‘Labirinto’: quando a etnografia permeia a arte

Christus Nóbrega se apropria da renda ‘labirinto’ para revisitar memórias familiares

Postado em: 19-07-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Christus Nóbrega se apropria da renda ‘labirinto’ para revisitar memórias familiares

GABRIELLA STARNECK*

A exposição Labirinto, do artista Christus Nóbrega, foi aberta ontem (18) e ficará em cartaz até o próximo dia 31 de agosto, na galeria de arte Hacibe Hanum, do Instituto Leo Romano. O trabalho é fruto de uma investigação que o artista fez, em um período de três anos, que une etnografia a memórias familiares. A mostra, com curadoria de Cinara Barbosa, consiste numa produção que apresenta obras que têm a renda ‘labirinto’ como tema central, além da metáfora para as tramas que constituem a vida.

Embora a exposição Labirinto seja um trabalho bem pessoal e íntimo como relata Christus Nóbrega, o trabalho acaba sendo uma ‘releitura’ da realidade de outras pessoas também. “Eu falo da minha história pessoal, mas que também é a história de muitas famílias brasileiras”, afirma o artista ao Essência. Labirinto é uma exposição itinerante que já foi apresentada em outras cidades como Brasília e Belo Horizonte. Contudo Christus destaca que a mostra, em Goiânia, traz peças que foram feitas exclusivamente para a exposição na Capital. 

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Exposição

A nomenclatura da mostra Labirinto remete a um tipo de renda, de mesmo nome, que é feita em poucas cidades do Brasil. A ideia de fazer um trabalho ligado a esse tipo de costura surgiu, porque a avó de Christus morava em uma cidade vizinha a Chã dos Pereiras  – que tinha a tradição de produzir a renda labirinto. Em um determinado período da vida, a avó do artista precisou trabalhar com esse tipo de arte para poder sustentar sua família, já que após ficar viúva ela acabou perdendo a pensão do esposo, e precisou dar a guarda das crianças para outras famílias por causa da falta de recurso

“Nesse período, minha começou a vender essa renda labirinto para gerar renda para família. E, de certa forma, eu achei que a história de vida dela era uma metáfora grande em relação ao labirinto, então a partir daí eu fiz uma espécie de arqueologia/inventário. Eu fui atrás de fotografias de infância dos meus tios, imprimi essas fotos em grandes pedaços de linho, viajei para Chandos Pereira e passei três anos trabalhando junto às rendeiras. Elas fizeram interferências de labirinto em cima das imagens, o que chamo de ‘hematomas’, porque, como elas começaram a puxar fios das fotografias, as imagens começam a sumir. Alguns fios ficaram soltos, o que remete a essa memória desmantelada, reconstruída”, afirma Christus. O artista ainda relata que a exposição acaba falando um pouco da situação do Brasil, da dimensão política e do papel da mulher na sociedade – como mantenedora da renda familiar. 

Inspiração

Segundo Christus Nóbrega, sua inspiração no processo criativo da arte parte de perspectiva etnográfica e antropológica: “Me interesso muito em estudar histórias de vida, os processos históricos e políticos, e estudar outras culturas e civilizações. Grande parte dos meus procedimentos para pensar a arte vem desse estudo do outro. Olhando para esse outro que eu me entendo mais, seja na diferença, em olhar para ele e encontrar o estrangeiro, ou até mesmo em ver as singularidades”. 

Por esse motivo, Christus afirma que seu trabalho é uma espécie de autorretrato/autobiografia e os desdobramentos disso no campo fotográfico. “Apesar de fisicamente não ter um autorretrato meu, que é comum em minhas outras exposições, eu falo de mim através de outras pessoas. Penso em uma forma mais ampla do que seria esse autorretrato. ‘Como é possível se ver por meio do outro?’, ‘Como se ver no outro?’.  Trago em minhas obras muito da fotografia associada a outros suportes como objetivos, instalações, autoperformances”, afirma o artista. 

Christus Nóbrega

Artista e professor adjunto do Departamento de Artes Visuais (VIS) da Universidade de Brasília (UnB), Christus Nóbrega desde a infância teve uma inclinação para as artes, como relata: “Sempre tive um contexto familiar muito estimulado para arte, porque minha mãe era professora na UNB (de Pedagogia) voltada para as Artes. Doutor e mestre em Arte Contemporânea pela UnB, o artista leciona e orienta os cursos de pós-graduação em Artes e Design da mesma instituição. Atualmente, Christus possui obras em acervos, coleções privadas e institucionais, a exemplo da Fondation Cartier, em Paris, do Museu de Arte do Rio (MAR) – além de ser autor de livros e artigos científicos nas áreas de Arte e Educação. 

*Integrante do programa de estágio do jornal O HOJE sob orientação 

da editora Flávia Popov

SERVIÇO

Exposição ‘Labirinto’, de Christus Nóbrega

Quando: de 18 de julho a 31 de agosto Onde: Galeria de arte Hacibe Hanum (Rua 131, nº 79, Setor Sul – Goiânia)

Horários: das 14 às 18h (de terça a sexta-feira) e das 9 às 15h (sábado) 

Mais informações: 3086-1965 /3945-4870 

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