Alunos perdem matrícula por conta de débitos do ProUni

Aluno de Direito perde prazo de matrícula pelo ProUni por causa de débitos com instituição.

Postado em: 20-08-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Aluno de Direito perde prazo de matrícula pelo ProUni por causa de débitos com instituição.

Igor Caldas

Luiz Carlos Barbosa dos Santos foi deixado para trás com seu sonho de virar doutor. Mesmo tendo sido agraciado com uma bolsa integral do programa Universidade Para Todos (ProUni) para curso superior na Faculdade Lions, ele foi impedido de se matricular na instituição por estar em débito com a faculdade na qual faz o segundo período do curso de direito. Por causa disso, ele perdeu o prazo final de matrícula e sua chance de usufruir da bolsa. Agora, Luiz entrará na Justiça contra a faculdade para garantir seu diploma.

O estudante de direito tinha prazo até o último dia 16 para realizar sua matrícula como bolsista do ProUni na faculdade que ele escolheu para se formar em bacharel de direito. Mesmo sabendo do prazo, a FacLions se negou a fazer a matrícula de Luiz Antonio se ele não fizesse um acordo para quitação dos débitos referentes aos dois semestres que ele cursou.

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A dívida está em R$ 4.068,75. A instituição ofereceu três formas de pagamento: R$ 3.361,60 à vista; entrada de 45% (R$ 1.830,93) e o restante em 4 vezes de  R$ 559,45 no boleto e entrada de 20% (R$ 813,75) e o restante em 8 vezes de R$ 406,87. Luiz Carlos tentou negociar sua dívida com a instituição, mas a FacLions não flexibilizou as propostas de quitação de débito com o aluno, que está desempregado.

“Eles me fizeram uma proposta de entrada e parcelas do restante do débito. Mas da forma como foi colocado, eu não teria condições de pagar a entrada da dívida. Acho injusto eles estarem impedindo minha matrícula como bolsista porque no meu entendimento a matrícula de bolsista não é a mesma coisa que a matrícula de aluno regular. Sinto que estão lesando meu direito. Água e óleo não se misturam”.

Luiz Carlos pediu um prazo até o dia 25 de agosto e sugeriu à instituição que ele pagasse uma entrada de R$ 400 e parcelasse o restante. O departamento financeiro da faculdade respondeu que ele só poderia se matricular se quitasse 45% da dívida total. Segundo o estudante, a faculdade não tem interesse de matriculá-lo porque a instituição vai tentar transferir a bolsa para outro aluno. De acordo com um áudio enviado por engano para o celular de Luiz Carlos, a faculdade precisava que ele pedisse a suspensão da bolsa.

“Eliane, ele tem que solicitar a suspensão da bolsa do ProUni. Ele pode passar um email para você, ele pode fazer um requerimento na central [de atendimento]. Não tem problema nenhum. Tem que partir dele. Porque senão depois, o ProUni pode cancelar por ausência de matrícula se ele não solicitar a suspensão. Ele pode fazer do próprio punho mesmo. Depois você me passa”. O áudio era uma orientação de uma funcionária para outra da instituição. Após o envio por engano ao celular de Luiz Carlos, a mensagem foi apagada. Mas ele salvou o áudio antes.

De acordo com o estudante de direito, que confirmou a informação com o Ministério da Educação (MEC), se ele pedisse suspensão, perderia a bolsa. Para ele, na defesa que a faculdade faria para requerer a bolsa para outro aluno, ela usaria o pedido de suspensão de Luiz Carlos como se fosse uma desistência do benefício. Ele ainda afirma que se a faculdade tivesse feito sua matrícula e a trancasse até a quitação da dívida, ele não perderia a bolsa do governo.

A Faculdade Lions afirma que não se recusa a matricular ninguém e que a situação exposta pelo aluno não “é bem assim”. No entanto, ela não quis detalhar qual seria a suposta verdadeira situação do estudante. 

 Decisões na Justiça têm parecer favorável a bolsistas

A Lei 9870/99 dá o direito da instituição de ensino de impedir a matrícula de alunos inadimplentes. Mas no entendimento de alguns juristas, impedir que o estudante se matricule como bolsista, mesmo em situação de débito, atropela o direito adquirido do programa do governo federal para inclusão de pessoas de baixa renda na universidade.

De acordo com o gabinete da Procuradora da República do Ministério Público Federal de Goiás, doutora Mariane Guimarães de Mello Oliveira, nesses casos, o aluno deveria entrar com um mandado de segurança para garantir seu direito que seria de ser aceito na instituição como bolsista. Isso não quer dizer que ele não pagaria sua dívida. No entanto, o recurso deve ser requerido dentro do prazo de matrícula da instituição de ensino.

Ainda de acordo com o MPF-GO, se o prazo de matrícula da instituição expirar, o aluno deve procurar a defensoria pública.

Aprovado pelo ProUni teve seu direito de matrícula garantido em uma instituição de ensino privado após ter sido negada pela Universidade da Região da Campanha (URCAMP) por ter débitos anteriores com a instituição. O caso foi julgado em parecer favorável ao requerente pela 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Na ação, o autor alegou que, por ter sido aprovado pelo ProUni, obteve bolsa integral para ingressar no curso de Bacharelado em Administração, no Campus Universitário de Alegrete da URCAMP, no segundo semestre de 2013. Quando foi apresentar os documentos para ter a aprovação e obter a bolsa, ele teve sua matrícula negada, sob alegação de que possuía débitos com a universidade. Portanto, ele requereu o aceite de sua matrícula, além de abono de faltas geradas pela recusa e pagamento de danos morais.

O desembargador, Umberto Guaspari Sudbrack, relator que deu parecer favorável, aponta que o art. 5º da Lei nº 9.870/99, que diz respeito à inadimplência em instituições de ensino, só pode ser aplicada em casos de rematrícula. Segundo ele, “não se trata de rematrícula, mas de tentativa de nova matrícula do autor/apelante junto à instituição de ensino”.

O desembargador pondera que o débito existente não pode interferir de modo algum na utilização plena da bolsa de estudos obtida pelo requerente, podendo lesar-se a eficácia da política pública concebida, interferindo também no direito social à educação, previsto no art. 6º da Constituição da República.

Sobre a indenização de danos morais, o magistrado definiu o valor de R$ 5 mil, tendo em vista o tempo de espera que o autor enfrentou entre sua aprovação ao direito de bolsa, a partir de seu desempenho no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem).

Dessa forma, ficou decidido que a instituição deveria efetuar a matrícula do autor e pagar a indenização por danos morais. A desembargadora Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout e o Desembargador Pedro Luiz Pozza votaram de acordo com o relator.

  

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