Falta de água afeta produção de alimentos

O preço de alimentos sensíveis à estiagem ainda não sentiu o impacto da seca, mas pequenos produtores já sofrem. Foto: Wesley Costa

Postado em: 02-09-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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O preço de alimentos sensíveis à estiagem ainda não sentiu o impacto da seca, mas pequenos produtores já sofrem. Foto: Wesley Costa

Igor Caldas

Mesmo fora do cinturão verde, produtores agrícolas que têm propriedades abastecidas por bacias fora do Rio Meia Ponte estão sentindo os impactos da crise hídrica instaurada no Estado. A Companhia de Saneamento de Goiás deixou 50 municípios em alerta de risco de desabastecimento. Isso significa que a vazão de parte das bacias que abastecem o Estado está em baixa. Isso reflete em queda na produção de alimentos e aumento no preço para o consumidor.

O preço dos alimentos mais sensíveis à falta de chuva ainda não disparou na Centrais de Abastecimento de Goiás (Ceasa), mas pequenos produtores e comerciantes locais já sofrem o impacto da falta de água no cultivo. A alta nos preços de alimentos como pepino e abobrinha são consequência da onda de frio que passou pela Capital no último mês. A caixa de abobrinha que normalmente é vendida por cerca de R$ 30 na Ceasa fechou em R$ 60 na última terça-feira (27). A caixa de pepino também dobrou de valor.

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Segundo a Ceasa, a alta no preço dos alimentos que sofrem com a seca é esperada no próximo mês. Entre os principais produtos que terão alta está a banana, cujo preço já subiu por conta da entre safra. A caixa de banana-maçã, vendida na safra por cerca de R$ 35, fechou em R$ 65 na manhã da última terça-feira (27).

Estiagem

Pequenos agricultores alegam sofrimento com falta de água cada vez maior na época da estiagem. Paulo Watanabe afirma que está sofrendo muito com a seca. Ele produz hortaliças na Região Metropolitana de Goiânia e vende alimentos em feiras na Capital. Sua propriedade não depende diretamente da Bacia do Rio Meia Ponte para abastecimento, porém a represa que ele usa para irrigação está secando.

“Minha horta praticamente secou. A gente tem uma barragem no fundo da propriedade. A represa está secando e não é mais suficiente para abastecer a horta. Ela vem secando há anos e agora está capengando. Esse ano a crise foi terrível, muito brava. Ano passado também”. O produtor afirma que nos últimos anos, a escassez dos recursos hídricos de sua propriedade vem aumentando gradativamente.

Volume de chuvas

De acordo com a analista técnica do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Jordana Sara, o volume anual de chuvas nos últimos quatro anos diminuiu em aproximadamente 25% no Estado. Isso fez com que as bacias do Alto Meia Ponte e do Piancó, região de Anápolis entrassem em estado crítico. Ela explica que essas bacias estão com alto comprometimento pela baixa vazão. Também acredita que uma forma de amenizar a crise hídrica seria um plano para gestão dos recursos hídricos nessas regiões.

“Temos uma demanda de água que é fixa em alguns lugares e temos demandas que vão aumentando. É preciso avaliar o uso das bacias hidrográficas. Precisamos fazer uma gestão correta dos recursos para não tirar mais do que os rios permitem. Isso vai segurar mais as águas no solo, nos reservatórios. Nas bacias que estão em situação crítica, estamos fazendo o cadastramento de todos os usos da água para fazer uma adequação da demanda e da oferta do recurso nesses lugares”. Afirma a analista técnica.

Jordana ainda afirma que todo mundo vai sofrer com a crise. No entanto, a falta de água vai impactar mais os produtores agrícolas localizados na Bacia do Alto Meia Ponte e do Piancó, com uma afetação maior nos comércios locais e pequenos municípios que se localizam ao norte de Goiânia. Fora isso, ela afirma que não tem como saber quem mais vai sofrer com a produção agrícola, pois nem todos são irrigantes.

