Não há fuga do curso de reciclagem

Detran afirma que quem atinge o limite de pontos estabelecido não escapa do curso de reeducação para o condutor.

Postado em: 06-08-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Detran afirma que quem atinge o limite de pontos estabelecido não escapa do curso de reeducação para o condutor.

Igor Caldas

Quando o condutor atinge 20 pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH), ele fica indexado no sistema do Detran como alguém que vai precisar fazer o curso de reciclagem. Mesmo que o direito do condutor de guiar não tenha sido suspenso ou que a pontuação expire em 12 meses, o mesmo terá que fazer o curso para ter sua CNH renovada. Este ano, em Goiás, foram 327 motoristas que passaram pelo curso de atualização. Isto não significa que eles tenham alcançado a pontuação este ano, mas que em algum momento chegaram ao limite da pontuação. 

Um advogado que não quis se identificar para a reportagem afirma que já extrapolou a pontuação limite para a obrigatoriedade de realizar o curso mais de uma vez. “Eu já atingi mais de 40 pontos e não tive a carteira suspensa. Hoje a meus pontos na carteira já diminuíram novamente porque já se passaram 12 meses da infração”. De acordo com o Detran, mesmo com a pontuação abaixo do limite, ele não vai se livrar de fazer a reciclagem quando tiver que renovar a CNH.

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Outro condutor que não quis ser identificado foi o prestador de serviços que atingiu recentemente o limite da pontuação na CNH. Ele foi multado seis vezes, por seis dias seguidos na Avenida 136 por excesso de velocidade. “De qualquer jeito, vou ter que fazer o curso de reciclagem. Preciso fazê-lo o mais rápido possível ou ainda corro risco de receber mais uma multa em blitz policial por estar com a pontuação acima do permitido”. O preço para a realização do curso é R$ 116.

O curso do DETRAN é formado por quatro módulos que resultam em 30 horas-aula no total. São quatro horas destinadas aos primeiros socorros, seis horas ao relacionamento interpessoal, oito horas à direção defensiva e, para completar, o curso conta com 12 horas de legislação de trânsito. Depois das aulas, um exame teórico é aplicado ao final do curso. Nessa prova, o condutor precisa obter pelo menos 70% de acerto. O exame é composto por 30 questões, nesse caso, é necessário acertar o mínimo de 21 para ser aprovado.

O Gerente de Educação no Trânsito do Detran de Goiás, Gustavo Peixoto Mota, acredita que a penalização contribui para a diminuição de acidentes porque o condutor responde pelo processo administrativo e é obrigado a pagar as multas. ”Isso faz com que a pessoa fique atenta ao trânsito e a impede de cometer uma falta grave”, explica o educador de trânsito.

Se um motorista acumular mais de 20 pontos em infrações, ele pode perder o direito de dirigir com a suspensão da CNH. Quem tem a carteira de motorista profissional precisa ficar ainda mais atento ao trânsito. Ele não pode ter infrações gravíssimas ou perde a CNH e com ela o emprego. Este ano, Avançar o sinal vermelho do semáforo ou o de parada obrigatória foi a autuação gravíssima mais cometida. De janeiro a julho, foram 56.063 autuações desse tipo de infração em todo estado.

Ele ainda afirma que o profissional de trânsito está mais atento a respeito da condução no trânsito. “A atenção deve ser redobrada, principalmente para o profissional de trânsito porque se ele perder a CNH,  perde o emprego junto. Ele não pode ter faltas gravíssimas ou perde o direito de dirigir.

Mudança de hábitos

Gustavo Mota explica sobre a importância do curso de reciclagem para o motorista que comete muitas infrações repense sua atitude no trânsito. “Olha, o curso de reciclagem é muito importante para que o condutor seja reavaliado. Quando a gente abre o curso, eles vem numa revolta danada e depois que passam pela reciclagem, repensam e até agradecem a gente pela oportunidade”, explica o educador.

