Escassez no SUS: profissionais da saúde de Goiânia relatam batalha contra coronavírus

Servidores e representantes dos profissionais da saúde enfrentam a Covid-19 no corpo a corpo e reivindicam testes, equipamentos de proteção e informação| Foto: Wesley Costa

Postado em: 27-04-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Servidores e representantes dos profissionais da saúde enfrentam a Covid-19 no corpo a corpo e reivindicam testes, equipamentos de proteção e informação| Foto: Wesley Costa

Igor Caldas

A escassez de testes de diagnóstico da Covid-19 e racionamento de Equipamentos de Proteção individual (EPIs) para profissionais da saúde da Capital causam temor de contágio da doença em meio aos socorristas. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) tem um trabalho intenso na realização de atendimentos de urgências nas ruas de Goiânia e não se mostra preparado para conter a doença nas equipes. Servidores e representantes dos profissionais da saúde revelam as condições de trabalho do Samu em tempos de transmissão comunitária. O serviço é administrado pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

Em condição de anonimato, um servidor de uma das unidades de atendimento do Samu em Goiânia afirma que não foi anunciado testes da doença para nenhum funcionário. “Estamos com medo porque até agora a Secretaria não disponibilizou esses testes para a gente”. Ele ainda diz que existem equipes que já foram afastadas por suspeitas da doença, mas ainda não houve confirmações de casos dentro do Samu. De acordo com boletim epideomiológico mais recente da Secretaria Municipal de Saúde, mais de 65 profissionais de saúde já contraíram a Covid-19, em Goiânia.

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Outro problema relatado pelo profissional é a situação de racionamento de EPIs. O entrevistado afirma que nas viaturas usadas em seu local de trabalho há apenas um par de aventais impermeável e de máscaras N-95 para cada ambulância. Os equipamentos são essenciais na proteção de profissionais da saúde contra o Coronavírus. No entanto, denuncia que os servidores são orientados a deixarem esses equipamentos dentro das ambulâncias e usá-los apenas em ocorrências que haja mais risco de contaminação.

“Mas nós não sabemos que tipo de paciente estamos pegando dentro da ambulância e por isso não atendemos ocorrências munidos destes equipamentos. Vamos somente com uma máscara cirúrgica e com o macacão do Samu, ineficientes para proteção do vírus”, declara. O servidor declara que após o atendimento é feita uma triagem do paciente. “Mas neste intervalo, já pode ter havido uma contaminação”, lamenta. Ele ainda denuncia que o afastamento de equipes do Samu com suspeitas da doença ocorreu nestas condições.

Monitoramento 

O diretor do Sindicado dos Servidores de Saúde de Goiás (SINDISAÚDE-GO), Mauro Rubem, afirma que a dificuldade em saber se um colega de profissão está contaminado preocupa muito. “Uma das coisas que faz muita falta aos profissionais da saúde neste período de pandemia são os testes rápidos para saber quais trabalhadores já estão com a doença e quais não podem seguir trabalhando”, afirma.

Mauro Rubem declara que o trabalho do atendimento feito pelo Samu é mais intenso e exige uma atenção cuidadosa no uso dos EPIs e monitoramento da doença porque eles lidam diretamente com a população na rua. “Eles são vulneráveis ao contágio porque sempre estão fazendo o atendimento na rua, muitas vezes em ocorrências onde sangue e secreções são recorrentes nos pacientes”, destaca. O líder sindical ainda afirma que às vezes esses profissionais têm que fazer uma intubação de paciente dentro da viatura.

Coordenador geral do Samu, André Luiz Braga, afirma que os equipamentos de proteção individual foram reforçados nas ambulâncias e que duas unidades básicas de atendimento foram destinadas apenas para o atendimento e transporte inter-hospitalar em casos onde há suspeita ou confirmação da Covid-19. De acordo com o médico, essas são algumas medidas de prevenção do contágio cruzado entre profissionais da saúde adotadas pelo atendimento móvel.

Outra medida preventiva informada pelo médico é a desinfecção da ambulância em qualquer socorro prestado a pacientes que apresentem algum sintoma gripal. “A viatura é totalmente desinfectada em um processo que leva horas para ser conduzido”. Questionado sobre a possibilidade de fazer a desinfecção em todos os atendimentos pelo motivo da transmissão do vírus em nível comunitário, o coordenador da Samu respondeu que o processo seria muito oneroso e prejudicaria o socorro a vítimas de urgência na cidade.

Sobre a escassez de testes de diagnósticos da Covid-19 para os profissionais de saúde, o médico revelou que eles começaram a ser usados nesta quinta-feira (23). No entanto, apenas serão utilizados em uma escala cronológica e com prioridade aos profissionais de saúde que tiveram contato com pacientes de diagnóstico positivo para a infecção causada pelo novo Coronavírus. Serão feitos 50 testes de Covid-19 por dia com resultados em curto prazo.

Racionamento de EPIs é geral nas unidades de saúde

A presidente do SINDISAÚDE-GO, Flaviana Alves, afirma que o racionamento dos EPIs está acontecendo de forma generalizada e não só em unidades móveis de atendimento. “No início, estávamos recebendo muitas denúncias de falta de EPIs, agora o que nos chega são denúncias de restrições de uso, como ocorre dentro das ambulâncias”. Outras restrições apontadas pela presidente do Sindicato são o uso de máscaras descartáveis por mais tempo que o recomendado pelos fabricantes e até a recomendação de levar equipamentos para casa.

Ela ressalta que mesmo com a separação dos serviços das ambulâncias, pode haver contaminação. A sindicalista lembra que a transmissão do Coronavírus em Goiânia está em nível comunitário e mesmo pessoas que são socorridas sem apresentarem sintomas gripais ou confirmação de Coronavírus podem ser hospedeiras e transmitirem a doença. “Usar o equipamento adequado em todos os atendimentos é essencial para não haver o aumento de contaminação entre profissionais da saúde”, afirma.

A entidade que representa o segmento de enfermeiros no Estado de Goiás (SIEG-GO) também relatou denúncias de uso restrito de equipamentos de proteção individual por motivo de racionamento. A presidente da SIEG, Roberta Rios, revelou que enfermeiros estavam sendo obrigados a usarem máscaras descartáveis por mais tempo que o recomendado em alguns hospitais da Capital.

“O problema atual de equipamentos não está sendo de falta, mas de restrição por motivo de racionamento. Estamos recebendo denúncias desde o mês passado”, relata Roberta. A presidente do Sindicato que representa a categoria de profissionais de enfermagem ainda diz que esteve reunida com outros setores de profissionais da saúde pelo Conselho Municipal de Saúde que também apresentou demandas relacionadas às restrições de equipamentos de proteção individual em unidades de saúde.

Mortes

O técnico de laboratório, Javier Martins de Oliveira, 57 anos, morreu na última quarta-feira (22) por complicações causadas pela Covid-19. Ele era servidor público lotado na Gerência de Atenção Secundária e Terciária da Superintendência de Atenção Integrada à Saúde da Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO). É a segunda morte de profissional técnico de laboratório em Goiânia. A primeira a vir a óbito pela doença foi Adelita Ribeiro da Silva, 38 anos. A profissional de saúde exercia o cargo no Centro de Atenção Integrada à Saúde (Cais) Novo Mundo e no Laboratório e banco de sangue Hemolabor. (Especial para O Hoje)

  

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