Aparecida de Goiânia possui cerca de 10 mil cachorros abandonados

Especialistas em direito dos animais afirmam que a responsabilidade destes animais deve ser dividida entre o Estado e a sociedade| Foto: Wesley Costa

Postado em: 29-05-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Especialistas em direito dos animais afirmam que a responsabilidade destes animais deve ser dividida entre o Estado e a sociedade| Foto: Wesley Costa

Igor Caldas

Aparecida de Goiânia possui cerca de 10 mil cachorros abandonados. Especialistas em direito dos animais afirmam que a responsabilidade destes animais deve ser dividida entre o Estado e a sociedade, mas acaba ficando relegados apenas à sociedade pela histórica omissão dos governantes a respeito dos direitos dos animais.  A Prefeitura de Aparecida informou, por meio de nota, que não pode recolher os animais das ruas. 

Uma estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) calcula que exista um cachorro para cada cinco habitantes em cidades com grande densidade populacional e 10% destes estão abandonados. Segundo um levantamento feito pelo Instituto Pet Brasil, feito com Organizações Não Governamentais que se dedicam a cuidar destes bichos, há 172,1 mil animais abandonados sob a tutela de ONGs no país. 

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A Secretaria de Saúde de Aparecida de Goiânia cita a Lei nº 17.767, de 10 de setembro de 2012 que proíbe o Centro de Zoonoses de recolher animais de rua em razão da natureza do serviço prestado nesses órgãos, que é o controle de zoonoses, doenças transmitidas de animais para seres humanos e vice-versa. O órgão reitera que para situações de maus tratos, crime previsto na Lei nº 20.629, de novembro de 2019, a população pode realizar denúncias às autoridades por meio do telefone 197.

A presidente da Comissão Especial de Proteção e Defesa Animal da OAB-GO, Pauliane Rodrigues, declara que a responsabilidade legal dos animais abandonados é dividida entre sociedade e o Estado. “Mas sempre recai apenas sobre a sociedade porque o Estado é totalmente omisso em tudo que se refere ao direito dos animais”, pondera. 

Para ela, o abandono se enquadra na pior ação de maus-tratos que um bicho pode receber. “Quando o animal é largado na rua, ele morre aos poucos, fica vulnerável a todo tipo de tratamento porque não depende de pedir alimento para as pessoas que nem sempre entendem a situação deles”. A advogada afirma que não existem animais de rua. “Todos os bichos que estão vivendo em lugares públicos já tiveram tutores, foram largados”, garante. 

Perímetro urbano

Um dos locais do município com muitos cães deixados à própria sorte são as imediações do perímetro urbano da Serra das Areias. O advogado Matheus Lima se exercita com um grupo de ciclistas na região e se deparou com a situação dos animais que vivem nas ruas sem pavimentação dos bairros que circundam a Serra das Areias. Ele começou a se mobilizar pelas redes sociais para tentar ajudar os animais e afirma que conseguiu arrecadar verba para aquisição de ração e remédios com o grupo de ciclistas.

Nesta semana o advogado teve mais uma vitória na sua busca por salvar os cães. Por meio de suas postagens, ele conseguiu adoção para seis cachorrinhos que estavam no abandono, mas reiterou que Alexia Silva, a pessoa caridosa que recebeu os animais em sua casa está precisando de recursos para ajudar a cuidar dos bichos. “Ela é humilde, já tem seis animais em casa além dos que pegou essa semana”.  Matheus está levantando doações para ajudá-la.

A Lei nº 20629/19 trata o abandono de animais como crime de maus tratos foi sancionada no último ano. Os infratores podem receber punições que vão desde apreensão do animal agredido até a proibição para criar ou ser tutor de outro animal. Agressões, privação de alimento, confinamento, acorrentamento ou alojamento inadequado também estão previstas como crime. Um alojamento adequado necessita oferecer condições apropriadas para o bem-estar animal. 

Punição

A punição também dói no bolso de quem pratica crueldade com bichos. Podem ser aplicadas multas de R$ 800 a R$ 5 mil por animal e por ocorrência. O dinheiro arrecadado com as autuações será destinado ao Fundo Estaduais do Meio Ambiente (Fema) que oferece apoio financeiro a projetos ligados ao uso racional e sustentável dos recursos naturais, manutenção, melhoria ou recuperação da qualidade ambiental do Estado. 

A Comissão Especial de Proteção e Defesa Animal da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) disponibilizou de forma gratuita e na íntegra, o livro “Maus tratos aos animais e violência contra as pessoas”. Nele, o autor Marcelo Robis Francisco Nassaro discorre sobre a aplicação da Teoria do Link nas ocorrências da Polícia Militar paulista. 

Advogada defende especialização de delegacia e fiscalização 

A presidente da Comissão Especial de Proteção e Defesa Animal da OAB-GO, Pauliane Rodrigues diz que há progresso na legislação favorável aos animais, mas falta fiscalização. “Tinha que haver uma delegacia especializada exclusivamente em crimes contra animais”, aponta a advogada. Ela acredita que a falta de estrutura específica para proteção de animais representa mais um indício de negligência do Estado sobre o direito dos bichos.

A advogada reitera que a falta de uma delegacia exclusiva para crimes contra animais faz com que essa função seja preterida pelos órgãos responsáveis pelo combate de crimes ambientais. “Há falta de estrutura de fiscalização nestes órgãos. Se houver uma denúncia de maus-tratos e outra de poluição a um córrego, qual delas vai ser atendida primeiro?”.

Por meio de estudos científicos, a advogada defende que os animais são seres conscientes. “Em 2012 um grupo de cientistas se reúnem em Cambridge e declara sobre a consciência animal”.  De acordo com a pesquisa, a ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente como a capacidade de exibir comportamentos intencionais.

De acordo com Pauliane, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. O estudo indica que animais não humanos, incluindo todos os mamíferos, as aves e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos neurológicos.  “A partir desse importante marco para os animais, não podemos mais fingir que somos a geração que não sabia que os animais sofrem, sentem dor e tem consciência”, defende. (Especial para O Hoje)

 

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