veículo. “Antes, tudo que um garoto queria era completar 18 anos para poder dirigir o próprio carro. Hoje, eles veem os custos com IPVA, manutenção, seguro, o trânsito nas cidades e acabam tendo mais consciência sobre os riscos de acidentes. Somando a isso, aspectos como a Lei Seca, muitos acabam optando por outras formas de se deslocar, como os aplicativos de compartilhamento de transporte”, explica.

O publicitário Marcus ainda acrescenta que o preço do carro e do combustível, também contribuem com a não preferência de ter um veículo. “Acho que além das peças, o combustível está muito caro. O próprio carro está muito caro. Se você não tiver um bom carro, gasta mais ainda com manutenção. E a manutenção é outra coisa que também não é nada barata. Ainda tem a questão do seguro, que se tornou algo muito importante, em meio a quantidade de roubos que acontecem”, explica o rapaz.

Consequências

Exemplos como o de Marcus são cada vez mais comuns. “Isso ajuda a diminuir ainda mais a procura por aulas, derrubando a margem de faturamento e forçando muitas autoescolas a reduzirem o número de funcionários e a frota de veículos. Por esse e outros motivos, as autoescolas vivem um momento de incertezas”, afirma Wagner Prado.

A Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Economia, do Ministério da Economia, informa que vê como uma tendência para os próximos cinco anos a diminuição do interesse pela propriedade de automóveis e o aumento da procura pelo compartilhamento de veículos, além do aparecimento e uso de soluções alternativas como bicicletas, patinetes e motoristas de aplicativos. A Secretaria acredita ainda que, ao fim deste prazo, o assunto pode ser tema da primeira revisão de um programa de mobilidade e logística criado pela pasta.

Ainda de acordo com o órgão, pelos próximos cinco anos os consumidores mais jovens ainda deverão ter participação significativa no mercado dos veículos tradicionais. A pasta explica que alguns programas do governo, contemplam incentivos a novas tecnologias para a mobilidade e logística, em consonância com os novos modelos de negócios.

Ter ou não ter

Marcus explica as vantagens e a preferência de não ter um veículo. “As vantagens é que eu não tenho uma preocupação. Até por que se você tem um carro, tem que se preocupar com a gasolina, com documentos, com o seguro e se ainda estiver pagando, tem que se preocupar com isso. E a vantagem do aplicativo é que você sempre vai estar com um carro diferente e com isso, conhecer pessoas novas, até por conversar com o próprio motorista. Você não fica na mesma rotina. Eu mesmo acho inovador”, conclui.

 Falta de interesse de jovens por CNH não afeta venda de veículos 

Segundo dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), a venda de veículos automotores registrou alta de 12,2% nos primeiros quatro meses do ano, em comparação ao mesmo período do ano anterior. De acordo com a entidade, foram 1.244.151 unidades licenciadas em 2019, e 1.108.897 unidades no mesmo período do ano passado.

Só em abril, o mercado de veículos novos cresceu 6,7% em comparação ao mesmo mês do ano passado. Foram 231,9 mil unidades vendidas no quarto mês do ano, em soma que considera os segmentos de automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus. O volume, se comparado a março, representa crescimento de 10,9%.

Segundo dados do Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos de Goiás (Sincodive), até o início de 2019 foram vendidos e emplacados 121.548 veículos no Estado. 16.798 automóveis a mais que no início de 2018, quando foram comercializados 104.750 unidades. Com isso, a frota de veículos em território goiano aumentou quase 17%. 

O levantamento compreende as vendas das categorias auto (carros de passeio), comercial leve (pick-up e caminhonete), caminhão, ônibus, motos, implemento rodoviário (carreta, basculante, canavieiro, etc) e outros (carretinhas), realizadas em território goiano de janeiro a dezembro do último ano. A quantidade de vendas constatada é a maior no período de três anos. Em quase todas as categorias houve acréscimo, com exceção da categoria que compreende as vendas de carretinhas, que registrou um decréscimo de -5,11%.

Ainda de acordo com Fenabrave, só no município de Goiânia foram comercializados 44.874 veículos, resultando em um aumento de 18,01% na frota automóvel da Capital. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de Goiânia no ano de 2018 foi de 1.495.705 habitantes, o que significa que existe quase um veículo por habitante. Enquanto a média nacional é de um carro para 3,89 habitantes. No Estado, a relação é um pouco menor e atinge 0,56 veículo por habitante. Goiás tem aproximadamente 6,92 milhões de pessoas.

No acumulado do ano, o mercado registra 839,5 mil veículos emplacados, expansão de 10% em relação a igual período do ano passado. É o maior volume para o primeiro quadrimestre desde 2015, quando as vendas alcançaram 893,7 mil unidades.

No mercado de veículos leves, que soma os segmentos de automóveis e comerciais leves, foram licenciados 221,3 mil unidades em abril, alta de 5,4% sobre igual mês do ano passado e de 10,9% na comparação com março. De janeiro a abril, os dois segmentos totalizam 801,3 mil emplacamentos, avanço de 8,7% em relação a igual intervalo de 2018.

6ª maior frota 

Segundo a Confederação Nacional de Municípios (CNM), Goiânia, apesar de ter a 11ª maior população do país, já é a cidade com a 6ª maior frota de carros do Brasil, com mais de 605,3 mil veículos circulando. Já em relação às motos são 291,6 mil, ocupando o 4ª lugar no ranking. 

Segundo o especialista em trânsito, Marcos Rotten, o aumento de veículos ocasiona a queda no índice de qualidade de vida e pode gerar vários problemas urbanos. “Isso vai trazendo uma superlotação da cidade, das ruas. Quando você vai morar em um lugar, você tem que pensar na sua mobilidade. Como é que eu vou me locomover? E a cidades têm que se planejar também. Ou seja, uma política urbana para incentivar o adensamento, para as pessoas morarem mais próximas para evitar o grande deslocamento”, explica.

Com relação ao número de carros, Goiânia fica atrás das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília e Curitiba. Já em relação às motos, a capital goiana só perde para a capital paulista, Rio de Janeiro e Fortaleza. A pesquisa da CNM também revelou que em 48 dos 246 municípios goianos há mais motos do que carros. (Higor Santana é estagiário do Jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian)

  

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