Marcada audiência de conciliação para decidir sobre ordem de despejo de ocupação

Mais de 300 famílias ocupam uma área privada próxima a Vila Delfiori, em Aparecida de Goiânia| Foto: Wesley Costa

Postado em: 17-01-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Marcada audiência de conciliação para decidir sobre ordem de despejo de ocupação
Mais de 300 famílias ocupam uma área privada próxima a Vila Delfiori, em Aparecida de Goiânia| Foto: Wesley Costa

Igor Caldas

No próximo dia 29 vai acontecer uma
audiência de conciliação para decidir sobre a ordem de despejo da ocupação Alto
da Boa Vista onde ao menos 300 famílias estão ocupando uma propriedade privada
na Vila Delfiori, em Aparecida de Goiânia. A decisão vai ser tomada pela juíza
da Vara de Fazenda Pública Municipal, Vanessa Estrela, que deferiu o pedido de
reintegração de posse ao proprietário da área. A equipe de reportagem esteve no
local, conversou com moradores e averiguou que muitas pessoas sequer sabem da decisão
judicial.

Sebastião Martins admite que não sabia de decisão judicial sobre a reintegração
de posse. Ele deixou sua família no interior da Bahia para buscar trabalho em
Goiânia há um ano e quatro meses. “Eu vim para Goiânia e um amigo meu havia me
alertado sobre essa invasão e eu caí para dentro. O salário curto que consigo
fazer como pedreiro aqui não é suficiente para pagar por moradia”, afirma
Sebastião.

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O pedreiro vive em um barraco
improvisado de madeira que também funciona como uma mini mercearia. “Eu acabei
montando esse negócio aqui por não ter outra opção”. Sebastião afirma que
perdeu o contato com a família e está desamparado. “Aqui é complicado, tem
muito roubo, assalto. A energia elétrica é improvisada, cai toda hora e a água
vem de mini poços artesianos. Os governantes não olham para a gente, mas Deus
está olhando. Eu tenho fé”.

Ele ainda diz que está na área desde
o início da ocupação e conta que no primeiro dia apareceu pistoleiros armados
para reivindicar a terra. “Foram duas caminhonetes com cerca de 10 pessoas
armadas. Algumas delas tinham tornozeleira eletrônica e falaram que a gente não
podia ficar na terra”. Ainda segundo Sebastião, duas viaturas das Rondas
Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotan) apareceram no local, mas os bandidos
fugiram antes.

Tatiana Meireles, de 59 anos, mora há cerca de um ano na ocupação.
Ela está esperançosa quanto a continuar no local. Antes de decidir ficar na
área ocupada, Tatiana havia sofrido um despejo porque estava devendo seis meses
de aluguel. A ocupante afirma que está feliz com sua nova vida. Ela vive em um
barracão de madeira de apenas um cômodo e faz suas refeições em um fogão à
lenha improvisado que construiu fora do barraco. “Com um salário mínimo é
impossível pagar aluguel, luz, água e se alimentar”.

Dentro da ocupação há duas frentes que lutam pela permanência das
famílias, o Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas (MLB) e a Comissão de
Moradores Pró Melhoramento do Alto da Boa Vista. De acordo com uma das
ocupantes, Tatiane Carolina Borges,
a divisão aconteceu por um desacordo sobre a forma de lutar pela permanência
das famílias. “A gente não quer vínculo com o MLB porque lutamos de formas
diferentes”. Tatiana acredita que a audiência de conciliação pode dar resultado
favorável à ocupação. 

Audiência pode ter resultado favorável à
ocupação 

Um dos advogados do MLB, Hélio Lucas
de Oliveira Neto, está constituído no processo desde a entrada do movimento na
ocupação, em setembro de 2019. Ele afirma que ainda não existe nenhuma ordem de
reintegração de posse ou de despejo coletivo. “A audiência do dia 29 é uma
tentativa de conciliação, como já aconteceu anteriormente. A juíza pode tomar
uma decisão de deferir ou indeferir uma reintegração de posse de acordo com o
que for apresentado na sessão”.

O advogado afirma que se a juíza
decidir por indeferir a reintegração de posse, o movimento ganha mais fôlego
para articular com o Governo do Estado, Prefeitura de Aparecida de Goiânia para
garantir o direito fundamental de moradia às 300 famílias que vivem em barracos
improvisados na ocupação. De acordo com Hélio, ainda não houve uma negociação
efetiva para que essas famílias sejam contempladas em algum programa
habitacional.

O advogado esclarece que a
propriedade da área não está em discussão no processo. É a posse (uso legítimo
da terra) que está sendo colocado em questão. Ele afirma que quem reivindica a
posse não apresenta nenhum título de propriedade e nenhuma prova concreta de
que fazia uso daquele terreno. “A quitação fiscal dos impostos que ele
apresenta são referentes a áreas adjacentes à ocupação”.

Hélio e outros integrantes do MLB
estiveram na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(INCRA), em Brasília, para levantar dados de georreferenciamento e tentar
provar que a posse da área ocupada não é de quem a reivindica. “Estamos
levantando informações para serem apresentadas na audiência de conciliação para
provar que a posse da terra por quem está reivindicando a reintegração não é
legítima”, explica.

A juíza havia decidido pelo despejo
ainda no ano passado. Os ocupantes estão vivendo na área desde 2018. No
entanto, ela suspendeu a decisão após a prefeitura do município, que também foi
acionada, pedir que o Estado fosse chamado ao processo. A Justiça solicitou que
o município encontrasse um local que abrigasse os ocupantes da área enquanto
não fosse encontrado um lugar definitivo para a habitação.

Quinta da Boa Vista

Sobre a desocupação da Fazenda Quinta
da Boa Vista, a Procuradoria Geral do Município de Aparecida de Goiânia explica
que a decisão foi tomada pela juíza da Vara de Fazenda Pública Municipal,
Vanessa Estrela, que deferiu o pedido de reintegração de posse ao proprietário
da área. A decisão judicial estipula que o proprietário deve encontrar um local
provisório para abrigar as famílias em extrema vulnerabilidade. Na mesma
decisão, a juíza determinou que a desocupação fosse realizada de forma
pacífica, ação que deve ser realizada pelo Governo de Goiás, por meio da
Polícia Militar.

A Prefeitura de Aparecida de Goiânia
esclarece ainda que, por meio das secretarias de Assistência Social e
Habitação, realiza o cadastramento das famílias em extrema vulnerabilidade
social para realizar a inclusão em programas sociais, como Bolsa Família e BPC
e também em programas habitacionais como o Minha Casa, Minha Vida. A Secretaria
de Assistência Social prestará o serviço público necessário para a mudança das
famílias em extrema vulnerabilidade social da área para o novo local definido
pelo proprietário do terreno ocupado atualmente.

A Prefeitura de Aparecida ressalta que, por recomendação do Ministério
Público Federal, as famílias são cadastradas e os beneficiários das moradias
populares são definidos por sorteio e avaliação social. Recentemente, a
política habitacional do município beneficiou mais de 800 famílias com a
entrega dos apartamentos no Residencial Buriti Sereno. De acordo com a
Secretaria de Habitação, no primeiro trimestre deste ano haverá sorteio para
novas moradias que estão em construção. 

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