Ele acredita que a revolta é fruto da cultura da impunidade do brasileiro. “A revolta vem do motorista não aceitar a punição para a infração que cometeu. Ele tem que entender que, na verdade, a multa não é uma taxa que todo mundo tem que pagar, não é um imposto. Ela é uma taxa voluntária. Quem paga é quem comete a infração. Para não pagar, é só seguir as leis de trânsito. O motorista tem que ter consciência de que o carro pode ser uma arma letal.

O educador que também é examinador de trânsito se usa como exemplo para afirmar que todo condutor pode passar muito tempo sem receber pontos na carteira. Segundo ele, basta ter atenção ao conduzir. “Por exemplo, Estou há 6 anos sem receber multas de trânsito. Se eu tiver algum ponto na carteira, eles me tiram da banca examinadora, é uma regra. O segredo é simples: Consciência e atenção redobrada.

 Bolsonaro quer dobrar o limite de pontos permitidos 

No início do mês de junho, o presidente Jair Bolsonaro entregou pessoalmente à Câmara dos Deputados um projeto de lei que muda trechos do Código Brasileiro de Trânsito. Dentre as alterações propostas, está a ampliação – de 20 para 40 pontos – do limite para suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). 

Para que as mudanças passem a valer, o projeto precisará ser discutido no âmbito das comissões e, depois de aprovação, apreciado pelo plenário da Câmara e do Senado. Segundo pesquisa do Datafolha divulgada em julho deste ano, 56% da população são contra o aumento do limite da pontuação da CNH. A pesquisa usou dados colhidos de 2.006 pessoas com 18 anos ou mais, em 130 municípios brasileiros. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos para mais ou para menos.

O Gerente de Educação de Trânsito em Goiás também é contra esse aumento. “Acho essa questão de ampliação preocupante. No meu entender, o limite estabelecido em 40 pontos pode aumentar o número de acidentes de trânsito, inclusive o aumento de vítimas causadas por imprudências ao volante”. Ele ainda afirma que a diminuição de infrações de trânsito só vai acontecer quando tivermos uma educação de trânsito mais contundente. 

A educação de trânsito nas escolas, depende do governo federal. Isso só vai acontecer se houver uma lei que obrigue todos os estados a cumpri-la. Os órgãos que controlam o trânsito fazem a parte deles, de conscientização. Mas a educação de trânsito deveria ser normatizada no Brasil inteiro”, explica Gustavo.

O educador ainda afirma que o que as crianças tem sido peça chave na conscientização sobre as leis de trânsito. “O adulto só aprende quando é penalizado. O que tem acontecido hoje, são os filhos corrigindo os pais no trânsito. Quando a gente trabalha na escola e conscientiza a criança, ela faz o efeito multiplicador. Mas eu acho que a conscientização deveria ser feita no processo inverso, com os adultos ensinando seus filhos”, pontua. 

Sistema de pontos diminui infrações no trânsito

Estudos de Dinamarca, Espanha e Itália provam que o sistema de pontuação na carteira de habilitação transforma o comportamento dos motoristas. Segundo estimativa dos pesquisadores, esse sistema contribui para a queda no número de infrações, lesões e mortalidade no trânsito.

A proposta do presidente para afrouxar regras para a suspenção da CNH vai na contramão do que fazem outros países, como a Alemanha, que criou em 2014 um dos sistemas mais restritivos.

Estudos científicos têm se mostrado que o sistema de pontos é eficiente em conter a violência no trânsito. Os italianos adotaram o sistema em 2003, na região de Veneto. Isso sucedeu um aumento no uso de cinto de segurança de 51,8% entre os condutores, de 42,3% entre os passageiros da frente e de 120% entre os passageiros dos bancos de trás.

O estudo teve os dados publicados no Journal of Epidemiology & Community Health em 2007. Após a introdução desse tipo de sistema, houve recuo de 18% nas mortes e de 19% nas lesões, aponta a pesquisa.

  

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