Ipês colorem Goiânia

As árvores, que florescem no período de estiagem, perdem suas folhas e se tornam buquês de flores que enfeitam as ruas

Postado em: 23-07-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Ipês colorem Goiânia
As árvores, que florescem no período de estiagem, perdem suas folhas e se tornam buquês de flores que enfeitam as ruas

Igor Caldas

Especial para O Hoje

A estiagem também tem seu lado belo e começa a aparecer na Capital a floração dos Ipês coloridos que se misturam aos elementos urbanos.  Nessa época, as praças, ruas e avenidas de Goiânia ficam repletas de pétalas coloridas que se desprendem dos galhos retorcidos de diferentes espécies dos Ipês. Apesar de muitos pensarem que é uma árvore exclusiva do Cerrado, o Ipê é muito comum em todo o país, como explica o biólogo Gláucio Freitas.

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“Os Ipês são plantas da família Bignoniaceae, comuns em todo o Brasil, especialmente em florestas”. O biólogo ainda explica que essas árvores portadoras de flores com cores distintas não compõem apenas uma espécie. Cada cor de flor corresponde a uma espécie diferente do Ipê. A família da qual a planta faz parte possui aproximadamente 110 gêneros e 800 espécies e inclui também arbustos e ilenas.

Gláucio afirma que as árvores são mais vistas nas cidades de Goiânia e Brasília, mas não são exclusividade dos biomas que fazem parte dessas regiões. “São especialmente comuns nestas duas cidades, pois foram plantadas com propósito paisagístico. Uma das características mais importantes destas plantas é que elas costumam florir justamente na estação das secas, onde perdem as folhas e ficam por uns dias como verdadeiros buquês vivos, todo florido”.

Maurílio Vieira reconhece a beleza das flores dos Ipês na cidade enquanto caminha pelas ruas de Goiânia no período de estiagem.  “É muito bonito. A gente vê flores de várias cores: brancas, amarelas, rosas. Todo ano essa beleza encanta. O lugar mais bonito que eu acho da cidade é na Avenida Anhanguera”.  Existem em Goiás, os Ipês branco, verde, amarelo, rosa e roxo.

O biólogo afirma que o estímulo para o florescimento dos Ipês vem da luminosidade e não do clima ameno do período mais frio do ano. “Na verdade, o que sinaliza ao Ipê quando será sua floração é a luminosidade, onde os dias vão ficando mais curtos nessa época do ano. Isso induz a floração. A temperatura praticamente não interfere no processo”.

De acordo com Gláucio, no bioma do Cerrado, a floração ocorre geralmente nos meses que correspondem ao início de julho até o final de setembro. Sobre a variação do período de floração dessas plantas, quando em alguns anos ela aparece antes ou depois do esperado, o biólogo afirma que o fator determinante é a chuva.

“Os dias variam muito pouco em luminosidade de um ano para o outro. O que muda mais é a disponibilidade de água. Se houve mais ou menos chuva no período que precede a floração dessas árvores”, explica o biólogo. 

Flores durante todo ano

Ele ainda afirma que apesar do Ipê florir apenas no período de estiagem, o Cerrado tem outras flores durante todo ano. “Outras plantas têm flores que se destacam no nosso bioma. A barriguda, também chamada de paina; a maninha de porca; Escorrega macaco, uma árvore de casca amarela e muitas outras que não são árvores”.

Gláucio ainda afirma que o Ipê que dá flores com pétalas brancas é o mais difícil de se encontrar, inclusive no campo. Ele também explica o motivo de muitas pessoas confundirem essa árvore com outra, a Caraíba.

“Em alguns locais, o Ipê amarelo é chamado de Caraíba. Também existe um Ipê que tem Caraíba no nome científico, o Tabebuia caraiba. Mas muitas vezes, a Caraíba mesmo é uma outra planta, a Cordia  calocephala. Daí o motivo de tanta confusão. Algumas vezes, a Caraíba é um Ipê, outras vezes pode não ser. É necessário um botânico ou um mateiro conhecedor da flora local pra  apontar as diferenças”.

 

Ipês ameaçados no habitat natural 

Apesar de serem muito comuns no ambiente urbano, Gláucio afirma que essas espécies se encontram ameaçadas eM seus habitats naturais. “As áreas naturais endêmicas dessas árvores enfrentam franco desmatamento, especialmente em regiões do Cerrado, bioma mais ameaçado destas últimas décadas. Elas também estão ameaçadas na Amazônia e na mata Atlântica, devido à supressão vegetal secular que ocorre nos estados onde essa mata e estes Ipês se desenvolvem”, explica o biólogo.

Além disso, Gláucio diz que os ipês também são utilizados na indústria madeireira e isso potencializa sua derrubada na natureza. “Os maiores inimigos dos Ipês são a expansão agrícola e a indústria madeireira. Por incrível que pareça, as populações de Ipês de Goiás não correm risco iminente de extinção e nem figuram ainda como espécies ameaçadas individualmente”. Os estados onde o bioma está mais devastado são Maranhão, Tocantins e Mato Grosso.

No entanto, o biólogo alerta que essa situação está prestes a mudar. De acordo com os últimos dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o Cerrado está sendo desmatado cinco vezes mais rápido que a Amazônia, bioma que possui o dobro de extensão. Um dos fatores que favorecem essa exploração é a vegetação de pequeno e médio portes do Cerrado, que pode ser retirada com maior facilidade do que as grandes árvores milenares da Amazônia.

O desmatamento da vegetação nativa, a expansão agrícola e a baixa quantidade de áreas protegidas ameaçam a existência do Cerrado. De acordo com o levantamento, a área original do bioma está 45% ocupada por pastagens e cultivos agrícolas, enquanto apenas 7,7% do território possuem áreas públicas com proteção integral para conservar habitats naturais. Dados do Ibama apontam que 900 multas por desmatamento na região foram aplicadas em 2018.

Polinizadores 

Gláucio afirma que os Ipês são fonte de alimento para agentes polinizadores em uma época do ano muito crítica para conseguirem alimentos. “Os agentes polinizadores são as aves, as abelhas, besouros moscas e morcegos. As flores dos ipês sustentam esses animais até que as outras floradas se abram, se ele desaparecer, esses animais também estarão em risco”.

De acordo com uma pesquisa feita pelo Instituto Internacional para a Sustentabilidade (IIS) e de outras instituições nacionais e internacionais, o bioma poderá perder até 34% do que ainda resta nos próximos 20 anos. 

Essa devastação levaria ao desaparecimento de 1.140 espécies endêmicas – um número oito vezes superior ao número oficial de plantas extintas em todo o mundo desde o ano de 1500, quando começaram os registros. Ainda de acordo com o estudo, o Cerrado brasileiro possui mais de 4,6 mil espécies de plantas e animais que não são encontrados em nenhum outro lugar do planeta.

 

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