Invasões se espalham pela Capital

Goiânia atinge marco de 1,5 milhões de habitantes e possui ocupações irregulares em pelo menos 13 bairros.

Postado em: 09-09-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Goiânia atinge marco de 1,5 milhões de habitantes e possui ocupações irregulares em pelo menos 13 bairros.

Igor Caldas

Pelo menos 30 famílias vivem em barracos à beira do córrego Cascavel no Setor Jardim América, ao lado da T-63. Parte da ocupação Cantinho do Céu está em área de preservação permanente (APA). O cotidiano difícil das pessoas que constroem suas casas em áreas desocupadas, sem estrutura adequada de saneamento e segurança revela a dramática luta por moradia em uma cidade que não para de crescer. De acordo com a Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), há invasões de áreas verdes em aproximadamente 13 bairros da Capital.

O fiscal da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), Renato Monteiro, afirma que os moradores do Cantinho do Céu foram notificados há mais de duas semanas. “O pessoal da Amma já notificou para que os moradores deixem o local”. No entanto, a reportagem conversou com os moradores da ocupação, que não quiseram ser identificados, e eles afirmam que não pretendem sair porque não têm para onde ir.

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Ainda de acordo com o fiscal, o número de invasões e ocupações irregulares na Capital muda com frequencia. “Esse numero é por alto. Porque hoje pode ter um tanto, e amanhã começa outra e nem ficamos sabendo. Então, esse é um número aproximado. Porque é algo muito dinâmico. Parece epidemia”. O fiscal ainda afirma que o número de ocupações de áreas irregulares aumenta à medida que a cidade cresce em número de bairros.

“Goiânia é uma cidade muito grande. Loteamento abre toda hora. Para cada novo loteamento que é aberto, tem que ser criada uma área pública verde. Então, o pessoal vê a área vazia e quer construir. Quanto mais bairros se criam, mais áreas propícias para invasões também são criadas. E é algo muito rápido, ninguém consegue acompanhar porque as pessoas não denunciam”.

Crescimento populacional 

O último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que Goiás alcançou o marco histórico de 7 milhões de habitantes este ano. A Capital, Goiânia atingiu 1,5 milhões de pessoas.

Na opinião de Renato, além da tecnologia, a melhor forma de prevenir que áreas verdes públicas sejam invadidas é a implantação de parques, com construção de pistas de caminhada e brinquedos para as crianças. “Onde não for destinado parque municipal, que a área seja cercada para evitar ocupações”.

Ele ainda afirma que quando as ocupações já possuem construções de casas de alvenaria o trabalho da Agência Municipal do Meio Ambiente (AMMA) é notificar os moradores do local para desocuparem a área. Se houver recusa de desocupação, há a autuação que posteriormente é encaminhada a Procuradoria Geral do Município para tentar a reintegração de posse junto a Justiça.

“Não temos para onde ir”

Um dos moradores afirma que a maior parte deles tenta gerar renda por meio da venda de material reciclável catado na cidade. “A gente não escolheu estar aqui. Mas quem consegue pagar aluguel? Não temos para onde ir. Aqui já têm muitas famílias com idosos, crianças. A gente não pode ir para rua. Muitas vezes não conseguimos nem nos alimentar direito. Se não fossem as doações do povo que ajuda. Não sei o que seria da gente. Eu trabalhei o dia todo e consegui apenas R$ 20”.

Renato fala sobre a dificuldade que a fiscalização enfrenta para coibir as ações depois que as casas começam a ser construídas. “Enquanto tem só barraco de lona é mais fácil tirar os ocupantes. No entanto, quando começam a construir as residências de alvenaria, só saem por meio de ações na Justiça”. Ele destaca que para que a fiscalização seja feita de forma efetiva, é necessário investimento em tecnologia. “Mesmo se tiver fiscal a rodo, a gente tem que ter a tecnologia. Sem ela, não dá para acompanhar a evolução das invasões”.

Há 8 anos morando no Cantinho do Céu, o morador mais velho da ocupação, faz o que pode para sobreviver na selva de pedra. “A gente pega água do poço porque essa do rio é muito ruim. Mesmo assim, quando a gente está sem carne pega uns peixes aí. Tenho umas bananeiras no meu quintal e quando começar a chover quero plantar mandioca”. Ele também trabalha como catador de materiais recicláveis.

