Amma vai multar caminhões de entulho irregulares

Agência normatizou o perdimento dos bens de quem for flagrado e autuado por crimes ambientais| Foto: Wesley Costa

Postado em: 13-03-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Amma vai multar caminhões de entulho irregulares
Agência normatizou o perdimento dos bens de quem for flagrado e autuado por crimes ambientais| Foto: Wesley Costa

Igor Caldas

Entulho misturado ao lixo de todas as classificações é descartado de forma indiscriminada principalmente em áreas de proteção ambiental de Goiânia. Após mais de 10 anos de atraso em relação à legislação federal, a Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) normatizou o perdimento dos bens de quem for flagrado e autuado por crimes ambientais. Cem veículos foram apreendidos fazendo descarte ilegal no ano passado e 28 neste ano. Antes da Instrução Normativa Nº 65 de novembro de 2019, os bens apreendidos tinham que ser devolvidos aos infratores. 

Tiago Ribeiro da Silva, responsável pela gerência do contencioso da Amma, acredita que a demora na adequação à legislação federal se deu por falhas estruturais e de acondicionamento de apreensões feitas pela Agência. “Por muito tempo não tínhamos nem condições de guardar e fazer a segurança dos bens apreendidos”. Atualmente, os bens vão para o depósito municipal ou ficam na sede da Amma aguardando o julgamento do ato de infração.

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Se a apreensão for julgada procedente, o bem poderá ser destinado para doação. No entanto, Tiago afirma que as empresas que se cadastrarem para receber os bens apreendidos devem obedecer a uma série de critérios estabelecidos na instrução normativa. “A normativa é bem rigorosa em relação a quem pode se beneficiar. A empresa deve estar com todas suas obrigações em dias e cumprir uma ordem cronológica do cadastro”.

Ele sugere que os interessados devam consultar a Instrução Normativa Nº 65 antes de realizarem o cadastro na Amma. “A pessoa que tem intenção de receber doações provenientes de apreensões não pode ter processos na Justiça e fica em uma espécie de fila de espera para ser contemplada”. No primeiro momento, a apreensão é feita como medida administrativa, para impedir que a infração continue acontecendo. Após essa fase a questão deve ser julgada com amplo direito à defesa da pessoa autuada.

Tiago afirma que o julgamento da autuação em primeira instância é feito no Contencioso da Amma. Se o autuado não concordar com a decisão, deve recorrer em outras instâncias. Após o julgamento, o bem é devolvido para o fiscal que realizou a autuação para ser feito uma réplica. Ele explica que o processo todo deve durar cerca de três meses e esclarece que nenhum bem foi doado ainda porque a validade da instrução normativa é recente. “Foram mais de três anos para criar essa estrutura dentro da Amma”, relata.

O gerente do acondicionamento da Amma explica que a estrutura necessária para fazer valer a instrução normativa não se restringe apenas a um espaço físico. “É necessário toda uma logística para realizar o cadastro das pessoas jurídicas interessadas em receber os bens apreendidos e acondicioná-los da melhor forma possível para evitar prejuízos se algum infrator conseguir reverter uma apreensão na Justiça”. Ele ainda alerta que determinados bens apreendidos não podem ser doados.

Descarte ilegal é feito por empresas 

De acordo com a pasta, a infração é cometida principalmente por empresas de caçamba que deveriam custear o direcionamento dos resíduos para o aterro sanitário, mas preferem descartá-los em qualquer lugar para não terem que pagar o descarte correto em um aterro sanitário. O gerente de fiscalização ambiental da Amma, Diego Moura, reitera que existem empresas que fazem o descarte correto. “As empresas de caçamba que tem um trabalho sério têm a preocupação de não degradar o ambiente”.

Diego diz que o descarte ilegal de entulho acontece principalmente em áreas de proteção ambiental porque normalmente são locais mais afastados e com vegetação que podem encobrir a ação dos criminosos. A proximidade destas áreas com cursos d’água faz com que esse material acabe parando nos rios, causando a poluição e assoreamento que podem comprometer de forma irreversível o abastecimento hídrico da Capital.

Para Moura, as empresas despejam os resíduos em pontos de descarte ilegal para burlar o sistema, cortando gastos com o descarte correto dos resíduos sólidos de construção civil. Eles devem pagar uma taxa ao aterro sanitário para deixar o lixo no local. “Percebemos que empresas de caçamba de lixo despejam o lixo de forma criminosa para não terem o custo de descartar de forma correta. Muitos cidadãos também fazem o descarte ilegal, mas podemos dizer que o maior volume de entulho descartado é proveniente das empresas que tentam burlar a lei. O cidadão contrata o serviço achando que elas estão fazendo o trabalho correto, a coisa certa, mas na verdade estão praticando um crime ambiental grave”, afirma o Fiscal.

O fiscal diz que o descarte ilegal de lixo consiste em crime ambiental previsto por lei e gera um auto de infração pesado, além da apreensão do veículo que for flagrado descarregando lixo. Segundo o fiscal ambiental, o crime cometido pelas empresas definitivamente não compensa.

A multa pela infração varia de R$ 5 mil a R$ 50 milhões. “O descarte ilegal não compensa para o proprietário de empresa de coleta resíduos. Compensa muito mais fazer a destinação correta do entulho. Para recuperar o veículo apreendido, é necessário pagar a multa. Nos casos em que houver reincidência, dentro do processo administrativo, o proprietário pode perder o bem. O veículo pode passar a ser usado pela prefeitura. É algo sério que causa um  dano ambiental gigantesco”.

Fiscalização

Por meio de uma pesquisa, o Professor da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Goiás, Camilo Vladimir de Lima constatou grande quantidade de entulho no leito de alguns pontos do Rio Meia Ponte. O curso de água é responsável por 58% do abastecimento hídrico da Capital. Ele afirma que a Agência Municipal do Meio Ambiente está ciente do problema, mas  enfrenta dificuldades para o controle deste crime ambiental que é muito recorrente. 

“O problema é que a Amma acaba tendo poucos recursos para fiscalização desse crime. Eles deveriam ter mais investimentos públicos pra que pudessem ter mais fiscais, mais carros, mais equipamentos, e um sistema informativo de controle dos pontos de descarte. Com o uso de imagens de satélite, por exemplo”, denuncia Camilo.

Para o acadêmico, faltam recursos públicos para que a fiscalização de crimes ambientais seja feita de forma efetiva. “A questão ambiental na política como um todo acaba ficando muito na retórica, mas na hora de equipar a ferramenta do Estado para controlar e fiscalizar, não conseguem. Muitos técnicos e fiscais estão comprometidos com a questão, mas não têm os recursos suficientes para realizar o trabalho da forma como deveria ser feito”, pontua.

Outro problema relatado por Camilo sobre a questão da geração de entulho está na forma como as obras são feitas no Brasil. “A gente tem um problema que o sistema construtivo difundido no nosso país é pouco racional. Aqui, é realizado o processo construtivo de forma muito artesanal e pouco industrial, isso acaba gerando muito lixo”, afirma o professor. Para ele, também faltam políticas públicas de incentivo para obras produzirem menos entulho.

A reportagem esteve em um ponto de descarte ilegal de entulho no Setor Perim, dentro de uma Área de Preservação Ambiental Permanente (APP) ao lado do córrego Anicuns. A quantidade de lixo  de diversos tipos era impressionante, mas o maior volume encontrado foi o  de resíduo sólido de construção civil. O local é alvo de operações toda semana. (Especial para O Hoje) 

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