Falta de água tem mais peso sobre pequenos produtores 

O produtor Paulo Watanabe teve que mudar sua horta de lugar para poder continuar produzindo. “Mesmo os agricultores que não estão sendo abastecidos pelo Meia Ponte, estão sofrendo muito para produzir. Essa crise atinge todo mundo. Eu fiquei sem saída. No mato sem cachorro. Tive que mudar a plantação de lugar para continuar a trabalhar. Tenho medo de chegar um momento em que minha verdura vai acabar e eu vou ter que passar a comprar para revender”, lamenta.

Ele fala que o impacto da crise cairá principalmente sobre os pequenos produtores. “Como nessa época, mesmo sem chuvas, tem bastante produção. Há lugares que sofrem com a falta de água, mas tem lugares que não. Isso vai equilibrar o preço nos grandes mercados, como o Ceasa. Porém, o pequeno produtor é quem mais vai penar com a crise hídrica. O revendedor vai conseguir comprar os produtos a um preço acessível, porém a produção que depende da água não tem jeito. Faltou água, faltou tudo”.

A analista técnica do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Jordana Sara, afirma que é normal que a produção agrícola caia na época da seca, porém a produção para subsistência de agricultores e a dependência que os pequenos municípios tem da agricultura gera uma reação em cadeia que prejudica a economia de muitas cidades. “A questão é que às vezes os pequenos agricultores produzem para a sobrevivência. Isso gera uma cadeia de empregos e comércio que gira a economia dos pequenos municípios, quando falta alimento e os preços sobem, prejudica toda população dessas cidades”.

Agricultura familiar

De acordo com os últimos dados do Censo Agropecuário, a agricultura familiar é a base da economia de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes. Ela também é responsável pela renda de 40% da população economicamente ativa do país e por mais de 70% dos brasileiros ocupados no campo. 

O pequeno produtor acredita que a falta de consciência da sociedade tem um peso muito grande nas causas da crise hídrica enfrentada atualmente. “O povo não está nem aí para o desperdício. Mesmo na situação difícil que a gente está, vejo o povo lavando calçada com, mangueira. Faça chuva ou faça sol, todo dia que eu vou fazer entrega em restaurantes eu vejo essa cena triste”, lamenta o agricultor.

Alimentos em baixa atraem consumidor 

Adimair Martins, conhecido nas feiras como Nêgo, revende pimentas que compra no Ceasa. Ele já percebeu o aumento do preço do produto. “A pimenta sofre muito com a falta de água, principalmente a malagueta. Daí o preço aumenta um pouquinho e a gente tem que repassar para o consumidor, não tem como”, justifica.

Além do tempero, que não falta na mesa dos goianos, Nêgo também comercializa mel de abelhas. Ao contrário da pimenta, tem o melhor preço na época da estiagem. “Quando começa a chover, atrapalha a produção de mel pelas abelhas. É porque quando vem a água elas se recolhem e param de produzir. É nessa época que começam a nascer os filhotes”. Segundo Adimair, o consumidor aumentou a procura do produto porque o preço melhorou.

Marcelo Tanaka também revende alimentos do Ceasa em feiras da Capital. Ele registrou o aumento no preço do pepino, milho, quiabo e abobrinha. No entanto, acredita que foi por causa do frio e não da falta de água. “O preço subiu mais por causa do frio. As flores não resistem à baixa temperatura e por isso a produção cai”, explica o comerciante que já foi produtor de hortaliças, mas desistiu da empreitada porque teve dificuldades de encontrar mão de obra qualificada.

O feirante afirma que o consumidor tem optado pelo tomate que esteve em baixa nas últimas semanas, mas deve aumentar porque está sendo exportado para outras regiões do país. De acordo com o Ceasa, nas últimas semanas, o preço da caixa do tomate estava em torno de R$ 20. No entanto, reagiu a exportação e fechou em R$ 40 na última terça (27).

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