Dentistas previnem infecções que podem agravar estado de pacientes na UTI

Profissionais destacam que a boca é um local onde há um acúmulo de bactérias e que o acompanhamento visa combater que elas se alastram e causam infecções, que podem agravar o problema do paciente e até levá-lo à morte | Foto: Reprodução

Postado em: 19-04-2021 às 07h50
Por: Sheyla Sousa
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Profissionais destacam que a boca é um local onde há um acúmulo de bactérias e que o acompanhamento visa combater que elas se alastram e causam infecções, que podem agravar o problema do paciente e até levá-lo à morte | Foto: Reprodução

João Paulo Alexandre

Um profissional que compõe a equipe multiprofissional presente nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e que muitas pessoas não fazem ideia é o dentista. Ele está presente e ajuda na prevenção de infecções que têm origem na boca e que podem agravar o estado de saúde de quem já luta pela vida devido à Covid-19.

O Hoje conversa com o cirurgião-dentista Fabrício Henrique, que atua no Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia (HMAP), que é tida como unidade de referência para o tratamento do novo coronavírus. Ele explica que atua no local todos os dias da semana e que logo cedo, às 7 horas, já começa a sua rotina na unidade. 

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Fabrício explica que o local conta com 30 leitos de UTI A unidade conta com três profissionais que cuidam de 10 pacientes cada um. A principal função é verificar como está a limpeza dos tubos que auxiliam na respiração do paciente. “Verificamos a limpeza para não causar pneumonia através da broncoaspiração. A boca é um local muito propício para o acúmulo de bactérias que, se não houver um tratamento devido, elas podem acabar descendo o pulmão do paciente”, destaca. 

Além disso, Fabrício conta que, em algumas situações, pode haver a necessidade de pequenas cirurgias orais no paciente. “Alguns deles apresentam feridas na boca devido ao fato de nunca terem frequentado um dentista. E isso acaba sendo um foco infeccioso. Por passar muito tempo com o tubo introduzido e por causa de se alimentar através de sonda, o paciente pode acumular bactérias. Por isso é importante o tratamento”, pontua. 

Além de se instalarem no pulmão, a infecção, que as bactérias presentes na boca podem levar o paciente a ter, também pode atingir a corrente sanguínea. Essa situação, segundo o cirurgião-dentista, é muito preocupante, já que pode ser uma das consequências no agravamento do caso do paciente e, até mesmo, levá-lo a óbito. 

Afeto 

Fabrício conta que esse contato cria um vínculo muito maior do que profissional e paciente. Ele descreve que há afeto que se desenvolve a cada contato com os enfermos no local. “Ficamos em contato com eles diariamente e acabamos fazendo um trabalho de psicólogo, pois precisamos entendê-los. E, em um primeiro momento, isso não é fácil. Tem pessoas que ficam com receio de mostrar a boca pra gente com vergonha, por exemplo. E a gente faz com que isso aconteça da melhor forma possível para eles. Para que possam se sentir acolhidos”, destaca. 

Para ele, trabalhar em uma UTI voltada exclusivamente a pacientes com Covid-19 é um desafio diário, mas que lhe traz constante aprendizado. “A gente não lida apenas com a boca. Lidamos com pessoas que lutam pela vida e seguimos com eles nessa batalha. Algumas pessoas sentem medo ou vergonha de abrir a boca para a gente, mas depois nos agradecem pelo cuidado. Lidamos com um inimigo completamente invisível. E esse trabalho busca levar qualidade de vida para eles.”

Fabrício também trabalha em uma UTI de uma unidade hospitalar particular em Goiânia. Ele destaca que a situação de lotação no local deu uma leve melhorada, mas já percebe sinais de que o quadro pode reverter com abertura do comércio. Muitos desses pacientes, inclusive, sentiram receio de serem levados para UTI para receberem um tratamento mais intensivo. 

“Muitos deles pensam que ir para a UTI é uma sentença de morte, mas a situação não é assim. A gente entende que o paciente com Covid tem quatro vezes mais chances de ir para a UTI do que por outra enfermidade. Mas quem vai é porque ele necessita de cuidados 24 horas. O intuito de uma UTI é a supervisão o tempo inteiro. E isso tem resultados: o índice de prevenção de doenças respiratórias pode chegar a 80%”, reforça.  

Estudo já afirmava a necessidade do dentista na UTI 

Um estudo publicado no International Dental Journal, em 2018, já destacava a importância dos cuidados odontológicos em uma UTI. Essas prevenções vão da simples escovação até as restaurações.Isso impactou a redução em 56% de infecções respiratórias, como a pneumonia em pacientes que necessitavam da ventilação mecânica. Mesmo com esse dado, o número desses profissionais atuando na chamada Odontologia Hospital ainda é baixo. 

Segundo o Conselho Federal de Odontologia (CFO), há 2.210 dentistas hospitalares em todo o país. Além disso, não há uma lei federal que obrigue hospitais públicos a contratar dentista, embora muitos contam com a figura do cirurgião buco maxilo, que, fora do contexto da pandemia, costuma ser acionada em casos de traumas. Nesse caso, o trabalho de higiene bucal nas UTIs em geral é realizado por enfermeiros e técnicos de enfermagem. 

Vacinação

A presença dos dentistas na UTI, inclusive, se tornou alvo de discussão. O objetivo é que os demais profissionais, que não foram inseridos na categoria de grupos prioritários, sejam introduzidos para receberem o imunizante contra a Covid-19. A orientação do Programa Nacional de Imunização é focar nos profissionais que atuam na linha de frente contra a doença, que tem alto nível de exposição ao vírus. A realidade, porém, traz vários relatos de categorias que integram esse segmento, mas não estão na frente do combate ao novo coronavírus. 

O CFO e os Conselhos Regionais de Odontologia afirmam que “são incisivos na defesa e cobrança para a vacinação imediata dos Cirurgiões-Dentistas, Técnicos e Auxiliares da Odontologia nesta primeira etapa que contempla os grupos prioritários”.

“Desde o início da pandemia, 82% dos profissionais de Odontologia não interromperam o atendimento odontológico, pelo contrário, intensificaram os cuidados com a biossegurança para garantir total segurança à saúde dos pacientes nos procedimentos realizados. Por isso, a importância da vacinação desse grupo prioritário que, inclusive, foi reconhecido e convocado para o trabalho na linha de frente contra a Covid-19 no Sistema Único de Saúde”, disse o CFO. 

O Sistema de Conselhos de Odontologia acrescenta que “está inconformado com a falta de celeridade e logística essenciais para imunização dos mais de 500 mil profissionais de Odontologia em pleno exercício em todo o país, seja na rede pública ou privada”.

A categoria reforça os perigos que os profissionais estão expostos durante a pandemia. “É preciso evidenciar o risco de infecção viral predominante aos profissionais de Odontologia devido a procedimentos que envolvem comunicação face-a-face com pacientes e exposição frequente a saliva, sangue e outros fluidos corporais, bem como manuseio de instrumentos perfuro cortantes”, finaliza. (Especial para O Hoje) 

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