Descarte de terra ameaça córrego

O crime já havia sido denunciado no inicio de 2018, mas as denúncias não surtiram resultado

Postado em: 18-07-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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O crime já havia sido denunciado no inicio de 2018, mas as denúncias não surtiram resultado

Igor Caldas

Moradores do bairro Jardim América denunciam depósito de terra em área de preservação ambiental às margens do Córrego Cascavel. Apenas um muro baixo de cerca viva, na rua C-107, separa o passeio público de um amplo pátio com verdadeiras dunas de terra vermelha. Ao fundo do cenário, moradores dos apartamentos mais altos dos condomínios verticais que foram erguidos no local conseguem observar o avanço catastrófico do crime ambiental. Há anos a terra que escorre da propriedade causa erosões no leito do Córrego Cascavel.

De acordo com José Arsênio, morador de um desses condomínios, o início da erosão aconteceu no final de 2017 quando começou o descarte de terra. José também afirma que neste período, caminhões com entulho também eram descarregados no local. De acordo com ele, o crime foi denunciado no inicio de 2018, mas as denúncias não surtiram resultado. José afirma, inclusive, que duas fiscais da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) foram até a propriedade, mas não entraram na chácara.

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“O pessoal da Agência Municipal do Meio Ambiente veio, mas não entrou no lugar onde a terra é descartada. As duas funcionárias da Amma que foram fazer a averiguação, ficaram no passeio público, um cara de dentro da chácara mostrou um papel a elas que foram embora logo em seguida, sem entrar dentro da propriedade”, afirma José. Ele ainda diz que o problema pode parecer grande, com a quantidade de terra que dá para ser vista, mas já foi pior durante o período chuvoso.

“Em todo tempo que se passou desde a primeira denúncia, com essa terra toda que a gente vê aí, o problema não está tão grave como antes. Comparado com o que nós já vimos, isso não é nada. Imagina na época de chuva, quando eles ainda estavam descartando entulho junto. Tudo descia para a água do córrego. Dava para acompanhar a evolução das erosões daqui de cima”, lembra o morador do Jardim América.

José ainda afirma que a falta de vegetação nas margens do córrego faz com que a água se infiltre no solo e cause mais erosões. De acordo com ele, há o risco de que ela alcance a rede de alta tensão se não for contida rapidamente. “Perto de onde eles estão depositando a terra, tem um poste de rede de alta tensão. A água vai infiltrando na parte de baixo da chácara e há risco de a erosão ir para cima da rede se o problema não for resolvido”.

A esposa de José, Marta afirma que viu o cenário mostrado pela sua janela ser mudado aos poucos. “Há dois anos dava para ver muito mais verde aqui de cima. Os meninos até desciam para tomar banho no córrego e pescar. Hoje, a erosão está comendo tudo aos poucos”. Diante de sua janela, Marta aponta para um barranco e diz: “ali tinha um monte de árvore e agora só tem um buraco”.

José Arsênio acha mais do que um absurdo que mesmo depois de tanto tempo desde a primeira denúncia não houve respeito à regra do uso do solo às margem de córregos, instituído pela legislação em Áreas de Preservação Permanente. Ele ainda afirma que o descarte de terra é quase diário. Quase todo dia eu vejo caminhão entrando aí. De vez em quando, eles dão uma cessada, mas tem dias que são pelo menos três caminhões trazendo rejeitos”, lamenta.

Punição

Segundo a Agência Municipal do Meio Ambiente, os fiscais foram até o local na tarde de ontem (17) para averiguar as consequencias resultantes da ação e tomar as medidas punitivas cabíveis. Eles irão até o local hoje novamente para avaliar os danos mais detalhadamente e autuar o proprietário da área.

Ainda de acordo com o órgão, o Córrego Cascavel tem sido monitorado constantemente pela Amma. Por lá, já ocorreram muitos flagrantes de descarte de entulho e lixo doméstico, que resultaram em multas e apreensão de veículos utilizados para o descarte. A Amma ainda afirma que no caso da área em questão, havia uma cerca florida na frente da área, construída justamente para encobrir a ação de aterramento.  Fato que impedia que a equipe de monitoramento da Agência tomasse conhecimento.

Em relação a outras ações de fiscalização da Amma no local, no período em que houve a primeira denúncia do descarte, a Agência respondeu que “na época em que os fiscais foram ao local, o volume de terra que encontraram era muito pouco e não estava depositado na área de Área de Preservação Permanente, mas em uma área particular. De lá pra cá, é que esta ação de aterro atingiu a APP”. 

Descarte ilegal é feito principalmente em APPs 

Áreas de Preservação Permanente (APPs) são locais definidos pelo Código Florestal ou por regulamentos específicos onde a rigor não são permitidas as alterações ou interferências do homem sobre o meio ambiente, a exemplo de um desmatamento, de uma construção, aterramento ou descarte de resíduos.

Na criação do conceito de área de preservação permanente, o legislador quis resguardar diretamente a flora, a fauna, os recursos hídricos e os valores estéticos naturais, para manter e garantir o equilíbrio do meio ambiente. Em abril deste ano, a equipe do jornal O Hoje denunciou por meio de reportagem o descarte ilegal de resíduos em Áreas de Preservação Permanente.

De acordo com o inciso II do artigo 3º da Lei 12.651/12, APP é uma “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”.

Na época, o fiscal ambiental da Agência Municipal do Meio Ambiente (AMMA), Diego Moura, afirmou que o descarte ilegal de resíduos acontece principalmente em áreas de proteção ambiental porque normalmente são locais mais afastados dos centros e com vegetação que podem encobrir a ação dos criminosos.

A proximidade destas áreas com cursos d’água faz com que esse material acabe parando nos rios, causando a poluição e assoreamento que podem comprometer de forma irreversível o abastecimento hídrico da Capital.

O descarte ilegal de lixo consiste em crime ambiental previsto por lei e gera um auto de infração pesado, além da apreensão do veículo que for flagrado descarregando lixo. Segundo o fiscal ambiental, o crime cometido pelas empresas definitivamente não compensa. A multa pela infração varia de R$5 mil a R$50 milhões.

 

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