A dor do outro que dói em mim

Confira a crônica escrita por Jordana Ayres, estudante de jornalismo e estagiária do jornal O Hoje | Foto: Reprodução

Postado em: 07-02-2021 às 11h30
Por: Nielton Soares
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Confira a crônica escrita por Jordana Ayres, estudante de jornalismo e estagiária do jornal O Hoje | Foto: Reprodução

Jordana Ayres

No início do último ano nos deparamos com um cenário completamente diferente do que estávamos acostumados, que não só mudou as cores, os móveis e as iluminações, mas também o roteiro do enredo. Em um simples piscar de olhos nossas vidas foram transformadas: o sorriso agora é sufocado por máscaras e as aglomerações, ao menos para os que possuem bom senso e se preocupam com o bem estar comum, se transformaram em isolamento social.

Parecia uma gripe normal, até que a Maria Helena, dona de um salão de beleza aqui da rua precisou fechar o estabelecimento por conta do decreto estadual que buscava conter o avanço da doença, bem como os bares, as faculdades e os shoppings. Ninguém próximo a mim havia sido contaminado, ainda estava distante! Passou mais alguns meses e o meu tio pegou, a porteira do meu prédio também, a amiga da minha mãe, o marido da minha prima e há uma semana, a dona Lourdes, avó de uma querida amiga, após ficar mais de 20 dias acamada em um hospital, lutando contra esse inimigo invisível, conhecido mundialmente como covid-19, perdeu a batalha. Os filhos, irmãos, sobrinhos e netos ficaram em estado de desolação, se perguntando o que podia ter sido diferente e os motivos que levam a tão sonhada cura a estar longe dos nossos olhos, mesmo com a chegada da vacina.

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A morte da dona Lourdes me deixou inconsolável, mas sobre todas as coisas, bastante reflexiva. Senti como se estivesse em um sonho ruim e que ao acordar iria me deparar com uma outra realidade, mas não foi assim. Aceitar que uma pessoa tão querida e amada não estaria mais aqui, assim como tantas outras que já se foram e facear a dor que isso proporciona me fez pensar sobre a fragilidade que paira sobre nós enquanto seres humanos. Hoje estamos aqui, vivendo, sorrindo, escrevendo textos, crônicas, reportagens, cozinhando, praticando exercícios físicos e amanhã não; tudo que os nossos entes queridos vão ter de nós são lembranças espalhadas em fotografias, memórias, vestimentas e cheiros.

A dor doeu em mim e ainda dói porque eu poderia estar no lugar dela. Infelizmente o plano que nós três tínhamos de nos sentar à mesa de sua casa para tomar um café e comer uma fatia de bolo, foi interrompido. Dona Lourdes não vai ver a neta se formar, se casar e ter filhos, também não vai frequentar os cultos da igreja aos domingos, mas deixou um legado enorme de fé, perseverança, cuidado e amor. Ela se foi, mas um pedaço ficou em cada um que teve o prazer de conhecê-la.

A dor de 2 milhões, 230 mil e 829 famílias ao redor do mundo que também perderam seus entes queridos para o novo coronavírus  precisa ser sentida por todos, de maneira tão fixa e abrangente ao ponto de mudar atitudes e hábitos que comprometem o bem estar comum. Chegou o tempo em que todos precisam pensar em um, e um precisa pensar em todos, fazendo com que o amor ao próximo se sobreponha ao ego e ao negacionismo. Talvez essa seja uma expectativa grande demais se levarmos em conta tudo o que está acontecendo, mas prefiro acreditar em mudanças positivas que estão, pouco a pouco gerando mudanças na sociedade, do que cruzar os meus braços e esperar a perda de tantas outras Donas Lourdes. 

 

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