Taxistas à beira do fim: renda dos profissionais caiu de 50 a 70% desde 2016

Profissionais da categoria temem que uma das profissões mais antigas esteja desaparecendo - Foto: Divulgação

Postado em: 18-10-2019 às 06h00
Por: Leandro de Castro Oliveira
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Profissionais da categoria temem que uma das profissões mais antigas esteja desaparecendo - Foto: Divulgação

Igor Caldas

Desde que motoristas de aplicativo começaram a rodar na Capital em 2016, os taxistas têm encontrado dificuldades para sobreviver à concorrência de viagens mais baratas solicitadas pelo celular. De acordo com dados da Secretaria Municipal de Mobilidade e Trânsito de Goiânia (SMT), pelo menos 300 táxis saíram das ruas da Capital desde o ano passado. Hoje, Goiânia tem 1148 permissões de táxis em vigor. Os profissionais da categoria temem que uma das profissões mais antigas esteja desaparecendo.

O presidente do Sindicato de Taxistas de Goiânia, Hugo Nascimento, afirma que há pelo menos 2 mil táxis circulando em Goiânia. Segundo ele, alguns estão rodando sem licença porque não tiveram condição financeira de cumprir algum dos inúmeros requisitos para validar o licenciamento anual. “Às vezes faltou dinheiro para fazer um exame de rotina necessário para revalidação e o profissional continua rodando. As despesas de sobrevivência acabam sendo prioridade”, afirma.

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Segundo o presidente do Sindicato, a categoria está sofrendo uma reestruturação. Ele ainda diz que a renda e as viagens na Capital caíram de 50% a 70%, desde 2016. Para ele, uma das principais mudanças da categoria foi passar a trabalhar sem motorista auxiliar. “A legislação permite que uma licença de táxi para um carro sirva para um motorista principal e um auxiliar. Hoje, os taxistas preferem rodar sozinho para tentar amenizar o decréscimo de renda que tiveram nos últimos anos”.

Transporte por aplicativo

Ele cobra a regulamentação do serviço de transporte de passageiros por aplicativo como uma das saídas para um melhor equilíbrio entre as duas categorias.”O decreto que regulamenta o serviço de motoristas por aplicativo existe desde outubro de 2017, mas não avança. Sempre quando vai caminhar neste sentido, sofre a pressão das empresas, de políticos e dos motoristas que estão em grande número”. O presidente do Sindicato não acha justo que existam inúmeras regras e taxas cobradas aos taxistas enquanto que para outras pessoas que prestam o mesmo serviço não há regulamentação.

Outra saída que Hugo constata é um apelo à categoria dos taxistas sobre a importância de diminuir a tarifa do serviço. A prefeitura estabelece o teto máximo para a tarifa cobrada aos passageiros. “O taxista tinha que enxergar que no momento econômico delicado que enfrentamos, o cliente quer preço baixo. A profissão tem que diminuir a tarifa para aumentar o volume de corridas”. No entanto, ele afirma que o profissional não acredita que diminuição de tarifa e descontos vá gerar mais demanda.

“Todas as ferramentas online, nós temos. Existem mais de 5 aplicativos de celular para pedir táxi. Mas depois dessa crise, o taxista não acha vantagem em diminuir tarifa e oferecer descontos”. Apesar da existência de aplicativos, o Hugo afirma que o rádio ainda é muito usado pela categoria. “O Rádio-Táxi é uma das coisas que ainda está salvando os motoristas”. Existem sete empresas de Rádio-Táxi em Goiânia.

Decréscimo de renda muda padrão de vida de taxistas

Alexandre Neumann tem 44 anos e trabalha há 21 como taxista. Ele lamenta a situação atual da profissão. “A categoria não gosta muito de expor a nossa situação, mas a verdade é essa: Estamos rastejando”. O taxista ainda diz que a situação começou a piorar muito desde que a primeira empresa de motoristas de aplicativo começou a circular na Capital. “O mercado já não estava bom, mas começou a piorar muito desde janeiro de 2016, quando os motoristas por aplicativo começaram a rodar aqui. No meio do mesmo ano, a empresa começou a aceitar dinheiro nas viagens. Foi aí que danou tudo mesmo”, lembra.