Ocupantes de terras da União buscam se regularizar 

As famílias da ocupação do Jardim Emanueli, no Jardim Novo Mundo II, tentam se regularizar para garantir o direito fundamental à moradia. Cerca de 500 famílias moram no local. A visibilidade dessa população é sazonal. Todo ano, na época das chuvas, o drama que essas pessoas enfrentam com a destruição causada pelas enxurradas é estampado nas páginas dos jornais. Na época da estiagem, elas voltam à condição de esquecimento pelo resto da cidade. Há muitos anos eles lutam para continuar na área que pertence à União.

Em abril deste ano, as fortes chuvas que abateram a Capital abriram uma cratera enorme e derrubaram alguns barracos da ocupação. A Defesa Civil interditou o local e orientou que as pessoas que moravam à beira da cratera saíssem dali.  Mesmo depois que alguns moradores perderam suas casas, ninguém arredou o pé do Jardim Emanueli. Atualmente, alguns setores da sociedade civil têm feito ações para ajudar essas pessoas na luta por moradia.

A regularização depende de doação da área da União para a prefeitura, da aceitação da área por parte do município e da produção de uma série de levantamentos e estudos para que isso seja viabilizado.  Alguns setores públicos e da sociedade civil estão unindo esforços para conseguir realizar o sonho das famílias que moram no Jardim Emanueli. É o caso do advogado Fernando Sales que, no âmbito do Direito, tomou a frente na luta dos moradores dalí.

Ele tem sido a ponte para articular as ações com a Secretaria Municipal de Planejamento e Habitação (Seplanh), Agência Goiana de Habitação (Agehab) e Ministério Público. “Tivemos uma reunião com algumas famílias que moram na ocupação e o governo do Estado para mover essa série de ações necessárias para regularizar essa área”.

Estado e Município mostram disposição em ajudar 

A Agência Goiana de Habitação (Agehab) recebeu no fim de agosto moradores de área de ocupação no Jardim Novo Mundo, em Goiânia, conhecida como Emanueli. Eles pleiteiam o apoio do Estado para a regularização fundiária da área, ocupada há cinco anos. Os moradores estavam acompanhados do vereador de Goiânia, Paulo Daher, que entregou documentos solicitando o início do cadastro socioeconômico das famílias.

O secretário-geral da Agehab, Lucas Fernandes, recebeu as famílias, juntamente com seus representantes, e informou que há possibilidade de participação da Agência em uma parceria com a União para auxiliar no processo de regularização da área pertencente à União, desde que seja formalizado convênio com o governo federal.

A Superintendência de Patrimônio da União em Goiás (SPU-GO) e a Agehab estão trabalhando em um projeto piloto de cooperação técnica para viabilizar áreas federais para construção de moradias de interesse social em Corumbá de Goiás. A intenção da SPU-GO é que a Agehab assuma a regularização fundiária das áreas da União e, em contrapartida, esses terrenos seriam colocados à disposição para construção de moradias, em parceria com o governo federal, por meio da Caixa Econômica Federal, e o Governo de Goiás.

Em relação à área do Jardim Novo Mundo, a parceria é mais complexa, pois envolve área de ocupação de domínio da União. O cadastro socioeconômico só poderá ser feito, explicou o secretário da Agehab, depois de cumpridas outras etapas primordiais do processo de regularização, como o levantamento topográfico e o parcelamento da área, que é de competência do município. Entretanto, destacou o secretário, a Agehab está de portas abertas para auxiliar no que for necessário. De acordo com o secretário de planejamento e habitação, Henrique Alves, o estudo o levantamento topográfico e aéreo da área já foi realizado pelo município.

Ele ainda afirma que a doação das terras da União para o município tem que ser muito bem estudada, pois geraria um ônus para a prefeitura. “O município fez algumas parcerias para auxiliar a União a fazer os levantamentos que eles precisam, como por exemplo, o levantamento topográfico. Mas, a responsabilidade é da União e isso precisa ser muito bem discutido porque é um ônus que o município assumiria se receber as terras”.

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