Ele herdou a profissão de seu pai, que também era taxista. “Meu pai trabalhou com táxi por 45 anos. Mas ele não conseguiu viver para ver a profissão ir de mal à pior, como está acontecendo agora. Ele nunca deixou faltar nada para eu e meu irmão”. Alexandre diz que sua renda caiu 70%. “Quando o negócio estava bom, eu chegava a fazer R$ 10 mil por mês. Hoje, está difícil fazer R$ 2 mil. A primeira coisa que aconteceu foi o abandono da família. Eles não entenderam a situação. Meu padrão de vida era alto”, lamenta Alexandre.

O taxista lembra como uma licença de táxi era valorizada no mercado. “Uma licença de táxi chegava a valer R$ 100 mil na praça. Eu já enjeitei proposta de R$ 140 mil no meu carro com licenciamento”. Ele reitera que vender licenciamento é proibido, mas que há como transferir a cessão de direito da licença para outra pessoa. Eu quero sair da profissão. Já coloquei meu carro licenciado à venda, mas tenho certeza que não vão pagar mais do que R$ 40 mil. “Penso em investir em um curso profissionalizante para fazer algo melhor, ou sair do país e tentar a vida em outro lugar”.

Alexandre diz que a profissão também está acabando no exterior. “Tenho amigos que foram morar nos Estados Unidos e disseram que os motoristas de aplicativo dominaram o mercado. Ele disse que depois que os taxistas desapareceram o valor das corridas pedidas pelo celular subiram e que nenhum táxi quer voltar para a rua porque é mais vantajoso trabalhar pelo celular. É um prenúncio do que está para acontecer por aqui”. Um dos principais motivos que faziam com que Alexandre valorizasse sua profissão era a possibilidade de uma boa aposentadoria. “Esse táxi era uma garantia de que eu iria aposentar bem. Hoje, minha aposentadoria virou um pesadelo”.

Na sua opinião, o motorista de táxi no Brasil tem enfrentado duas crises simultâneas. Uma delas é a econômica, a outra é a concorrência com motoristas de aplicativo. “O pior é que uma dessas crises faz com que a outra aumente ainda mais. Porque com a quantidade de pessoas desempregadas que temos no país, muitas delas não vêem outra alternativa, a não ser tentar gerar renda como motoristas por aplicativo”. O Brasil está com mais de 12 milhões de desempregados segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Cooperativas 

O motorista de táxi admite que a fragilidade no mercado do serviço de táxi não começou com o aparecimento de motoristas de aplicativo em 2016. Ele relata que desde 2012 sentiu uma diminuída na solicitação do serviço. No entanto, a reação negativa no mercado era bem mais branda que a enfrentada atualmente. Tanto que, na ocasião, Alexandre conseguia brincar com a situação.”Eu lembro que na época que começou a minguar, era a mesma época da prisão do empresário Carlinhos Cachoeira. Eu brincava com meus colegas que foi a prisão dele que tinha tirado o dinheiro da praça. Nós não esperávamos o que estava por vir”, lembra o taxista.

Ele relata que, ainda em 2012, trabalhava como motorista autônomo e conseguia realizar cerca de 40 viagens por dia, de segunda à sexta, das 6h às 20h. Hoje, Alexandre faz aproximadamente seis viagens diariamente, mas teve que se associar à uma cooperativa de táxi porque não estava conseguindo clientes sozinho. “O que me salvou foi a cooperativa. Antes de me associar eu já fique o dia inteiro esperando para fazer uma corrida. E quando saía, eram aquelas pequenas que rendiam menos de R$ 7 reais”. Ele afirma que não existe mais fim de semanas e feriados. “Na sexta e no sábado eu tenho que virar a noite trabalhando para poder descansar no domingo”.

Para o taxista, que já participou de diversas manifestações em apoio à categoria, a profissão ficou sem saída. “Eu acho que vai acabar. É impossível lutar contra o poder que empresas que realizam serviços por aplicativo conseguiram conquistar”. Além disso, para ele, o serviço de táxi não tem o apoio do poder público e muito menos da população. “Além de nós mesmos, não temos mais ninguém do nosso lado. É revoltante. Me sinto abandonado”.Ele diz que viu muitos amigos largarem a profissão. “Conheço um ex-taxista que vendeu o carro e hoje trabalha como frentista de posto de gasolina, outro vende garapa na rua. Aconteceu uma decadência. Muitos tiraram a própria vida por causa da depressão”.

 

 

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